Depois de dois longos anos de isolamento, estamos voltando ao convívio social.

Coisa linda voltar circular pelas impraticáveis ruas da cidade de São Paulo.

Sinceramente? Tinha esquecido a riqueza de sensações que a cidade oferece.

E não estou me referindo ao cheiro que emana do rio Tietê.

É bem provável que sua cidade também tenha uma infinidade de idiossincrasias, mas São Paulo, posso garantir,
é uma experiência antropológica.

Ou sociológica.

Ou um safari.

Depende de qual Paulistano você se depara pela frente.

Porque São Paulo é o habitat de diversas espécies de Paulistanos, que convivem entre si, em simbiose.

Tem, por exemplo a São Paulo dos Paulistanos Desorientados.

Aqueles que precisam ser constantemente assistidos, informados ou guiados.

Essa espécie, inclusive, gera uma infinidade de empregos, porque Paulistano Desorientado precisa estar cercado de gente com colete escrito “Posso Ajudar?”.

Seja em lojas, estações e aeroportos, ruas e repartições públicas, profissionais estão lá para auxiliar o Paulistano Desorientado a entender o que está escrito nas placas.

— Por ali, senhor. Por aqui, minha senhora. Carrinho tem ali. Banheiro é descendo a escada, senhora. Saída é bem ali, senhor, na porta embaixo da placa onde está escrito “Saída”.

Tem até o que fica com uma bandeira na esquina para informar que o sinal fechou, caso um Paulista Desorientado,
e ciclista, não conheça a complexa convenção de cores dos semáforos.

A segunda espécie muito comum é o Paulistano Sofredor.

É aquele que usufrui do que a cidade tem de pior.

Buraco no asfalto ou calçada, ele sempre cai.

Parece que escolhe.

Quando tem enchente, adivinha quem fica com água até o joelho?

Não confunda com azarado.

Azarado tem em todo mundo.

O Paulistano Sofredor não é azarado.

Ele apenas vive e circula por áreas de São Paulo que a prefeitura esqueceu.

E olha que áreas assim não faltam.

Quando chove, por exemplo, o Paulistano já pega as velas na gaveta, porque sabe que vai acabar a luz.

O metrô parou de funcionar? Justo na hora que ele ia embarcar.

Carro, telefone, carteira, já roubaram tudo do Paulistano Sofredor.

E ele faz o B.O. já sabendo que nada será recuperado.

Fazer o que?

Paulistano Sofredor raiz não reclama, pelo contrário.

— Xi…o Córrego do Lamento? Imagina…esse sempre foi poluído…desde que eu era criança. – diz ele, quase com orgulho de conhecer bem a cidade. O oposto também existe.

Trata-se do Paulistano Sucesso.

Esse é mais raro de se encontrar solto pela cidade.

É necessário buscá-lo em ruas, restaurantes e bairros específicos.

Um Paulistano Sucesso padrão tem carro blindado e não sabe qual dia é o rodízio de veículos.

– Final zero não circula na quarta? Ou no domingo?

Nunca lembro.

Você sabe que se trata de um Paulistano Sucesso se o indivíduo estiver usando pulseirinha de couro e gel no cabelo.

Coisa linda é voltar a circular pelas impraticáveis ruas da cidade de São Paulo

É no Shopping que o Paulistano Sucesso está à vontade.

Ali é onde, para ele, São Paulo finalmente parece Miami.

Já as Paulistanas Sucesso são facilmente identificadas pelos seus apelidos.

Ou são monossílabos, como “Lu”, “Pat”, “Dri”, ou são nomes que serviriam para uma criança, seguidos do sobrenome quatrocentão, como “Pituquinha Cerqueira” ou “Coquinha Vidigal”, percebe?

A verdade é que bastou dar uma volta pela cidade, para me lembrar dos Paulistanos todos.

E me dei conta que, por mais problemas que a cidade ofereça, estava com saudade.

Espero que você, na cidade que estiver, também esteja de volta às ruas, aos restaurantes, aos cinemas, aos estádios
de futebol.

A gente estava merecendo.