A esquerda vinha estimulando o voto útil em Lula, mas, no final, o que se viu, foi um voto envergonhado, que não aparecia nas pesquisas, aflorar nas eleições a favor de Bolsonaro. Isso ajuda a explicar o desempenho do presidente que ganhou força na reta final da campanha, apesar de projeções desfavoráveis. Também os candidatos que ele apoiou tiveram uma votação surpreendente, bem acima do que se esperava. O fato é que muita gente que diz não votar em Bolsonaro ou prefere não declarar sua intenção, na verdade vota nele. É uma espiral do silêncio em que há uma omissão de opinião por causa do medo da crítica, da zombaria ou mesmo do conflito. Mas na hora de preencher a cédula o eleitor toma uma decisão que parecia improvável pelas projeções dos institutos de pesquisa. É evidente que esses institutos precisam rever suas metodologias, que revelaram uma imagem deturpada do cenário eleitoral. A mente dos brasileiros não está sendo alcançada pelas sondagens.

As pesquisas não conseguiram captar os ventos favoráveis a Bolsonaro e foram especialmente equivocadas nas eleições para o Senado, onde os conservadores passaram um trator e conseguiram eleger oito senadores apenas pelo PL. Cinco ex-ministros de Bolsonaro se elegeram para o Senado, como Damares Alves, no Distrito Federal, Teresa Cristina, no Mato Grosso do Sul, Rogério Marinho, no Rio Grande do Norte, Sérgio Moro, no Paraná, e o astronauta Marcos Pontes, em São Paulo. Outros ex-ministros que tiveram uma gestão catastrófica das suas pastas, como Eduardo Pazzuelo e Ricardo Salles, conseguiram uma vaga na Câmara dos Deputados, o primeiro pelo Rio e o segundo por São Paulo. Além disso, Tarcísio de Freitas, num movimento totalmente ignorado pelas sondagens de intenção de voto, ficou à frente de Fernando Haddad na disputa para o governo paulista, assim como Onyx Lorenzoni está na dianteira sobre Eduardo Leite no Rio Grande do Sul.

De um modo geral, as pesquisas não foram capazes de detectar a força do bolsonarismo na sociedade, maior do que a oposição imaginava. Em relação ao desempenho de Lula não foram registrados erros e o número de votos ficou próximo do que as pesquisas previam, mas houve claramente um desvio estatístico no caso de Bolsonaro e de alguns de seus indicados. Estabeleceu-se uma zona de sombra totalmente ignorada pelos levantamentos que só se revelou no último domingo. A grande questão é o silêncio de milhões de eleitores que preferiram o atual presidente a Lula no primeiro turno e não declararam isso para as pesquisas. O que parece claro é que muitos brasileiros tinham vergonha e por isso não afirmavam seu voto. No dia da eleição, porém, eles mostraram suas verdadeiras intenções. De alguma forma, os conservadores foram mais eficientes no primeiro turno do que a esquerda para atrair o voto útil.