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22/08/2011 - 12:32
Os ocidentais começam a preparar a era pós-Kadhafi sem esperar a queda do ditador e asseguram ter metas: evitar a cisão do país e assegurar uma transição democrática.
O secretário-geral da Otan, Anders Fogh Rasmussen, pediu nesta segunda-feira aos dirigentes da rebelião líbia (CNT) "a garantia que a transição seja feita com calma e com a participação de todos, que o país permaneça unido e que o futuro seja baseado na reconciliação e no respeito aos Direitos Humanos".
O presidente americano, Barack Obama, expressou sua preocupação ao pedir que o CNT "demonstre a liderança necessária para conduzir o país por uma transição que respeite os direitos do povo líbio". A chefe da diplomacia europeia, Catherine Ashton, pediu que os dirigentes rebeldes "atuem com responsabilidade para manter a paz e a estabilidade em todo o país".
Os rebeldes estão a ponto de tomar Trípoli e os ocidentais temem que a queda do regime autoritário de Muamar Kadhafi, que dirigiu o país com mãos de ferro durante quatro décadas, ceda lugar a um regime de vingança entre vencedores e vencidos, comprometendo as possibilidades de uma reconciliação nacional. "Muitos líbios nos dizem que haverá ajuste de contas porque estamos em uma situação de guerra civil e o conflito só serviu para exacerbar as tensões veladas que existiam há muito tempo", disse à AFP um diplomata europeu especialista em Líbia.
Este clima pode alimentar forças capazes de colocar em perigo a unidade do país, que conta com dezenas de tribos com interesses divergentes. "A história mostra que quando a conquista do poder é alcançada através das armas e não de maneira pacífica, a legitimidade militar entra em contradição com a legitimidade democrática", explica Álvaro de Vasconcelos, presidente do Instituto de Segurança da União Europeia.
"Para evitar isso, é necessário integrar os diferentes componentes da sociedade líbia ao futuro governo de transição, incluindo forças islâmicas muito conservadoras ligadas ao Irmãos Mulçumanos, mas que não são violentas" e que segundo o especialista também têm direito a serem representadas.
"O perigo é a CNT, em Benghazi, pensar que pode dominar o futuro governo de transição", e acrescenta ainda que o poder não pode ser monopolizado pelos representantes da região da Cirenaica (leste) sem incluir a oposição tripolitana (oeste). Segundo o diplomata europeu, "o mais preocupante são as questões de segurança, pois existe muita gente no país cujos interesses são contrários a uma estabilização, começando pelos salafistas que possuem conexões com a AQMI", ramo da Al- Qaeda no Magreb islâmico.
Enquanto a Otan se preocupou em bombardear a Líbia, a União Europeia, excluída dos conflitos, disse estar disposta a intervir agora para ajudar o país a construir instituições democráticas. Segundo diplomatas, é provável que haja missões europeias para criar novas forças de segurança, como no Iraque e no Afeganistão, bem como uma força de observação no terreno para evitar o descontrole. "A Líbia necessita de uma transição ordenada e um Estado verdadeiramente democrático, a tarefa é imensa. A ONU e outros organismos devem ajudar", disse o chefe da diplomacia sueca, Carl Bildt.
EUA
O subsecretário de Estado americano para temas do Oriente Médio, Jeffrey Feltman, afirmou nesta segunda-feira que os rebeldes líbios venciam claramente e deixavam o regime de Muamar Kadhafi perto da queda. "O que está claro é que o vento está nas velas dos rebeldes, que os rebeldes estão ganhando, que é apenas uma questão de tempo para que Kadhafi tenha que renunciar, que Kadhafi perca todo o país", disse o subsecretário.
Feltman fez a declaração em um momento de intensos combates em Trípoli, incluindo a residência de Kadhafi, depois que os rebeldes assumiram o controle de grande parte da capital. O pardeiro do ditador líbio não é conhecido e para Feltman isto "quase não importa". "Kadhafi se tornou, para todos os efeitos, parte da história da Líbia e agora o povo tem que buscar construir um futuro melhor na Líbia", disse Feltman.
Itália
O chefe de Governo italiano, Silvio Berlusconi, convocou nesta segunda-feira seu ex-aliado Muamar Kadhafi a se render, com o objetivo de evitar "sofrimentos inúteis" no povo líbio, indicou o governo em um comunicado. A Itália, maior sócio econômico da Líbia durante o regime de Kadhafi, rompeu com o líder líbio e manifestou seu apoio ao Conselho Nacional de Transição, após a entrada dos rebeldes em Trípoli.
"O Conselho Nacional de Transição (CNT) e os rebeldes líbios que combatem em Trípoli estão coroando suas aspirações de conquistar uma Líbia democrática e unida. O governo italiano está com eles", ressalta o comunicado. "Exortamos o CNT a se abster de qualquer vingança e a enfrentar a transição em direção a uma democracia com coragem e espírito aberto em direção a todos os setores da população", solicita Berlusconi na nota.
