11/12/2024 - 11:13
O novo primeiro-ministro de transição da Síria garantiu, nesta quarta-feira (11), que a coalizão liderada por islamistas, que derrubou Bashar al-Assad, “garantirá” os direitos de todos os grupo religiosos, e pediu aos milhões de sírios que fugiram para o exterior que retornem ao país.
O recém-nomeado Mohammed al-Bashir admitiu “o comportamento equivocado de alguns grupos islamistas” que levou a que “o significado do Islã […] fosse distorcido”, em uma entrevista ao jornal italiano Corriere della Sera.
“Especificamente porque somos islâmicos, garantiremos os direitos de toda a população e de todos as religiões na Síria”, afirmou o dirigente, que lidera um governo de transição até 1º de março.
A aliança rebelde que acabou com meio século de poder do clã Assad na Síria, no domingo, é comandada pelo grupo radical islamista Hayat Tahrir al Sham (HTS), um antigo ramo sírio da Al Qaeda. O movimento afirma ter rompido com o jihadismo, mas continua na lista de “terroristas” de vários países ocidentais, incluindo os Estados Unidos.
Na entrevista, publicada nesta quarta-feira, Bashir instou os sírios no exterior – cerca de seis milhões, ou seja, um quarto da população, que fugiram desde 2011 – a retornar para “reconstruir” e fazer “florescer” o país, onde sunitas, alauitas, cristãos e curdos convivem com dificuldades.
A Síria, devastada por 13 anos de uma guerra civil que deixou mais de 500 mil mortos, “é agora um país livre que conquistou seu orgulho e dignidade”, afirmou.
“Voltem”, insistiu, após diversos países, como Alemanha, Áustria ou Reino Unido, decidirem suspender os pedidos de solicitação de asilo para cidadãos sírios.
O país “não terminará em outra” guerra, garantiu na véspera Abu Mohammed al Jolani, chefe do HTS, que liderou a ofensiva rebelde lançada em 27 de novembro.
Nesta quarta-feira, Jolani, que agora usa o seu nome verdadeiro, Ahmed al Sharaa, declarou que funcionários do regime de Assad envolvidos em tortura de prisioneiros não serão anistiados.
“Não perdoaremos aqueles que estão envolvidos na tortura e na eliminação de prisioneiros”, afirmou o líder do grupo islamista HTS, que pediu aos países vizinhos que “entreguem qualquer criminoso que possa ter fugido, para que possam ser levados à justiça”.
Na capital Damasco, onde está hasteada uma bandeira da revolução com as cores verde, branco e preto, o dia a dia vai se delineando.
A médica Rania Diab, de 64 anos, diz esperar que se possa “viver com normalidade em nosso país, que as nossas liberdades sejam preservadas”.
Mas para muitos sírios, a prioridade agora é procurar amigos e familiares desaparecidos durante décadas de repressão do governo.
Nabil Hariri, natural de Daraa (sul), observa fotos de corpos no necrotério de um hospital da capital. Ele procura o irmão, preso em 2014 quando tinha apenas 13 anos.
“Quando você está para baixo, agarra-se a qualquer coisa”, diz o homem de 39 anos.
Desde 2011, mais de 100.000 pessoas morreram nas prisões sírias, segundo um cálculo de 2022 do Observatório Sírio dos Direitos Humanos (OSDH).
Vários países e a ONU afirmaram ter visto mensagens enviadas pelo novo governo, mas avisaram que esperam que estas se traduzam em ações.
Os Estados Unidos afirmaram que “reconhecem e apoiam plenamente um futuro governo sírio que resulte de um processo [político] inclusivo”. A UE reconheceu, por sua vez, os “enormes desafios” do país e disse esperar que a Síria não repita o que aconteceu no Iraque, na Líbia ou no Afeganistão.
A Rússia, até agora um aliado do poder deposto, quer ver a situação na Síria estabilizada “o mais rápido possível” e disse estar em “contato” com as novas autoridades, sobretudo em relação às bases militares russas no país.
O túmulo de Hafez al Assad, pai do presidente sírio deposto Bashar al Assad, foi incendiado em sua cidade natal, Qardaha, de acordo com imagens de vídeo obtidas nesta quarta-feira (11) pela AFP, que mostram combatentes rebeldes e jovens observando o incêndio.
O OSDH afirmou à AFP que os rebeldes incendiaram o mausoléu, localizado no coração da comunidade alauita de Assad em Latakia, no noroeste do país. Imagens da AFP mostram partes do mausoléu em chamas.
No terreno, especialistas alertam para as rivalidades e o conflito aberto entre as diferentes facções.
No nordeste da Síria, onde os combates entre as forças pró-curdas e pró-turcas mataram mais de 200 pessoas em três dias, segundo o OSDH, o chefe das tropas curdas anunciou uma trégua em Manbij, “com a mediação dos Estados Unidos”.
“O nosso objetivo é conseguir um cessar-fogo em toda a Síria para iniciar um processo político para o futuro do país”, declarou Mazlum Abdi, comandante das Forças Democráticas Sírias (FDS), dominadas por curdos e apoiadas por Washington.
Israel, por sua vez, está determinado a não permitir que “qualquer força hostil se estabeleça em sua fronteira” com a Síria, segundo o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu.
Nas últimas 48 horas, o Exército israelense efetuou centenas de bombardeios contra posições militares no país vizinho e enviou tropas para perto da zona desmilitarizada nos limites das Colinas de Golã sírias ocupados por Israel.
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