Foram nove dias de incerteza até que a busca pelos 12 meninos tailandeses desaparecidos se transformou em uma missão de resgate. O caso do time de futebol infantil, formado por 12 garotos de 11 a 16 anos, e seu treinador, de 25, chamou a atenção do mundo principalmente depois que um vídeo mostrando o momento exato em que eles são encontrados no interior do complexo Tham Luang Nang Non, na província de Chiang Rai, no norte da Tailândia, foi divulgado e replicado. As imagens expuseram ao mundo um drama como não se via desde que 33 mineiros chilenos ficaram presos em Copiapó, em 2010. O caso dos garotos tailandeses ganhou contornos ainda mais angustiantes pelo enorme grau de dificuldade do resgate, pelo risco de que novas chuvas tornem a missão de salvamento impossível – e, claro, pelo fato de eles serem apenas crianças, que passaram dias e noites de fome, medo e apreensão inimagináveis.

O principal obstáculo enfrentado pelas equipes é o tempo. A chuva que prendeu os garotos e o treinador é uma ameaça constante, e a previsão de tempestades para o final de semana agrava o medo. Especialistas acreditam que se eles não saírem até o próximo sábado 7, o resgate será praticamente impossível até outubro, quando chega ao fim a estação de chuvas na região. Nesse período, eles ficarão a salvo da água, mas sem comunicação e possivelmente sem suprimentos. Para acelerar o processo de retirada, as equipes trabalham com algumas estratégias emergenciais, nenhuma comprovadamente infalível. Até o fechamento desta reportagem, na tarde da quinta-feira 5, a principal operação consistia em bombear para fora da caverna água suficiente para drenar as imensas piscinas formadas pelas chuvas, de modo que eles pudessem simplesmente sair andando, como entraram. Centenas de bombas foram instaladas em um percurso de quatro quilômetros entre a entrada da caverna e a câmara em que o grupo está abrigado. Eles conseguiram diminuir o nível de água em 40%, limpando cerca de 1,5 km do percurso. A ideia é vesti-los com colete salva-vidas para que possam atravessar os poucos trechos que permaneceriam alagados, diminuindo assim o risco de afogamento. O volume de água a ser extraído para que isso dê certo, contudo, não é nada pequeno. A água que está sendo bombeada tem como destino campos de arroz ao redor da caverna. Mesmo que a operação alague as plantações, os agricultores da região não se importam. “Esses meninos são como meus filhos”, disse uma camponesa em entrevista ao jornal The New York Times.

Alternativas

As equipes não descartam outras soluções. A mais arriscada é fazer o resgate com equipamento de mergulho. Nenhum dos garotos tem experiência na prática, que exige técnica para respirar com tanques de oxigênio. Por isso, estão sendo treinados para usá-las. Alguns não sabem nem mesmo nadar. Segundo as equipes de resgate, o percurso da entrada da caverna até onde estão os jovens estão leva seis horas, e outras cinco para retornar. Trechos do complexo de cavernas só permitem que um mergulhador passe de cada vez, dificultando o processo. Algumas passagens são tão estreitas que mal deixam espaço para passar com os cilindros de oxigênio nas costas. As crianças usariam uma roupa específica com uma máscara ligada à bomba de um mergulhador experiente, responsável por guiá-las. Um tanque desses tem oxigênio para duas horas, mas crianças desperadas podem consumi-lo em 20 minutos. Por isso, mais tanques seriam espalhados pelo caminho. A principal dificuldade é impedir que eles se desesperem, já que o trajeto é perigoso e escuro. Elas ficariam à mercê dos responsáveis pelo resgate. O impacto psicológico é grande. Para minimizar seus efeitos, cabos de fibra ótica estão sendo levados até a câmara onde eles estão abrigados para que eles possam falar com seus familiares, mas até agora a operação não foi concluída.

 

Uma terceira opção é encontrar um ponto em que seja possível perfurar a rocha e chegar até o grupo. Cerca de 30 equipes de busca têm vasculhado a região. Como os garotos estão respirando normalmente, supõe-se que existem entradas de oxigênio. A dificuldade reside na profundidade. A câmara onde eles estão abrigados está localizada a uma distância calculada entre 800 metros e um quilômetro sob a superfície.

O esforço atraiu especialistas do mundo inteiro. A equipe envolvida no resgate conta com cerca de 1100 pessoas, incluindo 30 mergulhadores do Comando Indo-Pacífico dos Estados Unidos, além de Navy Seals (da marinha americana), representantes do exército tailandês e especialistas em todo tipo de técnica de remoção e salvamento. Em torno da abertura da caverna foi erguido um acampamento que se assemelha ao Esperança, no Chile, onde o resgate de 33 trabalhadores da mina San José, em 2010, terminou com final feliz. Além das equipes de socorro, jornalistas, familiares dos jovens e curiosos dividem espaço no acampamento com pessoas que prestam solidariedade. O repórter Michael Safi, correspondente do jornal inglês The Guardian, registrou o momento em que uma cabeça de porco chegou ao acampamento, uma oferenda mística para que os garotos sejam salvos.

Os motivos que levaram os garotos ao interior da caverna são incertos. Ben Reymenants, um dos mergulhadores ingleses que está em contato com eles, afirma que tudo fazia parte de uma espécie de ritual de iniciação. Cada um deles deveria gravar seu nome em uma rocha antes de voltar, mas todos foram pegos de surpresa quando uma chuva bloqueou a saída. O nível da água subiu, forçando o grupo a entrar ainda mais fundo no complexo. Um aviso na entrada alertava sobre o perigo das chuvas.
A mãe de um deles deu o alerta de que seu filho estava desaparecido no sábado 23. As buscas começaram e as equipes encontraram bicicletas e outros artigos pessoais do time conhecido como The Moon Pa (“os javalis selvagens”), na entrada da caverna, indicando que o grupo foi para lá após uma sessão de treinamento. Foram dois mergulhadores ingleses que finalmente acharam os meninos. Richard Stanton e John Volanthen, os dois britânicos que os encontraram, fazem parte do South and Mid Wales Cave Rescue Team, um dos 15 grupos especializados em resgates em cavernas que existem na Grã-Bretanha. Eles têm bastante experiência em casos anteriores, como a operação que retirou um grupo de britânicos da caverna de Cuetzal, no México, em 2004. Em 2012, Stanton se tornou Membro da Ordem do Império Britânico. O vídeo feito por eles mostrou que todos estavam bem, mas com fome. Durante os nove dias em que passaram sozinhos ficaram sem comer nada, bebendo água que escorria das paredes de rocha.

ESPERANÇA Richard Stanton e John Volanthen, os dois britânicos que encontraram os meninos, fazem parte de um grupo especializado em resgates em caverna

Mergulhadores experientes levam 6 horas para ir da entrada da caverna até onde o grupo está. A volta exige outras 5 horas

Desde então mergulhadores passaram a levar suprimentos e equipamentos de primeiros socorros. Nenhum dos garotos tinha ferimentos sérios, apenas escoriações menores. Em um dos vídeos divulgados eles aparecem envoltos em mantas térmicas, fracos pelos dias sem comer, mas com bom humor. Um dos Seals que passou um tempo com os garotos disse que eles só queriam saber da Copa do Mundo. A experiência da dupla de mergulhadores e dos demais envolvido, além do histórico de resgates bem-sucedidos, levam esperança para quem acompanha o drama dos garotos. Trazê-los de volta é um desafio movido a perseverança.