Poucas horas antes, o ministro italiano das Relações Exteriores, Franco Frattini, calculava que o regime de Kadhafi controla neste momento apenas "entre 10 e 15%" da capital Trípoli. Segundo ele, "evidentemente a prisão dos filhos de Kadhafi foi um elemento decisivo". O ministro italiano considerou obsoleta a opção de que Kadhafi seja exilado, e disse que o coronel deve ser entregue ao Tribunal Penal Internacional (TPI).
França
O presidente francês, Nicolas Sarkozy, condenou nesta segunda os pedidos "irresponsáveis" do ditador líbio Muamar Kadhafi de continuidade da luta, em um comunicado divulgado pelo governo. O presidente anunciou ainda que o primeiro-ministro do Conselho Nacional de Transição (CNT) visitará Paris na quarta-feira. Sarkozy e Jibril conversaram por telefone nesta segunda-feira, segundo o comunicado. "No momento em que se intensificam os acontecimentos da situação militar no campo de batalha e as deserções em seu bando confirmam que se aproxima o fim inevitável de Kadhafi e de seu regime, o presidente da república condena com a maior firmeza os pedidos irresponsáveis e desesperados do coronel Kadhafi a continuar os combates a todo custo", acrescenta o comunicado.
O primeiro-ministro britânico David Cameron afirmou nesta segunda-feira que o regime líbio de Muamar Kadhafi está em "plena retirada" e deve abandonar qualquer esperança de permanecer no poder. A China anunciou que respeita a decisão do povo líbio e espera que a estabilidade retorne rapidamente à Líbia. A África do Sul negou ter enviado aviões à Líbia para facilitar uma saída de Kadhafi.
O presidente venezuelano Hugo Chávez, estreito aliado de Kadhafi, criticou no domingo os governos da Europa e Estados Unidos que segundo ele "estão demolindo Trípoli com suas bombas".
Liga Árabe
O secretário-geral da Liga Árabe, Nabil al-Arabi, se declarou "totalmente solidário" com o governo rebelde na Líbia. Ele afirma em um comunicado sua "total solidariedade com os esforços do Conselho Nacional de Transição (CNT)", órgão político da rebelião, e deseja "êxito na nova era e que preserve a integridade regional da Líbia, assim como sua soberania e independência".
Egito
O Egito reconheceu o órgão político dos rebeldes líbios, o CNT (Conselho Nacional de Transição), como governo legítimo da Líbia, indicou nesta segunda-feira o ministro egípcio das Relações Exteriores, Mohammed Amr. "O Egito reconhece o novo regime na Líbia e o CNT que o representa", assegurou em uma coletiva de imprensa no Cairo.
Opep
A recuperação na produção de petróleo da Líbia depois que Muamar Kadafi deixar o poder provavelmente será lenta e gradual e terá efeitos sobre os preços do petróleo apenas no curto prazo, afirmou uma fonte da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep). "É uma grande notícia que o regime de Kadafi esteja chegando ao fim, mas a produção da Líbia vai demorar para se recuperar e a recuperação será gradual", disse a fonte. "O mercado vai absorver o petróleo líbio assim como fez antes com o Iraque e a Rússia e qualquer pressão sobre os preços terá vida curta", acrescentou.
Segundo a fonte, a Opep é flexível e vai se ajustar às mudanças na Líbia. No entanto, no momento ainda não há necessidade de uma reunião de emergência para discutir a situação. Enquanto isso, companhias de petróleo com investimentos na Líbia se preparam para uma possível volta ao país.
A BP declarou que está comprometida a voltar para a Líbia e continuar seu programa de exploração de petróleo e gás "assim que as condições permitirem". A companhia havia iniciado um programa de exploração de US$ 900 milhões no país quando interrompeu as operações, em fevereiro, depois da revolta contra o regime de Kadafi e a guerra civil subsequente.
A Royal Dutch Shell, por sua vez, afirmou que ainda é muito cedo para prever quando voltará para a Líbia, mas disse que está observando os eventos no país de perto. "Nós estamos observando a situação cuidadosamente e a monitorando para ver quando poderemos fazer contato (com os rebeldes) e quando poderemos voltar a operar", disse a Shell. A companhia tem um programa de exploração no país, mas não produz.
A maior companhia de eletricidade da Itália, a Enel, vai procurar oportunidades de investimento na Líbia em seguida ao colapso do regime de Kadafi, afirmou o executivo-chefe da empresa, Fúlvio Conti. "Nós decidimos não ter qualquer relação com o regime de Kadafi. Mas agora o país pode mudar", disse.