Não foram apenas divergências em relação à economia e o histórico de rusgas acumuladas durante o governo Luiz Inácio Lula da Silva que fizeram a então presidente Dilma Rousseff resistir à nomeação do ex-presidente do Banco Central Henrique Meirelles no Ministério da Fazenda como substituto de Joaquim Levy, segundo conta um dos ex-assessores da petista em livro a ser lançado nesta quinta-feira, 8.

“Além das diferenças do que fazer na economia, havia um motivo pessoal para ela recusar toda a pressão feita em nome de Henrique Meirelles: Dilma jamais perdoaria o ex-presidente do Banco Central pela reação deste quando ela descobriu que tinha câncer, já candidata à Presidência da República em 2010 (na verdade em 2009). A então ministra soube que Meirelles aproveitara a notícia para dizer a Lula que se Dilma não se recuperasse, ele estaria ali, com saúde e à disposição para ser o candidato.”

O episódio, negado por Meirelles, recheia “À Sombra do Poder” (editora Leya), do jornalista e cientista político Rodrigo de Almeida. Em 219 páginas, Almeida, que foi assessor de imprensa de Levy e secretário de Imprensa da Presidência da República entre abril de 2015 e maio de 2016, relata, de um ponto de vista privilegiado, histórias de bastidores sobre o processo que levou ao impeachment de Dilma. Entre elas a desavença com o atual ministro da Fazenda.

Solidário no câncer

“Em nome da sua vontade incessante de ser presidente da República, Meirelles não foi solidário nem no câncer, ela (Dilma) pensou, num raciocínio que evidentemente nunca externou em público”, escreve Almeida.

Meirelles, por meio de sua assessoria, negou enfaticamente que tenha feito a movimentação. “Essa história é falsa e jamais ocorreu. Eu não cometeria essa indelicadeza. O autor demonstra desconhecimento dos eventos e das minhas características pessoais”, disse o ministro ao questionamento feito pela reportagem.

Boa parte do livro é dedicada à relação entre Dilma e o então vice-presidente Michel Temer, começando pelo esforço do peemedebista para recompor a relação entre o Planalto e o Congresso no início do segundo mandato da petista, “dinamitado” pelo então ministro da Casa Civil Aloizio Mercadante.

“O ex-presidente Lula havia tentado pacificar o PMDB no início do segundo mandato. Mercadante dinamitou a estratégia. Dilma ainda fez uma tentativa quando Temer assumiu a coordenação política, em abril de 2015, mas se esqueceu de tirar Mercadante do caminho.”

Segundo o livro, a presença de Mercadante no caminho de Temer não foi um ato de inabilidade de Dilma mas, ao contrário, um primeiro sinal de desconfiança da presidente em relação ao vice.

O vice

“Dilma sabia, no entanto, da movimentação de seu vice. Sabia que Cunha o avisou previamente da decisão de aceitar o pedido de impeachment contra ela. Sabia que uma parcela significativa do PMDB discutia com setores do governo e da oposição sobre o dia seguinte à sua queda”.

A ruptura, no entanto, só se tornaria pública em abril de 2016, quando vazou o áudio de um possível discurso de posse de Temer. “Não estou acreditando. Eu não ouvi direito ou ele mostrou a todos que é, de fato, um golpista”, reagiu Dilma, segundo Almeida.

O jornalista também relata com riqueza de detalhes o longo processo de fritura de Levy. Segundo ele, Dilma soube da demissão do auxiliar quando um repórter telefonou para repercutir a informação. “A presidente balançou a cabeça em sinal de reprovação e sorriu para mim como quem pergunta: ‘O que posso fazer?!'”.

Antes disso, em setembro de 2015, Dilma havia recebido uma visita do presidente do Bradesco, Luiz Carlos Trabuco, descrito como um dos mais próximos conselheiros da presidente. “Naqueles dias de tensão, muita gente primeiro torcera o nariz contra a visita. Mas uma segunda conclusão sugeriu que Trabuco era, no fundo, o portador de uma importante mensagem do sistema financeiro para a presidente da República. Nas entrelinhas, ele lhe dizia:’se Joaquim Levy não for fortalecido no seu papel de ministro da Fazenda, os bancos tiram o apoio ao governo'”.

O livro será lançado nesta quinta-feira, na Casa do Saber, no bairro do Itaim Bibi, na zona sul de São Paulo. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.