EDUARDO SIMÕES

DESAFIO O hoje ministro Franklin Martins bateu boca com Costa e Silva em 1968

Em 2 de julho de 1968 Franklin Martins entrou pela primeira vez no Palácio do Planalto. Integrava uma delegação que o presidente de plantão na época, o marechal Costa e Silva, aceitara receber após a Passeata dos 100 Mil. Ele e outro estudante, Marcos Medeiros, quase foram barrados porque estavam sem gravata. “O embaixador de Gana não vem aqui em trajes típicos? Esses são os trajes típicos dos estudantes”, reagiu Franklin. Após muita negociação, conseguiram entrar. Ao se apresentar a Costa e Silva, nova provocação: “Franklin Martins, da ex-UNE”, disse ele, lembrando que a entidade tornara-se clandestina. Na pauta dos estudantes, a libertação dos presos políticos. Nova saia-justa protagonizada por Franklin: “Não viemos aqui barganhar”, avisa ao presidente. Até que Marcos Medeiros radicaliza: “Escuta aqui, professor, você vai ou não libertar nossos companheiros?” De cara amarrada, o marechal presidente bateu forte com as mãos sobre a mesa: “Eu não aceito ultimato nem desrespeito!”

Três meses depois, em outubro, Franklin foi preso no congresso da UNE em Ibiúna. Ao lado dele, o cearense José Genoino. Alguns anos depois, Genoino estaria na guerrilha do Araguaia. Franklin saiu da prisão na véspera do AI-5. Franklin sairia de cena para dar lugar a Waldir, seu codinome no MR-8. Um ano depois, estaria à frente do seqüestro do embaixador americano Charles Elbrick, ao lado do então jornalista Fernando Gabeira. Com o seqüestro, Franklin, Gabeira e seus companheiros libertam 15 presos políticos, entre eles o estudante José Dirceu de Oliveira e Silva.

No mesmo mês em que Franklin pisava o Palácio do Planalto para confrontar Costa e Silva, o músico Gilberto Gil lançava, juntamente com Caetano Veloso e outros artistas o movimento tropicalista. Em dezembro, após o AI-5, Gil e Caetano acabaram presos e depois seguiram para o exílio. Era um momento em que Dilma Rousseff não tinha muito tempo para ouvir música. Primeiro na Política Operária (Polop) e depois no Comando de Libertação Nacional (Colina), ela estava na luta armada. Em 1970, foi presa e torturada.AG. ISTOÉ

DEPUTADO Hoje na oposição, Gabeira seqüestrou o embaixador americano

Quarenta anos depois, todos esses personagens encontram- se em Brasília, de alguma forma vinculados ao poder. Franklin é ministro-chefe da Secretaria de Comunicação Social da Presidência e usa gravata todos os dias. Dilma Rousseff é a ministra da Casa Civil, gerente dos programas do PAC e uma das principais apostas do presidente Lula para a sua sucessão. Ela substitui José Dirceu, cassado como deputado por envolvimento com as denúncias do mensalão, mas ainda dono de forte influência no PT. O mesmo PT que foi presidido por Genoino, hoje longe dos holofotes também em conseqüência das denúncias do mensalão. Algumas quadras adiante dos gabinetes de Dilma e Franklin, Gilberto Gil é o ministro da Cultura. Na oposição ao governo, na Câmara, está Fernando Gabeira, parlamentar pelo PV do Rio de Janeiro.

EX-RADICAIS Dilma, da guerrilha à sucessão de José Dirceu no governo

As conseqüências de um ano tão marcante acompanhariam as vidas de todos eles. “Sou filho da luta contra a ditadura, neto da luta contra o fascismo”, diz Franklin. “Aquelas idéias orientam a minha vida política até hoje.” “De uma certa forma, o que vim a fazer depois de 68, com impactos muito importantes na minha música e na minha atitude pode ser projetado para o que continuo fazendo ainda hoje”, reforça Gilberto Gil. “Somos sobreviventes de uma geração que não tinha medo de correr riscos para defender o que acreditava”, diz Genoino.