15/11/2018 - 19:00
Começou como uma piada.
Perguntaram ao candidato quais as mudanças seu plano de governo propunha para a economia.
Ele, como não fazia a menor ideia do que responder, pediu aos jornalistas que perguntassem ao seu recém apontado ministro:
– “Pergunta no Posto Ipiranga!” — numa referência ao filme comercial do posto de gasolina que tem de tudo.
Todos riram.
Brincadeira ingênua, só para quebrar o gelo.
Durante algumas semanas, o presidente repetiu a mesma piada, para diversos assuntos.
Sempre com o mesmo efeito.
Divertido, esse presidente, todos pensavam.
E assim foi.
Se elegeu.
Em janeiro de 2019, o presidente assumiu o cargo.
A cerimônia, como sempre muito pomposa, com autoridades locais e internacionais.
Ao final, um jornalista conseguiu se infiltrar e, em rede nacional, disparou uma pergunta simplória:
– E aí presidente? Está feliz?
– Opa! Sabe como é, “O Primeiro Sutiã A Gente Nunca Esquece!”, né verdade?
O jornalistas se entreolharam, rindo amarelo, tentando entender a piada.
Analistas sugeriram que o presidente pretendia ampliar os investimentos na área têxtil.
Mas a verdade é que foi aí que a coisa começou a encrencar, para os mais observadores.
Porque sempre que era confrontado com alguma dúvida da imprensa, o presidente se saia com um slogan publicitário.
Não importava o assunto.
Uma pergunta séria como:
– Tudo bem com a mudança da embaixada, presidente?
Resultava num enigmático:
– Opa! “Amo muito tudo isso!”
Alguns jornalistas queriam acreditar que aquela estratégia passaria com o tempo. Que era apenas uma tentativa de se familiarizar com os meandros do poder, evitando declarações polêmicas.
Mas o presidente não estava nem aí.
Era uma metralhadora de frases publicitárias.
Todas as perguntas que lhe faziam, a resposta vinha do mesmo jeito: slogans. Velhos, novos, não importa.
Uma coisa raríssima.
– Presidente, o senhor acha que o Lula tem que continuar preso?
– Claro! Curitiba é “Lugar de Gente Feliz”.
– E o reajuste do salário mínimo, presidente?
– “Abuse e Use!”
Um jornalista foi mais fundo na questão.
Perguntou ao ministro da Justiça como eram as reuniões internas no Planalto.
– Nessas reuniões o presidente se expressa normalmente? Ou também só fala em slogans?
O ministro nem se deu ao trabalho de responder. Apenas revirou os olhos.
Aquilo tinha virado uma obsessão. Um T.O.C., sei lá.
Pior. Alguns cujo convívio com o presidente era mais frequente, estavam assimilando o vício também.
O vice-presidente, sem papas na língua, quando assumiu o governo numa viagem do presidente, foi questionado se estava tranquilo para ocupar o cargo temporariamente:
– “Deu Duro, Tomo Um Dreher!”
A primeira dama numa viagem pelo interior, mostrou o novo programa de alimentação para comunidades carentes:
– “Vale por um bifinho!”
Quatro anos se passaram e a estratégia de falar por slogans do presidente parecia ter dado resultado.
Economia aquecida, corrupção tinha praticamente desaparecido, índices de violência mais baixos que nunca.
Foi chegando o período da eleição e o país estava de vento em popa.
O presidente chamou, então, uma reunião onde — todos sabiam – pretendia se lançar candidato à reeleição e queria contar com o apoio de todos os ministros:
– Afinal, “Quem pede um, pede bis!”. — não perdeu o hábito.
Todos aplaudiram efusivos.
Estavam com o presidente para o que desse e viesse.
Menos o ministro da Justiça.
Esse já estava por aqui dessa palhaçada e tinha planos bem diferentes.
Esperou que todos saíssem da sala e no seu jeito muito discreto e reservado, revelou:
– “Eu Sou Você Amanhã”, presidente.