04/04/2023 - 11:20
Lula tem quebrado a cabeça nos últimos meses para criar uma marca forte para seu terceiro mandato. Demonstra irritação e impaciência com os ministros. A última reunião ministerial da segunda-feira, transmitida ao vivo pela TV Brasil, é prova disso. Mostrou a angústia com a falta de resultados palpáveis na economia. Tentou inventar um crescimento do PIB no gogó, como um animador de torcida, exorcizando os “pessimistas”.
O resultado da pesquisa Datafolha do último sábado, sobre os três primeiros meses de governo, confirma o desconforto. Sua popularidade é inferior à que atingiu nos dois mandatos anteriores, e a reprovação é a mesma de Bolsonaro no mesmo período, em 2019.
Os cem dias de gestão, a serem comemorados com fanfarra em Brasília e propaganda oficial na TV na próxima segunda-feira (10) terão um sabor agridoce. Há razões para o anticlímax. Lula se elegeu com margem bem apertada e tem um Congresso de maioria oposicionista. Para triunfar, precisou contar com o voto centrista. O presidente foi esperto no recrutamento para seu governo de nomes-chave entre seus rivais de outros partidos, como Geraldo Alckmin e Simone Tebet. Mas na prática ignorou o viés centrista e errou ao privilegiar a comunicação sobretudo para o cercadinho da esquerda.
Ao atacar o ex-juiz Sergio Moro (maior escorregão até aqui), esnobar empresários e destratar o mercado financeiro, o mandatário realimentou o antipetismo e se afastou de moderados que poderiam ampliar a percepção positiva fora das hostes petistas e até em setores conservadores que foram capturados pelo bolsonarismo. Pressionar o Banco Central pela baixa dos juros pode ter soado como música para 80% dos eleitores (como o mesmo Datafolha mostrou), mas não anulou os efeitos deletérios de provocar instabilidade na economia. A dificuldade em transmitir confiança na economia é o maior problema da gestão, segundo a mesma pesquisa.
Se escorregou em várias ações, o governo acertou enormemente ao reinstaurar a civilidade na máquina pública e resgatar as políticas públicas, sobretudo sociais, que tinham sido vilipendiadas pela destruição bolsonarista. Mas isso não é suficiente, como os números mostram.
A principal dificuldade para a atual gestão é modernizar a concepção de governo e abandonar a ideia de apenas reciclar os velhos programas petistas, boa parte ultrapassados ou fracassados. Em mais de 13 anos de governos petistas, o Minha Casa Minha Vida não conseguiu diminuir o déficit habitacional do País, por exemplo. O PAC não acelerou a economia nem revolucionou a infraestrutura, que permanece precária apesar de ter consumido fatias preciosas do PIB. A lição não foi aprendida, porém. O programa vai ser ressuscitado, com verniz “pró-mercado”. Isso dificilmente mudará o jogo.
Lula anuncia uma revolução empreendedora com pequenos e médios empresários, mas na prática seu governo continua criando dificuldades para incentivar a concorrência, preservar marcos regulatórios e garantir a segurança jurídica. Não é com programas superlativos criados por marqueteiros, nem com pretensiosos planos plurianuais saídos da cabeça de burocratas, que a economia vai deslanchar.
O PT tem dificuldades em mudar suas convicções. Tornar-se mais pragmático ou reconhecer os erros parece causar uma crise existencial. E há lições óbvias à disposição dos analistas. Depois da era petista, o marco do Saneamento, o novo marco regulatório das ferrovias e as privatizações de portos e aeroportos abriram caminho para novos investimentos (privados) e a erradicação de chagas históricas. Mas tudo está sendo revertido em nome de uma ideologia anacrônica.
Lula teria muito a se beneficiar se o compromisso social com os pobres também fosse acompanhado por uma visão mais atualizada do mundo e da gestão pública. Apenas resgatar os programas históricos do PT, escondendo os equívocos econômicos e as escorregadas no Petrolão e no Mensalão, não será suficiente para restituir os altos índices de popularidade que Lula conquistou ao deixar o poder, em 2011. Não há mais espaço para as peças publicitárias bombadas de Duda Mendonça e João Santana. É preciso um novo discurso. E uma nova prática.