Durante o golpe de 64, muitos militares cometeram atrocidades, mas não se pode generalizar. Nem todos rezavam na cartilha do coronel Brilhante Ustra, um dos maiores torturadores desse período de trevas. O fato é que houve generais que se rebelaram contra a ilegalidade, como foi o caso do general Euryale de Jesus Zerbini. Ele se opôs ao movimento golpista: foi preso e teve os direitos políticos cassados, levando sua mulher Therezinha Zerbini a se transformar em líder da resistência feminina contra a ditadura. Assim como também há hoje generais dignos, comprometidos com a democracia. Os atuais generais não se envolveram na guerra sangrenta dos anos 70 e muitos deles já começam a achar que se equivocaram ao aderir ao governo Bolsonaro, que nunca foi unanimidade nas Forças Armadas: o ex-capitão foi expulso do Exército.

Lembro-me de uma conversa com o general Carlos Alberto Santos Cruz no final do ano passado: ele não aceitou o clima de promiscuidade que reinava no Planalto. Ministro-chefe da Secretaria de Governo durante seis meses, foi achincalhado com ataques do filho do presidente, Carlos, e com palavrões impublicáveis por parte de Olavo de Carvalho. O presidente deu aval aos agressores e ainda o demitiu de forma humilhante. Ocorre que Santos Cruz é um general que dedicou 52 anos ao Exército, comandou as forças pacificadoras no Haiti e no Congo e, desde que foi para a reserva, dá palestras sobre segurança a vários organismos internacionais, em parceria com a ONU. Não merecia passar o que passou no governo de aloprados.

Os oficiais que estão no governo estão sendo pressionados a voltar aos quartéis

Outros generais passaram por um processo de humilhação semelhante, como foi o caso de Rêgo Barros, ex-porta-voz, que, no entanto, saiu atirando e alertando que “o poder corrompe e destrói”, numa clara mensagem a Bolsonaro. O general, Maynard Santa Rosa, se demitiu da Secretaria de Assuntos Estratégicos do Planalto ao perceber que o presidente governava só para um grupinho de amigos. Teve dignidade.

É de se perguntar por que um general como Luiz Eduardo Ramos aceita que um ministro condenado na Justiça por corrupção, e claramente incompetente no combate à catástrofe na Amazônia, o chame de Maria Fofoca e ele fique ali passivo, passeando de moto com o presidente como se estivesse com prestígio. Se os militares tivessem mais força do que os ideólogos nauseabundos, com os filhos no comando, Ricardo Salles teria sido demitido. Mas não, os militares seguem sendo maltratados. Fartos desses constrangimentos públicos, os oficiais da ativa pressionam pela volta aos quartéis dos que estão no governo e recomendam que os generais da reserva façam como Santos Cruz e honrem a farda que um dia vestiram.