“Bateram nele com um grande tronco […]. Eu ouvia os ossos dele quebrando”. Debbie Turner conta no lar de idosos onde vive a lenta agonia de seu marido, que foi espancado por agressores negros até a morte em sua fazenda da África do Sul.
Robert “Oki” Turner, um fazendeiro branco de 66 anos, passou a engrossar há seis meses a longa lista de vítimas de um dos legados envenenados do apartheid, os “assassinatos de agricultores”.
Um quarto de século depois do fim do regime segregacionista, o país vive uma situação de violência, fracassos econômicos e divisões raciais.
“Até quatro ou cinco anos atrás vivíamos felizes” em uma fazenda nas montanhas de Limpopo (nordeste), recorda Debbie.
Mas a violência extrema das grandes cidades se estendeu às províncias, com assaltos, tomadas de reféns e execuções, às vezes em troca de resgates ridículos, como uma caçadeira ou um aparelho de telefone.
No último 14 de junho, foi a vez dos Turner. Em plena noite, homens armados irromperam em sua fazenda.
– ‘Não me estuprem’ –
“Arrastaram-me para dentro da casa, colocaram-me debaixo do chuveiro e queriam me estuprar”, conta a sexagenária. “Eu disse a eles: ‘Tenham piedade, não me estuprem, tenho aids'”.
Os assaltantes arrastaram depois “Oki” para o lado dela e lhe deram uma surra, antes de roubar milhares de randes do cofre.
Robert Turner morreu pouco depois, no hospital.
A cada ano, dezenas de agricultores brancos morrem na África do Sul de forma violenta, embora não existam estatísticas detalhadas sobre estes crimes.
A ONG AfriForum, porta-voz da minoria branca (9% da população), fez deste um de seus principais combates.
“A África do Sul é um país muito violento”, reconhece o vice-presidente da organização, Ernst Roets. “Mas estes ataques também têm uma causa política. Alguns dirigentes predicam o ódio contra os fazendeiros brancos e os acusam de todos os males”.
Em sua mira está Julius Malema, chefe da esquerda radical que exorta a “tomar a terra” dos brancos, e o presidente, Jacob Zuma, que em 2010 entoou o cântico revolucionário “atirem no fazendeiro, atirem no boer (descendente de colono holandês)”.
A agricultura sul-africana continua controlada, em grande parte, pelos descendentes dos colonos. Os agricultores brancos possuem 73% das terras, segundo um estudo recente.
– Mesma condenação –
Em um contexto de desemprego maciço, florescem os chamados à “transformação radical da economia” em benefício dos negros.
“Os negros acreditam que roubamos o país deles”, aponta o agricultor Gerhardus Harmse. “Mas fomos nós que o construímos”.
Esta posição extremista é muito ativa. No final de outubro, seus partidários provocaram um escândalo ao mostrar a antiga bandeira da África do Sul em manifestações nas que os fazendeiros brancos pediam ao governo medidas concretas de proteção.
O ministro da Polícia, Fikile Mbalula, negou-lhes qualquer tratamento privilegiado em um país onde a cada dia morrem 52 pessoas devido à violência, em sua maioria negros.
“O assassinato de qualquer sul-africano deve ser condenado da mesma forma”, afirmou.
Os agricultores negros também sofrem com a insegurança, mas resistem a se unir ao combate de seus colegas brancos. “Não aceitamos que alguns utilizem seu status de agricultores para difundir um discurso de extrema-direita”, explica Vuyo Mahlati, presidente da Associação de Agricultores Africanos (Afasa).
Ao se considerarem abandonados pelo governo, muitos agricultores brancos garantem sua segurança com seus próprios meios, às vezes patrulhando durante a noite, armados com pistolas.
“É preciso se proteger. […] Queremos estar tranquilos”, justifica Marli Swanepoel, de 37 anos, dono de uma fazenda isolada em Limpopo.
Outros se recusam a ceder perante o medo, como Hans Bergmann, assaltado uma manhã por homens armados que atiraram em seu pé e esvaziaram seu cofre.
“Vieram pelo dinheiro. […] Todo mundo acha que os agricultores são ricos”, diz este sexagenário. Mas “não vou começar a me trancar. A vida é assim”.