Quais são as chances de Trump suspender o visto de Moraes, como bolsonaristas pedem

Quais são as chances de Trump suspender o visto de Moraes, como bolsonaristas pedem

Deputados do grupo político de Jair Bolsonaro (PL) pretendem aproveitar a viagem aos Estados Unidos, onde irão participar da posse presidencial de Donald Trump na segunda-feira, 20, para pedir ao republicano a suspensão do visto de Alexandre de Moraes, ministro do STF (Supremo Tribunal Federal).

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Integrantes da comitiva ouvidos pelo site IstoÉ sob condição de anonimato confirmaram a ideia e afirmaram crer na adesão de Trump. A demanda se deu após Moraes negar um recurso da defesa do ex-presidente e recusar a devolução de seu passaporte para participação na cerimônia em que o aliado será empossado.

Sem passaporte

Bolsonaro teve o passaporte revogado por determinação do magistrado em fevereiro de 2024, como medida cautelar pela participação em uma tentativa de golpe de Estadopela qual foi indiciado — que o manteria no poder após a derrota para o presidente Lula (PT) nas urnas.

Antes de transmitir o cargo, o político viajou à Flórida e só retornou em março de 2023, o que balizou a argumentação do magistrado de haver risco de uma tentativa de fuga com nova ida a solo americano, dado que as investigações da Polícia Federal sobre a trama golpista não terminaram.

Soma-se a isso o fato de que Procuradoria-Geral da República considerou que o pedido atendia apenas ao interesse privado do ex-presidente e, portanto, não poderia se sobrepor à cautelar.

A defesa de Bolsonaro argumentou que ele não apresentou empecilhos para entregar seu passaporte e cumpriu as medidas impostas pelo tribunal até aqui. “Nada indica que a pontual devolução do passaporte, por período delimitado e justificado, possa colocar em risco essa realidade”, escreveram os advogados.

Não adiantou. Com o impedimento, o ex-presidente deve ser representado pela esposa, Michelle, na cerimônia.

Demanda sob questão

O site IstoÉ procurou dois professores de direito internacional para entender se Trump poderia suspender o visto do ministro brasileiro e quais são os respaldos legais que justificam essa atitude.

— Emanuel Pessoa é advogado especializado na internacionalização da empresas e professor da China Foreign Affairs University.

— Victoriana Gonzaga é advogada especializada em direito internacional e professora da FIA-SP (Fundação Instituto de Administração)

A decisão de suspender um visto está nas mãos de Trump?

EP No geral, há uma regra discricionária, dado que um estrangeiro não tem “direito” a entrar em outro país, e faz isso em conformidade com o que é determinado pelas autoridades locais. Sendo assim, cada país se reserva o direito de estabelecer suas próprias regras, tendo o interesse nacional e as políticas internas como critérios suficientes no que toca a vistos.

VG Em qualquer país, a concessão, suspensão ou revogação de vistos é responsabilidade dos órgãos do Executivo, a quem cabe gerir a política migratória. Nos EUA, quem cuida disso é o Departamento de Estado, submetido à Casa Branca. Com razão em bases justificadas de política externa ou política de segurança, esse órgão tem a prerrogativa de cancelar ou suspender um visto a qualquer momento, o que pode ser provocado por uma orientação do chefe de Estado [Trump, a partir de 20 de janeiro].

A suspensão do documento pode ser usada como ferramenta de pressão em um entrevero diplomático ou resposta a atos de autoridades estrangeiras que são contrárias aos interesses do país. O governo americano já fez isso com autoridades estrangeiras envolvidas em violações de direitos humanos e corrupção, mas essas decisões foram embasadas por sanções determinadas por entidades internacionais, o que não é o caso.

Há uma baliza para essa medida? E no que ela poderia implicar para as relações entre Brasil e Estados Unidos?

EP A conduta de Moraes já foi alvo de reprovação de diversos congressistas americanos, especialmente no que toca às punições ao X [antigo Twitter], dado que muitos políticos dos EUA interpretam suas sentenças como restritivas à liberdade de expressão.

Dado que a decisão sobre o visto do ministro não depende do processo judicial e é discricionária do Poder Executivo, há possibilidade de definição por um argumento exclusivamente político, sem a necessidade de uma baliza do processo legal.

Em caso de suspensão, o recado será de que a Casa Branca entende que o ministro feriu regras legais, em particular as de liberdade de expressão, servindo como um reproche direto e claro dos EUA à conduta de Moraes e a chancela dada a ela pela Suprema Corte brasileira.

VG Não há proporcionalidade que justifique a suspensão do visto de Moraes, dado que ele não foi implicado em nenhum escândalo ou violação reconhecida dos direitos humanos. Além da falta de razão plausível, trata-se de uma autoridade de um país com quem os EUA nutrem boas relações, e portador do passaporte diplomático, que é protegido por tratados internacionais. A decisão, portanto, seria considera um ato hostil por parte de Trump.

No geral, governos priorizam o multilateralismo e a preservação de diálogo com outras nações, ainda que em condição de discordância, o que faz com que a suspensão seja improvável. A Casa Branca não demonstra afeição por abrir esse tipo de precedente.