As redes sociais não são o problema.

Problema, mesmo, é o ser humano.

Perdoem o pessimismo com que começo esse artigo, mas hoje acordei com pouca esperança.

Uma breve passada de olhos pelos comentários nas redes sociais e pelas principais notícias do dia mostra que somos, em grande parte, uma espécie ignorante, invejosa, vingativa e arrogante.

E não preciso nem mesmo lembrar-se de Putin, Trump ou da família Bolsonaro para provar meu ponto.

Refiro-me a gente comum, como você e eu.

Verdade que já éramos assim muito antes do advento das redes sociais, mas, com elas, podemos botar para fora nossos defeitos sem a necessidade de enfrentar o julgamento alheio olho no olho. Podemos até mesmo nos esconder atrás de pseudônimos.

Aí sim, é possível explorar toda a liberdade da internet, conquistada sem nenhum mérito, monitoramento, nem manual de instruções.

Durante essa jornada, do Orkut ao TikTok, as redes sociais foram surgindo e morrendo, depurando uma espécie muito específica de usuários.

Uma subespécie de seres humanos surgiu e se desenvolveu online.

Quem diria que Darwin ecoaria até nas redes sociais?

Haters, nazistas, racistas, machistas, misóginos, analfabetos funcionais, evoluíram nos meios eletrônicos se alimentando dos posts para infernizar a vida de gente como eu e você, os perfeitos.

Digo isso não com empáfia, explico, caso você sofra desse outro mal, muito comum nas redes sociais: a incapacidade de compreender ironia.

Evidentemente que você não vai reconhecer nenhum desses sintomas.

Você, e eu, como já disse, somos perfeitos.

Ou, como bem colocou o comediante John Cleese, um dos fundadores do Monty Python: um idiota só é idiota porque não sabe que é idiota.

Talvez seja esse o meu caso. Nunca saberei.

Mas é seguramente o caso dos haters, nazistas, racistas, machistas, misóginos, analfabetos funcionais e dos incapazes de reconhecer ironia.

Trolls em geral.

Infelizes que espreitam nossos posts, sempre à procura de uma oportunidade para nos atacar.

Aprendi, à duras penas, a lidar com essa gente macabra, às vezes ignorando, às vezes bloqueando ou, raramente, confrontando – essa última opção reservo para dois exemplares: aqueles que conseguem atingir diretamente meu fígado, despertando uma ira que não reconheço no dia a dia; ou aqueles que são tão, mas tão patéticos, que provocá-los para uma discussão resulta ser divertido.

Assim, aos poucos, fui peneirando minhas redes sociais até encontrar um bom equilíbrio entre gente do bem – aqueles que invariavelmente concordam comigo (ironia, pegou?) – e uma pequena parcela inevitável desses trolls, pois se reproduzem a taxas incontroláveis.

Mais recentemente, um novo espécime se uniu a esse exército: os canceladores.

A princípio parecem menos nocivos que nazistas, racistas, misóginos e preconceituosos em geral. Mas, na prática, não são. Porque, diferente de seus pares, canceladores impactam além das redes sociais.

Controlar a internet é uma pauta da sociedade civil e não de partido ou governo

Canceladores levaram a imbecilidade para outro patamar, capaz não apenas de julgar nos tribunais online, mas, também, executar a pena imposta por seus veredictos extra-oficiais.

Canceladores dão às bolhas de opinião, o poder calar quem pensa diferente. Coisa inédita até agora, até para os mais eficazes trolls.

Por isso representa um risco imenso para a sociedade.

E é por isso que a Internet precisa ter algum tipo de controle.

Ocorre que essa não pode ser a pauta de um partido político, ou de um governo.

Precisa, sim, ser a pauta da sociedade civil, que resulte numa espécie de auto-regulamentação definida com a ampla participação da população.

E essa regulamentação é urgente, porque o risco não é mais eminente.

Quando o mundo elege fascistas, nazistas e racistas, graças a influência das redes sociais, é sinal de que já fomos longe demais.