CADEIA Produção de equipamentos de parques eólicos é baseada em derivados do cobre, assim como ocorre com as placas de captação solar (Crédito:serts)

Poucos dias antes de o ministro do Meio Ambiente, Joaquim Leite, anunciar que o Brasil neutralizará suas emissões de carbono até 2050, na abertura da Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP-26), na Escócia, o governo divulgou um dado revelador a respeito do cumprimento dessa meta. De janeiro a setembro deste ano, 44% de tudo o que País exportou esteve concentrado em três tipos de commodities: petróleo, minério de ferro e soja. Há oito anos, esse percentual era de 31%. Em outras palavras, a economia brasileira tem se tornado cada vez mais primária, dependendo fundamentalmente da venda de produtos de pouco valor agregado. Mais do que isso, o País tem ficado refém da exploração de insumos que, na contramão do discurso oficial, têm impactos significativos sobre o meio ambiente. Os derivados de petróleo são altamente poluentes, os minerais ameaçam áreas de conservação e a soja consome grandes quantidades de insumos cada vez mais escassos, como a água. Um dilema importante para o Brasil, para o qual o governo Bolsonaro deu as costas até agora.

BRUMADINHO Passado recente das barragens do País é trágico: dois graves acidentes em 3 anos (Crédito:WILTON JUNIOR)

O tema ganha ainda mais relevância porque a produção mineral é o motor da economia limpa, já que fornece insumos às indústrias de energia eólica e solar. É uma solução e, ao mesmo tempo, um problema. “Temos que encontrar uma conciliação”, diz o professor Luiz Enrique Sánchez, da Escola Politécnica da USP. “Deve haver um equilíbrio entre a demanda por minerais que suportem a transição energética e a expansão dessa produção sobre áreas de proteção ambientais”, afirma.

Até agora, o Brasil parece ter escolhido apenas um dos lados desse problema. O minério de ferro é um dos principais produtos exportados pelo País. As receitas desse negócio devem crescer 60% em 2021 na comparação com o ano passado, segundo previsão da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB). Se esse montante for confirmado, ele vai conseguir desbancar a soja como principal commodity do País. E a China é o principal cliente, consumindo dois terços (64,5%) dessa produção.

Esse boom mostra uma dependência cada vez maior do País com o setor. De janeiro a agosto deste ano, o segmento mineral faturou o dobro do registrado no mesmo período de 2020. O montante foi da ordem de R$ 218 bilhões, segundo o Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram). Entram nessa conta o cobre, o nióbio e o manganês. “Foi um período marcado pela demanda reprimida, especialmente da China”, observa Júlio Nery, diretor da entidade. “Há o impacto dos preços, que ficaram muito altos por conta disso”, completa. O cobre, em especial, teve uma valorização expressiva de 100% no último ano — isso em meio a uma queda da produção mundial. Como o Brasil é um dos lideres globais nesse mercado, esses últimos meses marcaram o início de uma corrida pelo metal, principalmente a partir da indústria chinesa de automóveis elétricos.

Se garante resultados positivos na balança de exportações, o cobre também impõe um custo alto para o meio ambiente: a exploração do metal pode destruir ecossistemas inteiros durante sua fase de remoção, enquanto o processo de minerá-lo é ainda mais prejudicial: por gerar muitos rejeitos — conjunto de materiais utilizado durante o processo e descartado posteriormente —, contamina boa parte dos lençóis freáticos e o solo ao redor. Estudos já indicaram que apenas 1% de tudo o que é extraído nessa produção é aproveitado na sequência da cadeia. O resto é descartado, mas fica armazenado em barragens. O Brasil, infelizmente, conhece bem esse problema. De 2018 para cá, duas delas romperam em Minas Gerais: uma em Mariana e outra em Brumadinho. É por isso também que a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) apontou a extração do cobre e a do níquel como as duas atividades mais ambientalmente destrutivas. Quanto mais vende, mais o Brasil se distancia das suas próprias metas ambientais. “Essa equação depende da capacidade de o governo proteger o meio ambiente através de licenças. Isso está enfraquecido no Brasil”, lamenta Sánchez.