Para somar o insulto à injúria, Jair Bolsonaro resolveu fingir que se importa. 

Ao lançar na manhã de hoje seu programa de imunização para a Covid-19, ele disse que o momento é de “entendimento e paz”.

“Nós todos, irmanados, estamos na iminência de apresentar uma alternativa concreta para nos livrarmos desse mal”,  afirmou o presidente. “Se algum de nós extrapolou ou até exagerou foi no afã de buscar solução para um problema que nos afligiu desde o início.”

As palavras valem tanto quanto uma nota de três reais. Lembremos que ainda ontem à tarde o presidente urrava contra a vacina. “Não vou tomar, e ponto final”, bradou num evento em São Paulo. 

Lembremos também que antes disso, por semanas e semanas, ele fez tudo que pôde para minar a confiança nas vacinas, tornando mais difícil a tarefa de levar aos postos de saúde o número de pessoas necessário para criar a chamada “imunidade de rebanho”. Pois é disso que se trata: o vírus só vai deixar de causar estragos quando houver mais gente resistente do que suscetível a ele. 

É por isso que pessoas que respondem pela saúde pública, pela saúde coletiva, como o presidente da República, jamais deveriam proferir qualquer palavra que atrapalhasse a vacinação em massa. Mas Bolsonaro, naquele misto de arrogância e burrice que o define, ou não entende, ou está se lixando. 

O presidente agora sugere que exageros e extrapolações aconteceram no afã de encontrar saídas para a pandemia. É mentira. Tudo que Bolsonaro fez no correr dessa tragédia foi no afã de prevalecer, de não mostrar fraqueza, de manter coesa a sua base de fanáticos. No momento em que se sentir desafiado ou acuado novamente, o presidente deixará de lado a fala mansa para mais uma vez inundar o país com sua bile. O verdadeiro Bolsonaro é aquele do “e daí?”, aquele que foi treinado para matar.

Não, eu não aceito o pedido de união de Bolsonaro. Ele é hipócrita e tardio demais. Espero, ao contrário, que Bolsonaro seja responsabilizado por tudo que fez e deixou de fazer. E que isso se traduza, mais cedo que tarde, no término da aventura perversa que tem sido esse governo. 

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PS: O anti-ministro da Saúde Eduardo Pazuello também se fez de sonso no lançamento de hoje. Ele disse que num país que foi capaz de instituir o SUS e de se tornar o maior fabricante de vacinas da América Latina não deveria haver tanto ceticismo em relação à campanha de imunização. “Por que essa ansiedade, essa angústia?”, perguntou ele. Pois bem, general: nem o SUS nem o complexo brasileiro de fabricação de vacinas são fontes de preocupação. É você que não inspira confiança – além do fato que o governo Bolsonaro tem mais prática em destruir do que em realizar.