O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) fez uma rara e contundente crítica pública à comunicação do próprio governo durante participação no seminário do PT, em Brasília.
A manifestação colocou em xeque o trabalho de Paulo Pimenta (PT), licenciado do cargo de ministro-chefe da Secom (Secretaria de Comunicação Social), e estratégias anteriormente questionadas por lideranças de dentro e fora da administração. Neste texto, o site IstoÉ recapitula as razões da crise exposta pelo chefe do Executivo.
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O que o presidente disse
“Há um erro no governo na questão da comunicação, e eu sou obrigado a fazer as correções necessárias para que a gente não reclame que não está se comunicando bem”, afirmou Luiz Inácio Lula da Silva em participação no seminário do PT.
O alvo da crítica
Sem endereço declarado, a fala de Lula tem como receptor natural Paulo Pimenta, ministro responsável pela comunicação do Palácio do Planalto.
Prestigiado pelo patrão e visto como um ativo importante do petismo gaúcho, Pimenta se licenciou da Secom quando foi designado — justamente por essas razões — para comandar a Secretaria Extraordinária de Apoio à Reconstrução do Rio Grande do Sul, criada para gerir os repasses do governo federal à recuperação da tragédia climática no estado.
Os jornais O Globo e Folha de S. Paulo reportaram que, após a reclamação pública de Lula, a permanência do chefe da Secom no cargo ficou improvável — ainda que ele continue no governo. Na segunda-feira, 9, Pimenta ficou de fora de uma encontro no Planalto que reuniu Lula com 16 de seus ministros.
Na mesma data, em entrevista ao site Metrópoles, o ministro buscou se desvencilhar da crítica e disse não ser marqueteiro. “Foi uma avaliação crítica sobre a comunicação que vai para além do governo. Quer dizer, a esquerda, o PT, a dificuldade, a incapacidade que a esquerda tem tido de construir uma narrativa capaz de fazer frente ao avanço da extrema-direita, que é uma preocupação que eu também tenho”, declarou.
Os pontos de tensão
Esta não foi a primeira vez em que a comunicação do governo federal foi alvo de críticas desimpedidas. Parlamentares do partido já haviam reconhecido, sem citar nomes, problemas na área.
Em linhas gerais, as avaliações públicas e privadas são de que dados positivos da gestão, como a projeção de alta anual de 3,3% do PIB (Produto Interno Bruto) e a taxa de 6,2% de desemprego, menor já registrada pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), não são devidamente exploradas. Em maio de 2024, 73,4% dos entrevistados ouvidos pela Paraná Pesquisas não souberam apontar realizações do governo atual, que ostenta alto índice de desaprovação.
Por essa linha de raciocínio, o receio é de que os erros resvalem na continuidade do projeto, que será testada (com Lula ou outro nome) nas urnas em 2026 — para se eleger, vale lembrar, o presidente venceu um segundo turno com a menor vantagem da história sobre o candidato derrotado, Jair Bolsonaro (PL).
Para além do saldo geral, no entanto, outros episódios contribuíram para o desgaste. Ainda nos primeiros meses de mandato, em abril de 2023, a organização da Agrishow, principal feira de agronegócios do país, anunciou a retirada do convite ao ministro da Agricultura, Carlos Fávaro (PSD), e a confirmação da presença de Bolsonaro.
Pimenta reagiu anunciando que o Banco do Brasil deixaria de patrocinar o evento. Em um contexto em que Lula trabalhava para se reaproximar do setor, que teve parte relevante migrando para o bolsonarismo, a decisão soou como uma retaliação ideológica, negativa para uma administração que prometeu amplitude. No fim das contas, o banco estatal manteve stand e anúncios na Agrishow.
Em janeiro de 2024, as páginas do governo federal nas redes sociais usaram uma postagem institucional de incentivo ao trabalho dos agentes comunitários no combate à dengue para provocar o vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ), cujos endereços foram alvo de uma operação da Polícia Federal na mesma data.
✊✊✊ Quando os agentes comunitários de saúde baterem à sua porta, não tenha medo, apenas receba-os. 😉
Com o aumento no números de casos de dengue no país, o trabalho dos agentes comunitários de saúde é essencial para a prevenção da doença. pic.twitter.com/GJtjO0zpZe
— Governo do Brasil (@govbr) January 29, 2024
Em paralelo, o Planalto patinava no objetivo de ampliar o alcance de seus feitos. Popularizadas pelo antecessor, que as fazia semanalmente durante seu mandato, as lives presidenciais do petista passaram de 100 mil visualizações apenas na edição de estreia e não foram além de 11 edições, sendo descontinuadas pela Secom sem maiores explicações.
Mais recentemente, a pasta não concluiu uma licitação para contratar quatro empresas de comunicação digital — um contrato de R$ 197,7 milhões — após a suspensão da concorrência por determinação do TCU (Tribunal de Contas da União), que identificou indícios de quebra do sigilo das propostas das empresas licitantes.
Se as coisas no campo digital não fluem, os chamados meios tradicionais de comunicação também não impulsionaram a gestão, como o próprio Lula admitiu no mesmo seminário petista. “O [Ricardo] Stuckert sempre fala que eu sou o maior comunicador do partido, que tenho que falar mais. E a verdade é que eu não tenho organizado as entrevistas coletivas, elas não têm sido organizadas. Eu adoro falar em rádio e é preciso que a partir de agora a gente faça as coisas, porque nossos adversários não irão falar bem de nós”, avaliou o presidente.