21/01/2018 - 15:12
Soldados turcos invadiram, neste domingo (21), uma região do norte da Síria controlada pelos curdos, no segundo dia de uma grande ofensiva contra a milícia curdo-síria, considerada “terrorista” pela Turquia, que pode agravar o conflito que assola o país.
Citado por veículos de comunicação turcos, o primeiro-ministro Binali Yildirim anunciou que militares entraram em território sírio às 11H05 locais (06H05 de Brasília) na região de Afrin (norte), controlada pela milícia curda Unidades de Proteção do Povo (YPG), também atacada pela aviação e pela artilharia de Ancara.
O secretário de Defesa dos Estados Unidos, Jim Mattis, afirmou neste domingo que a Turquia avisou aos Estados Unidos antes de lançar a operação e considerou “legítimas” as preocupações de segurança turcas.
“A Turquia foi sincera. Nos advertiram antes de lançar o ataque aéreo, nos disseram que o fariam em consultas conosco, e agora estamos trabalhando no caminho a seguir com o ministério de Relações Exteriores”, disse Mattis a jornalistas a bordo de um avião antes de começar uma visita pela Ásia.
A declaração de Mattis se dá em meio a temores de que a ofensiva turca pudesse tornar ainda mais tensas as relações entre Ancara e Washington, que mais cedo havia pedido “contenção” à Turquia.
Os Estados Unidos apoiam uma coalizão árabe-curda, da qual fazem parte as YPG, para combater os extremistas do grupo Estado Islâmico (EI).
O Irã, que patrocina com Moscou e Ancara o processo de Astana, o qual permitiu criar zonas de distensão na Síria, expressou preocupação e pediu para Ancara exercer um “papel construtivo” na solução da crise síria.
Atendendo a um pedido da França, o Conselho de Segurança da ONU abordará a portas fechadas na segunda-feira, às 11h30 locais (14h30 de Brasília), o agravamento da situação humanitária na Síria, após o início da ofensiva turca contra as YPG e os bombardeios do governo sírio em Idleb e na Guta Oriental, perto de Damasco.
“A França está muito preocupada com a (…) degradação brutal da situação” na Síria, declarou neste domingo o chefe da diplomacia francesa, Jean-Yves Le Drian.
Segundo o Observatório Sírio de Direitos Humanos (OSDH), ao menos onze civis, entre eles cinco crianças, morreram neste domingo em bombardeios contra a Afrin. O balanço anterior era de oito mortos.
No sábado, um porta-voz das YPG tinha informado que dez pessoas, entre elas sete civis, haviam morrido em bombardeios turcos.
No segundo dia desta operação, batizada “Ramo de Oliveira”, o exército turco informou ter destruído “45 alvos”, entre eles esconderijos de armas. Ancara assegura ter atingido apenas alvos “terroristas” nos bombardeios e acusa as YPG de fazer “propaganda”.
As autoridades turcas acusam as YPG de terem iniciado o lançamento de foguetes contra duas cidades fronteiriças turcas, que deixaram um morto e cerca de 40 feridos, um balanço que não pôde ser verificado de forma independente até o momento.
Em uma advertência inédita, o presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, afirmou que qualquer um que se manifeste na Turquia contra a ofensiva “pagaria um alto preço”.
Forças de segurança turcas impediram, neste domingo, a celebração de duas manifestações, em Diyarbakir (sudeste) e Istambul, segundo correspondentes da AFP.
– Tanques na fronteira –
Um correspondente da AFP na região viu neste domingo quatro peças de artilharia turca abrindo fogo em direção a povoados da região de Afrin, e um comboio de tanques e de militares turcos aguardavam para entrar na Síria.
O chefe da diplomacia turca, Mevlut Cavusoglu, afirmou que as Forças de Ancara tomaram “povoados” controlados pelas YPG em Afrin, sem dar maiores detalhes.
Os combatentes curdos “vão fugir e nós os perseguiremos”, ameaçou Erdogan, durante um discurso em Bursa (noroeste). “Se Deus quiser, terminaremos esta operação em muito pouco tempo”, acrescentou.
Em reação às informações sobre a entrada de soldados turcos na Síria, as YPG afirmaram ter freado uma incursão. “A Turquia queria entrar em Afrin, mas freamos seu ataque”, afirmou um porta-voz das YPG, Birusk Hasaké.
A Turquia acusa as YPG de serem o braço sírio do Partido dos Trabalhadores do Curdistão (PKK), que conduz há 30 anos de uma rebelião armada no sudeste da Turquia, povoado majoritariamente por curdos, e consideradas por Ancara e seus aliados ocidentais uma organização “terrorista”.
Esta é a segunda ofensiva turca no norte da Síria, depois de outra lançada em agosto de 2016 para empurrar o EI rumo ao sul, mas também para deter a expansão dos combatentes curdos.
Aproveitando o conflito sírio, que deixou mais de 340.000 mortos desde 2011, os curdos sírios – marginalizados há muito tempo – instalaram em 2012 uma administração autônoma em Afrin, território isolado de outras zonas controladas pelas YPG, mais a leste.
– “Degradação” –
A ofensiva turca ocorre após o anúncio da coalizão internacional antijihadista, liderada pelos Estados Unidos, de criar uma “força fronteiriça”, integrada por combatentes curdos, um projeto que desatou a ira de Ancara.
Segundo Yildirim, o objetivo da operação “Ramo de Oliveira” é estabelecer uma “zona de segurança”, com uma extensão de 30 km a partir da fronteira turco-síria.
As ameaças de intervenção turca geraram preocupação em Washington, para quem uma ofensiva não seguiria “no sentido da estabilidade regional”.
Diante desta ofensiva turca, a Rússia pediu “moderação” às partes, mas os analistas consideram que não se pode lançar nenhuma ofensiva importante na Síria sem o aval de Moscou, que controla o espaço aéreo deste país em guerra.
Além disso, o presidente sírio, Bashar al-Assad, condenou neste domingo a operação turca em Afrin, e acusou Ancara de “apoiar o terrorismo”.