PONTARIA Nelson de Oliveira espera que os trâmites para a compra de armas diminuam no próximo governo

Vamos dar uns tiros?” Um convite como esse já não é mais tão raro e inusitado no Brasil. Diante da expectativa de uma maior facilidade de acesso às armas de fogo e até da revogação do estatuto do desarmamento, esperada no governo de Jair Bolsonaro, cada vez mais cidadãos querem aprender a atirar ou, pelo menos, se familiarizar com revólveres, pistolas e espingardas. As escolas especializadas estão observando um crescimento do número de alunos e o Exército também verifica um aumento de pedidos de Certificados de Registro, que permitem a compra de armamentos por colecionadores, caçadores e atiradores esportivos. Do ano passado para cá, o número de certificados alcançou a marca de 39,4 mil, mais do que o dobro do número de 2016, 18,7 mil. Esse aumento coincide com o avanço das autorizações de posse de armas pela Polícia Federal, que estão em firme crescimento e atingiram 42,3 mil no ano passado. Desde o referendo do desarmamento, em 2005, as vendas de armas de fogo aumentaram 70%.

A Academia Centaurus, um conhecido clube de tiro em São Paulo que conta com um pequeno estande com quatros boxes, tem computado um interesse crescente em seus cursos semanais. O número de alunos duplicou, de 15 para 30 por mês. O clube, que tem 600 associados, ganhou 40 novos sócios nos últimos seis meses. “No curso tem jovens, executivo, cada vez mais mulheres e pessoas de mais idade que querem saber como se pratica o tiro”, diz Nelson de Oliveira Júnior, presidente da Centaurus. “Há uma grande procura e todo mundo está naquela perspectiva de que Bolsonaro vá diminuir mais ainda a burocracia, reduzir valores e custos para se conseguir comprar uma arma através do Exército.”

Um dos mais tradicionais clubes de tiro de São Paulo, o Piratininga, tampouco tem dado conta do crescimento da demanda por seus serviços. Como outros cursos de tiro de São Paulo, está com a lotação esgotada. Fundado há 48 anos, tem 700 sócios e uma lista de espera de 300 pedidos de inscrição. “O clube não tem mais vaga, temos limites de capacidade e precisamos observar questões de segurança”, afirma Sérgio Biscuola, diretor do Piratininga. “Além disso, o interessado tem que passar por uma triagem e cumprir uma série de requisitos”. Biscuola, que disputa campeonatos internacionais de tiro e é instrutor, está sem vagas para seus cursos até março do ano que vem.

Tiro certo
O aumento da população armada

>> 39,4 mil
Certificados de Registro de armas concedidos pelo Exército para colecionadores, caçadores e atiradores esportivos em 2018

>> 330 mil
Total de armas nas mãos da população civil registradas pela Polícia Federal

>> R$ 8 mil
Custo médio para adquirir e registrar uma arma no Brasil

Visitantes eventuais

Além de sócios e alunos, os clubes também recebem cada vez mais visitantes eventuais, pessoas que querem ter uma curta experiência e conhecer a sensação de segurar um revólver e apertar um gatilho. “Sempre tive curiosidade em atirar”, diz a ferroviária Patrícia Gonçalves, que, ao lado do marido, Claudinei, testava sua pontaria na Centaurus, na última quarta-feira. Deram 20 tiros e pagaram R$ 100 pela experiência. “Atirar é uma forma de liberar adrenalina, envolve tensão e medo. Achei a experiência gratificante, mas jamais teria uma arma”, diz Patrícia.

Existem duas formas de conseguir a posse legal de uma arma: pelo Exército ou pela Polícia Federal. Em ambas, para comprar uma é necessário ter 25 anos de idade, no mínimo, ter residência fixa e ocupação lícita, demonstrar aptidão técnica e psicológica e não ter antecedentes criminais. Quem quer comprar e possuir uma arma em casa faz isso por meio da Polícia Federal. O outro caminho é o do Exército, que serve aos esportistas, colecionadores e caçadores. Neste caso, o curso de tiro é pré-requisito para comprar a arma, além de exames técnicos e psicológicos. Uma das barreiras de entrada no mundo das armas é o preço. No Brasil, elas custam caro, a partir de 4,5 mil uma nacional ou 6,5 mil, uma importada, fora os custos de todos os trâmites burocráticos. Não faltam, porém, sinais evidentes de que brasileiros estão cada vez mais interessados em atirar.