‘Orçamento’ de carbono pode ser maior do que se pensava (estudo)

O objetivo ambicioso de limitar o aquecimento global abaixo de 1,5 graus Celsius, previsto no Acordo de Paris, ainda está ao alcance, disseram nesta segunda-feira pesquisadores que calcularam que a humanidade pode ter um “orçamento” permitido para queimar carbono maior do que se pensava anteriormente.

Embora esta seja uma das raras boas notícias no campo das ciências climáticas, não é motivo para complacência, disseram os autores do estudo, publicado na revista científica Nature Geoscience.

Em vez disso, deveria revitalizar os esforços para atingir uma meta que muitos já abandonaram por ser onerosa demais.

“Todos os grandes emissores, sem exceção, terão que intensificar seus esforços”, disse à AFP o coautor do estudo Joeri Rogelj, do Instituto Internacional de Análise de Sistemas Aplicados, na Áustria.

No Acordo de Paris, adotado em 2015 após anos de discussão, cerca de 195 países se comprometeram a limitar o aquecimento global médio “bem abaixo” de 2ºC em relação aos níveis pré-industriais.

Eles também se comprometeram a “buscar esforços” para atingir a meta mais difícil de 1,5º C, a fim de aumentar as possibilidades de evitar os piores efeitos do aquecimento global.

Em um relatório de 2014, o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas das Nações Unidas (IPCC) disse que a concentração de carbono na atmosfera não deveria exceder 450 partes por milhão (ppm) de CO2 equivalente (CO2eq) até 2100 para que haja uma chance “provável” (66%) de limitar o aquecimento a 2°C.

De acordo com o relatório do IPCC, em 2011 a concentração já era de 430 ppm de CO2eq.

Com base nos números do IPCC, um orçamento de 400 bilhões de toneladas foi calculado como a quantidade máxima de CO2 que a humanidade poderia emitir na atmosfera a partir de 2011 para manter em vista o objetivo de 1,5ºC.

Em 2015, esse número caiu para cerca de 245 bilhões de toneladas.

A nova análise, no entanto, estima que o orçamento restante a partir de 2015 esteja mais próximo de 880 bilhões de toneladas de CO2 – quase quatro vezes maior do que a estimativa da ONU, disse a equipe de pesquisa.

Ações ambiciosas

“Esta é uma boa notícia, mas a pressão não acabou”, disse Rogelj.

As conclusões do estudo “reviveram o objetivo de manter o aquecimento máximo em 1,5º C, o que passou de ser implausível do ponto de vista geofísico e socioeconômica, a ser possível, embora ainda muito desafiador”, acrescentou.

A equipe disse que usou os mesmos modelos de simulação do “Sistema Terra” empregados pelo IPCC para suas projeções, mas também outras ferramentas de modelagem que lhes permitiram explorar uma maior variedade de cenários possíveis.

“Nosso estudo é baseado em uma maior variedade de provas do que havia disponível no momento do relatório do IPCC”, disse Rogelj.

Os resultados mostraram que alcançar a “neutralidade de carbono” até meados do século ofereceria “uma possibilidade real de limitar o aquecimento global a um máximo de 1,5° C”, acrescentou.

A neutralidade de carbono significa remover da atmosfera a mesma quantidade de carbono que é emitida nela, a fim de alcançar uma pegada de carbono zero, ou mesmo negativa.

“A literatura mostra que alcançar a neutralidade de carbono é tecnologicamente e economicamente possível, se começarmos a fazer ações ambiciosas hoje”, disse Rogelj.

Mas está claro que as promessas nacionais de redução de carbono submetidas ao Acordo de Paris “não representam o tipo de ações ambiciosas que estão implicadas aqui”, acrescentou o pesquisador.

Para permanecer dentro do orçamento, seria necessário eliminar gradualmente a energia do carvão nas próximas duas décadas e investir em árvores e tecnologias que sugam CO2 da atmosfera.

O setor elétrico global, segundo os autores do estudo, precisaria se tornar neutro em carbono, ou até mesmo negativo, até meados do século.

O planeta já aqueceu cerca de 1,0ºC, de acordo com cientistas.