País há muito passou os EUA como maior parceiro comercial do Brasil. Com a Coronavac, Pequim quer posar de salvador na pandemia. Será que conseguirá apesar da campanha de Bolsonaro? Alguns argumentos a favor e contra.O Brasil é um dos países mais afetados pelo coronavírus no mundo. Mais de 250 mil brasileiros morreram em decorrência da covid-19. Mesmo assim, o governo brasileiro demorou a imunizar a população. Somente no dia 12 de janeiro foram aprovadas as vacinas Coronavac, do fabricante chinês Sinovac, e AZD 1222, da empresa anglo-sueca AstraZeneca.

Especialistas apontam que a vacinação é o único caminho para a recuperação econômica. Mesmo assim, o governo brasileiro tem executado uma política errática de imunização. O presidente Jair Bolsonaro atacou publicamente a Coronavac, que chegou ao país graças a um acordo fechado pelo goverador de São Paulo, João Doria, desafeto do Planalto. Nas redes sociais, apoiadores do presidente espalharam delirantes teorias conspiratórias sobre a vacina chinesa.

Bolsonaro TAMBÉM chamou com desprezo o imunizante de “vacina chinesa de João Doria”. As falas não só geraram tensões diplomáticas com Pequim, mas também contribuíram para o aumento do ceticismo geral em relação à vacinação.

Por enquanto, a Coronavac continua a ser a única vacina disponível em larga escala no Brasil. Mas o país asiático também é o principal fornecedor de insumos para a fabricação das doses da vacina da AstraZeneca no Brasil.

Diante desse cenário, o governo Bolsonaro tem deixado de lado o tom agressivo com os chineses que caracterizou as relações nos últimos dois anos. Depois da mudança de tom, os insumos foram finalmente liberados e Bolsonaro agradeceu a “sensibilidade do governo chinês” em liberar a carga, num exemplo claro dos resultados da “diplomacia da vacina” que vem sendo executada por Pequim.

Mas será que Pequim vai conseguir melhorar sua imagem atuando como grande produtor de vacinas?

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Sim

Como as vacinas ocidentais ainda não estão disponíveis em maior escala devido a gargalos de fornecimento, há uma oportunidade para a China estabelecer suas vacinas como alternativa no Brasil e em muitos outros países ao redor do mundo. Pequim pode usar isso como um instrumento de política externa. A vacina chinesa Coronavac foi desenvolvida em parceria com o Instituto Butantan e testada no país. Apesar dos conflitos políticos domésticos e dos problemas de política externa com a China, o interesse em uma vacina disponível contra o coronavírus foi maior do que as reservas ideológicas.

Diante do ressentimento do presidente Bolsonaro contra “a vacina chinesa”, as vacinações em massa com a Coronavac significam, portanto, uma vitória diplomática para Pequim. A diplomacia de vacinação da China se encaixa na estratégia de Pequim de criar benevolência em muitas partes do mundo por meio de ajuda durante a pandemia.

A liderança comunista quer evitar um debate sobre os direitos humanos na China. De acordo com o Parlamento da UE, a situação dos direitos humanos na China piorou desde que o presidente Xi Jinping assumiu o cargo, em março de 2013. Em particular, a repressão à minoria uigur e o movimento democrático de Hong Kong atraíram a atenção internacional.

A diplomacia de vacinação de Pequim também funciona em alguns países da Europa. A Sérvia, por exemplo, foi o primeiro país europeu a aprovar a vacina da fabricante chinesa Sinopharm. Pequim está, portanto, se aproximando de seu objetivo de aumentar sua influência política e econômica nos Bálcãs. A região também é de grande importância como um corredor para a Europa Central para a chamada Belt and Road Initiative (Rota da Seda), que visa garantir o controle sobre as rotas comerciais mais importantes.

Não

A China não conseguiu melhorar sua imagem por meio da chamada “diplomacia da vacina”, porque não havia fóruns adequados para isso em nível internacional. Em 2020, não houve nenhuma reunião do G20, cúpula da UE nem um Fórum Econômico Mundial. A China também ganhou manchetes negativas com a tentativa de acobertamento após o início do surto da doença em Wuhan.

A diplomacia da vacina da China no Brasil não é uma proposta de monopólio, já que todos os principais fabricantes de vacinas buscaram o mercado brasileiro e realizaram estudos clínicos no país.

O presidente Bolsonaro rejeitou ostensivamente a chamada “vacina chinesa” por causa de reservas políticas e ideológicas em relação à China. Em outubro de 2020, ele até impediu a tentativa do ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, de comprar doses da vacina da Sinovac. Essa política antichinesa do governo brasileiro gerou tensões diplomáticas entre Pequim e Brasília.

Por causa do ceticismo do presidente Bolsonaro, ostentado publicamente, sobre a vacina em geral e da rejeição da “vacina chinesa” em particular, muitos brasileiros têm reservas sobre a vacina da Coronavac. Segundo pesquisas, cerca de um quinto da população não quer ser vacinado e segue, assim, a linha do presidente.


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