VIRTUAL Em 2020, as votações foram digitais no Senado, mas a vacina de 2021 poderá mudar esse quadro (Crédito:Waldemir Barreto)

Quando foi lançado, em novembro de 2019, o Aliança pelo Brasil teve seu número, 38, cunhado com munições. Um ano depois, e com a proximidade da eleição de 2022, os cartuchos dos aliados de Bolsonaro se mostraram carregados com balas de festim. Sem um partido para chamar de seu, o presidente deve entrar 2021 reforçando aquilo que ele jamais conseguiu esconder: que seu governo é alicerçado nas legendas da chamada velha política. Será com esse núcleo fisiológico que o capitão tentará se articular em 2021 para almejar um novo mandato, em que pesem os efeitos nefastos dos dois primeiros anos da sua desastrosa gestão.

O mandatário promete, até março, decidir o caminho partidário que vai tomar para pleitear a reeleição, já que sem partido não pode ser candidato. Desde que deixou o PSL, numa tentativa frustrada de tomar para si o caixa da agremiação, Bolsonaro não conseguiu usar sua influência, nem mesmo nas redes sociais, para eleger os candidatos que apoiou nas eleições municipais. Aliás, todos os que apadrinhou foram derrotados. O vexame nas urnas demonstrou que o eleitor rejeitou suas teses extremistas e é uma prova inconteste de que o bolsonarismo caminha para o fracasso eleitoral em 2022.

Com o Aliança natimorto, o presidente ensaia um casamento com legendas tradicionais, mas todas mergulhadas em acusações de malfeitos políticos. As principais opções analisadas pelo bolsonarismo são o PTB, gerido pelo corrupto Roberto Jefferson, e o PP do seu mais novo aliado, Arthur Lira, acusado por uma série de ilegalidades. Se optar pelo PTB, Jefferson já disse que ele não será apenas um soldado, mas um capitão do time. O problema é que faltou combinar com a base parlamentar petebista, que não gostaria de ter ao seu lado a base governista do PSL, que deve acompanhar o presidente na mudança partidária.

Enquanto Bolsonaro entrará 2021 em busca de uma agremiação que abrigue suas incoerências e suas insanidades, seus adversários, em especial o governador de São Paulo, João Doria, chegam ao novo ano com a estratégia já definida de construir uma aliança sustentável com vários partidos de centro, como o PSDB, DEM, MDB, Podemos, Cidadania, entre outros, além de outras legendas de centro esquerda, como a Rede, do senador Randolfe Rodrigues, e o PCdoB, do governador Flávio Dino. Essa união terá que ser capaz de edificar uma frente que viabilize a criação de um projeto “por um novo Brasil”, segundo o próprio Doria verbalizou em entrevista recente à ISTOÉ.

Para fortalecer essa articulação, Doria conta com o sucesso do seu mais ousado projeto para derrotar o negacionismo do presidente: a imunização em massa da população contra a Covid, que passa pela eficácia da Coronavac, a vacina produzida pelo Instituto Butantan, em parceria com o laboratório chinês Sinovac. O governador espera começar a vacinar toda a população paulista já a partir do próximo dia 25 de janeiro. Se a vacina funcionar, como os técnicos acreditam, Doria largará na frente da corrida presidencial, afundando de vez com a credibilidade do ex-capitão e seus retrógrados seguidores.

Parlamentarismo branco

Além dessa batalha político-partidária preliminar, há a questão crucial que diz respeito à política econômica. Logo no início de janeiro, pelo menos 60 milhões de brasileiros ficarão sem o auxílio emergencial de R$ 600 e isso pressionará, de cara, a gestão da economia. Desde que assumiu, Bolsonaro deixou para o ministro Paulo Guedes a responsabilidade total sobre a área econômica. A questão é que a economia depende da política e, neste aspecto, nem Guedes e nem o presidente conseguiram atuar para retirar as amarras que arrastam o País para o fundo do poço. No ano de uma brutal recessão de 5%, provocada pela pandemia, a equipe econômica não conseguiu sensibilizar o Congresso sobre a necessidade de aprovação de uma longa pauta de reformas, como a tributária e a administrativa, deixando o País à beira de uma crise fiscal sem precedentes em 2021.

Além do insucesso na pauta das reformas, a equipe econômica chega ao novo ano sem perspectivas de concretizar seus principais projetos, como propagada pauta de privatizações defendida por Guedes desde o início do governo, mas que até agora não saiu do papel. A escolha dos novos dirigentes da Câmara e do Senado, pode, inclusive, deteriorar ainda mais o quadro econômico. Se o governo conseguir eleger Arthur Lira como presidente da Câmara, o mandatário ficará ainda mais refém do Centrão e vai sentir na pele a força do conglomerado político que tirou Dilma Rousseff do poder. Se o vitorioso for o candidato do grupo liderado por Rodrigo Maia (DEM-RJ), que possivelmente será Baleia Rossi (MDB), o presidente deverá amargar derrotas sucessivas no Congresso, embora as pautas reformistas continuem comandando o processo legislativo. Tudo indica, inclusive, que o novo presidente da Câmara sairá desse núcleo oposicionista. O Brasil, mais que nunca, viverá um parlamentarismo branco.

Enquanto as perspectivas da economia não são nada animadoras, Bolsonaro foca os olhares na eleição presidencial de 2022 na direção do ministro do Desenvolvimento Regional, Rogério Marinho, e deverá jogar a pauta liberal de Guedes ao vento, colocando para escanteio o controle mais rígido dos gastos públicos. Afinal, ele pretende empreender em 2021 uma forte agenda de obras eleitoreiras pensando na reeleição. Tudo isso, claro, se a ala ideológica conseguir vencer a queda de braço com os militares, que ainda não se convenceram de que o País precisa entrar num vale tudo para manter o grupo do ex-capitão no poder por mais quatro anos.

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