Como previsto, o primeiro-ministro português, António Costa, venceu as eleições legislativas em Portugal, no domingo 6, renovando uma gestão que tem sido bem-sucedida em trazer bons resultados econômicos. Portugal é um dos poucos países europeus governados pela esquerda, numa coalizão inédita em 40 anos de redemocratização. No caso lusitano, trata-se de uma linha social-democrata, menos radical do que as experiências recentes — e frustradas — da Espanha (com o Podemos) e da Grécia (com o Syriza). Costa chegou ao poder em 2015, após ter sido derrotado na eleição anterior. Ele se beneficiou do desgaste do governo conservador que o antecedeu e que precisou fazer um dramático ajuste fiscal em 2011 para evitar a quebra do país e receber um pacote de ajuda de 78 bilhões de euros do FMI e da União Europeia. A recessão durou até 2014.

O mote de Costa na campanha foi “queremos estabilidade e não um impasse à espanhola”. Ele procurou diferenciar Portugal da realidade política da Espanha, que teve quatro eleições em quatro anos pela falta de acordo das legendas de esquerda. Pragmático, o socialista manteve o país dentro das normas orçamentárias da União Europeia ao mesmo tempo em que relaxou as medidas de austeridade e aumentou os gastos sociais, conseguindo dinamizar a economia. Como resultado, o país teve sólido crescimento econômico nos últimos anos, acima da média da UE, e o desemprego atingiu o menor índice desde 2002. O déficit do orçamento está próximo de zero. O boom do turismo e as baixas taxas de juros europeias também ajudaram. Costa se fortaleceu e aumentou sua popularidade. Contribuiu para isso sua personalidade otimista e jovial — é fã de gastronomia, cinema e fado. Ex-prefeito de Lisboa e filho de um ex-dirigente comunista, o político e advogado tem 58 anos e nasceu em Lisboa, mas sua família é originária de Goa — antigo território lusitano na Índia.

Sem maioria

INÉDITO Pela primeira vez Portugal terá um deputado de extrema direita: André Ventura, popular pelo discurso de ódio aos imigrantes e que foi comparado a Jair Bolsonaro (Crédito:Divulgação)

A vitória do PS não garantiu ao primeiro-ministro seu grande objetivo, a maioria do Parlamento, que tem 230 cadeiras. O Partido Socialista (PS) elegeu 106 parlamentares, 20 a mais do que no último pleito. Terá de formar uma nova coalizão para governar. A atual frente, apelidada de geringonça, também não garantirá a maioria. Ela é composta pelo Bloco de Esquerda (BE, formado por antigas siglas de origem trotskista e maoísta) e pela Coligação Democrática Unitária (CDU, integrada pelo Partido Comunista e pelos Verdes). Além disso, seus líderes não asseguram a renovação automática da aliança, o que trará mais um desafio para Costa. Entre os possíveis novos aliados estão o Pessoas-Animais-Natureza (PAN), que tem uma plataforma ambiental, e o LIVRE, com programa ecológico e socialista. A direita teve a pior derrota no país desde a redemocratização. Fracassaram nas urnas o Partido Social Democrata (PSD, de centro-direita), principal legenda da oposição, com 12 parlamentares a menos, e a aliança CDS-PP (democratas-cristãos).

Com o resultado da eleição, Portugal se afasta da tendência europeia de escolher partidos conservadores. Ainda assim, elegeu pela primeira vez uma representante da extrema direita. O país era um dos quatro da União Europeia sem partidos populistas em seus Parlamentos. O Chega!, fundado em abril, elegeu o comentarista de futebol André Ventura, de 36 anos, que defende a substituição do parlamentarismo pelo presidencialismo e a extinção do Ministério da Educação. Ele ficou popular ao defender a castração química de pedófilos e pelo discurso de ódio aos ciganos e imigrantes. Na campanha, chegou a ser comparado ao presidente Jair Bolsonaro.

As eleições também trouxeram maior diversidade para o Parlamento, que tem um número recorde de partidos (10) e mulheres (88 deputadas, ou 28% da Casa), além de três representantes negras — antes, só havia um negro no Legislativo.

Agora, Costa terá de lidar com medidas que podem minar sua popularidade, como as altas taxas de impostos. Além disso, Portugal tem a terceira maior dívida da União Europeia, de 120% do PIB, apesar das contas públicas estarem equilibradas. Somando-se as dívidas privadas e corporativas, um montante superior a 300% do PIB está comprometido. Isso representa um risco se as taxas de juros da Europa subirem. Se isso ocorrer, Costa pode se beneficiar novamente. Com a desaceleração econômica mundial, é pouco provável que o Banco Central Europeu reverta a atual política monetária do continente.

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