A Venezuela tem as maiores reservas comprovadas de petróleo do mundo. A riqueza fóssil, porém, é também uma maldição: a alta no preço do recurso na primeira década deste século foi o que permitiu ao presidente Hugo Chávez, morto em 2013, comprar apoio da população mais carente, por meio de programas assistencialistas, e de governos de países vizinhos, no que ficou conhecido como petrodiplomacia. Quando o valor do barril de petróleo começou a cair e as decisões desastrosas de viés socialista destruíram a capacidade produtiva do país, castigando a população com desabastecimento de comida e outros itens básicos, o coronel passou a direcionar os minguantes recursos para comprar o apoio dos militares — cuja cúpula ganhou privilégios e o controle direto da PDVSA, a estatal petrolífera, e de outras áreas da economia. Essa estratégia coincidiu com o endurecimento do regime chavista e é o que sustenta até hoje o combalido e isolado governo de seu sucessor, Nicolás Maduro. Por ironia, o principal financiador desse esquema sempre foram os Estados Unidos, que importam a maior parte do petróleo produzido pela Venezuela. Isso vai acabar.

FINALMENTE John Bolton e Steven Mnuchin anunciam o bloqueio de ativos da PDVSA (acima) (Crédito:Mandel NGAN / AFP)

Na segunda-feira 28, o governo do presidente Donald Trump impôs um embargo ao petróleo venezuelano. Ele mandou bloquear cerca de 7 bilhões de dólares da Citgo, a subsidiária americana da PDVSA. Isso significa que Maduro não poderá movimentar as contas com o dinheiro da venda de petróleo enquanto não ceder o poder de fato da Venezuela a Juán Guaidó, o chefe da Assembleia Nacional que se declarou presidente do país no último dia 23 e que foi reconhecido por inúmeros governos, inclusive os dos Estados Unidos e do Brasil. Além disso, todo pagamento adicional que refinarias americanas fizerem pela compra de petróleo venezuelano ficarão igualmente congeladas, o que pode representar uma perda de 11 bilhões de dólares para o governo Maduro nos próximos doze meses.

Nem um tostão a mais

A medida, anunciada por Steven Mnuchin, secretário do Tesouro, e John Bolton, conselheiro de Segurança Nacional da Casa Branca, pretende levar a ditadura de Nicolás Maduro à asfixia financeira. Afinal, o petróleo representa 90% das exportações venezuelanas e os Estados Unidos compram nada menos que quatro em cada dez barris que saem do país. Maduro disse que vai procurar outros compradores, mas não é tão fácil quanto parece. Para a China e para a Rússia, dois de seus principais parceiros comerciais e que seguem apoiando politicamente o seu regime, Maduro deve 31 bilhões de dólares, sendo 21 bilhões para Pequim e 10 bilhões para Moscou. Os valores estão sendo amortizados com o envio de petróleo. Ou seja, Maduro não receberá um tostão a mais se aumentar a exportação para esses países. Na verdade, ele sequer está conseguindo cumprir com o prometido. O acerto era de que deveria enviar 600 mil barris diários à Rússia e 300 mil à China, mas só está mandando a metade disso. A razão é que a produção pretolífera venezuelana está em queda — por incompetência e falta de investimentos.

“Estamos evitando que Maduro siga desviando os recursos, para preservá-los para o povo” Steven Mnuchin, secretário do Tesouro

Durante a maior parte do gestão Chávez, o país produzia 2,5 milhões de barris diários. No ano passado, a produção estava em 1,5 milhão de barris. Este ano, a previsão é de que cairá para menos de 1 milhão. O único outro grande comprador de petróleo venezuelano que se mantém neutro é a Índia, que absorve cerca de 17% das exportações do país. Mas os indianos não têm capacidade para substituir os americanos como maiores importadores do petróleo venezuelano. E há também um percalço técnico criado pelo governo dos Estados Unidos: Trump decidiu proibir a venda de petróleo leve, que é misturado em menores quantidades ao petróleo mais pesado da Venezuela para possibilitar o seu transporte por oleodutos. Com isso, na prática, a Venezuela não tem como exportar seu produto e também corre o risco de não conseguir produzir combustível para consumo interno. Tudo caminha para um caos ainda maior na economia bolivariana.

Maduro reagiu com ameaças e com um blefe. Primeiro, mandou que a Justiça venezuelana, ainda submissa ao seu regime, autorizasse o bloqueio das contas pessoais de Guaidó e encomendou uma investigação do líder opositor por “atos violentos” nos protestos de duas semanas atrás. Em seguida, disse estar disposto a negociar com a oposição e a convocar novas eleições legislativas. Sempre que se vê acuado, Maduro promete negociações para ganhar tempo. Dessa vez, porém, o que tem a oferecer não satisfaz nem à população, nem à oposição, nem à comunidade internacional. Em breve, não terá mais nada a oferecer sequer aos comandantes militares que sustentam o seu poder na base da bala e da tortura. Nunca o fim de Maduro pareceu tão próximo.