O presidente francês, Emmanuel Macron, pediu nesta terça-feira (15) um diálogo “sem tabus” ao abrir um grande debate nacional para tentar desativar os protestos dos “coletes amarelos”.
Este debate está “aberto a todos os temas (…) não deve haver tabus”, declarou Macron durante um encontro com 600 prefeitos e representantes locais em Grand Bourgtheroulde, um pequeno povoado da Normandia (noroeste).
Com este diálogo nacional o presidente tenta arrefecer as manifestações dos “coletes amarelos”, um coletivo de franceses que protesta em todo o país desde meados de novembro contra a política social e fiscal do governo, que considera favorecer os ricos.
“Acho que podemos converter este momento que a França atravessa em uma oportunidade”, considerou o presidente de 41 anos. “Devemos pedir constantemente a opinião das pessoas. Não acho que seja um tempo perdido, nem tempo de deter as reformas, porque as pessoas querem mudanças”.
Também reiterou o seu pedido para acabar com a “violência” que manchou alguns protestos. “A ira nunca trouxe soluções”, apontou.
Esta reunião, que durou 06h30 e durante a qual o presidente falou por 3h30, marcou o início de dois meses de diálogo nacional que será estruturado em torno de quatro grandes temas: o sistema fiscal e a ação pública, o funcionamento do Estado e dos coletivos públicos, a transição ecológica e a democracia.
Neste primeiro debate, Emmanuel Macron deixou claro, no entanto, que não estava de acordo com a instauração do Referendo de Iniciativa Cidadã (RIC), uma das principais reivindicações dos “coletes amarelos”.
“Quando há uma decisão difícil de tomar, frequentemente são os representantes que a tomam porque integram as imposições. É raro que se tomem decisões difíceis por referendo”, insistiu o presidente francês.
“Vejam o que vivem nossos amigos britânicos”, explicou.
“O povo votou não a partir de falsas informações e mentiras. E seus representantes são incapazes de aplicá-lo”, acrescentou, enquanto o Parlamento britânico rejeitava categoricamente o acordo do Brexit negociado com Bruxelas.
As propostas obtidas servirão para construir “um novo contrato para a nação”, explicou no domingo o presidente em uma carta aberta aos franceses, na qual prometeu anúncios um mês depois do encerramento da consulta.
– Sentimento de abandono –
As autoridades intensificaram as medidas de segurança durante a visita de Macron a Grand Bourgtheroulde, cidade de 3.500 habitantes a 30 quilômetros de Rouen, onde uma manifestação dos “coletes amarelos” no sábado terminou em confrontos com a polícia.
Macron, que evitou as reuniões públicas desde que foi vaiado durante duas saídas públicas em dezembro, ouviu durante pouco mais de duas horas as preocupações de 20 prefeitos, que abordaram questões de poder aquisitivo, justiça fiscal, nível das aposentadorias e a queda dos serviços públicos nas zonas rurais.
Muitos vereadores mencionaram um sentimento de abandono por parte do Estados nas regiões rurais isoladas, com uma redução dos serviços públicos, e um abismo cada vez maior em relação a Paris e outras grandes cidades.
“Sentimos como se houvesse uma França de duas velocidades e nos questionamos se não estamos na categoria B”, disse a Macron Jean-Paul Legendre, prefeito de Iville, cidade de 500 habitantes perto de Rouen.
“Nos sentimos isolados mesmo estando a somente 160 quilômetros de Paris”, afirmou Jean-Noel Montier, prefeito de Mesnil-en-Ouche.
– Retomar a iniciativa –
A polícia usou gás lacrimogêneo para dispersar 100 manifestantes, muitos deles usando coletes amarelos, que se reuniram em uma estrada nos arredores de Grand Bourgtheroulde para receber a caravana de Macron.
“Macron, renuncie!”, gritavam alguns entre a multidão.
“Simbolicamente é importante estarmos aqui. É o primeiro dia de debate, continuaremos aqui, seremos a sua sombra”, declarou um deles, Thierry-Paul Valette.
A tarefa de Macron será árdua para convencer os franceses, muitos dos quais não veem utilidade nesta discussão. Segundo uma pesquisa Elabe para a emissora BFMTV, divulgada nesta terça, 40% dos cidadãos querem participar das conversas, mas somente 34% consideram que ajudarão a sair da grave crise política que a França atravessa.
Contudo, as apostas são altas para o presidente, que deve demonstrar que, apesar de sua pouca experiência política, é capaz de restabelecer a ordem pública e retomar a iniciativa a quatro meses das eleições europeias nas quais a ultradireitista Marine Le Pen falou em “derrotá-lo”.