O Brasil vive um surto terrorista? Um plano para matar o chefe de Estado, seu vice e o chefe do STF, com o objetivo de invalidar a eleição e instalar um regime com cara de ditadura. Um homem tentando explodir o Supremo em Brasília. Uma invasão, violenta e em massa, às sedes dos Poderes na capital.

São fatos que levam à pergunta sobre se o Brasil não teria entrado numa nova era, numa nova escala de extremismo político.

“Eu diria que é mais que um surto de extremismo ou de tentações terroristas”, afirma o historiador Odilon Caldeira, um dos coordenadores do Observatório da Extrema Direita.

E ele não tem dúvida: o Brasil virou terreno fértil para o radicalismo político e violento.

“Eu diria que os indícios de terrorismo, a utilização do terrorismo como uma estratégia do extremismo de direita, ele está envolvido num cenário mais amplo. , que é o cenário de naturalização do discurso da presença dos valores do extremismo de direita na sociedade brasileira. Não é um problema somente do campo político, é um problema que diz respeito a toda a sociedade, a formas exclusivistas e exclusórias de perceber a sociedade, a comunidade nacional e assim por diante. Então os eventos recentes são, na verdade, pontas de um iceberg mais profundo, que é justamente a naturalização e a presença do extremismo de direita na sociedade brasileira”, analisa Caldeira.

O especialista diz ainda que a população e as instituições precisam estar atentas, porque o grau de radicalização da extrema direita brasileira chegou a outro patamar: o inimigo deixou de ser apenas Lula, a esquerda, os progressistas. Agora, o adversário, o alvo, mais do que antes, é a democracia – seus pilares e representantes máximos.

“Do 8 de Janeiro para cá, o bolsonarismo, sobretudo esse bolsonarismo mais extremado, não vê mais no sistema político, na vida política, na via política eleitoral, uma forma legítima de atuação. Não somente para eles, mas para a totalidade da sociedade brasileira. Então eles veem em grande medida que o inimigo agora são as próprias instituições democráticas, as suas lideranças, as suas representações”, afirma o historiador.

“Ou seja, a sua própria estrutura e sua própria existência. Então esse tipo de ação, que pode parecer eventualmente mais episódica, ou seja, casos radicalizados individuais, na verdade são casos que são radicalizados e individuais dentro de comunidades, e dentro de um sistema político mais amplo, que foi essa presença da extrema direita na sociedade brasileira. Então eu diria que o quadro atual justamente é aquele que impõe muitos cuidados, porque à medida que os indícios, as averiguações, os problemas jurídicos com Bolsonaro e outras lideranças da extrema direita brasileira tendem a avançar, então a radicalização e a contraposição contra as instituições democráticas no Brasil também tendem, eventualmente e hipoteticamente, a avançar.”

Caldeira completa: “Enquanto a sociedade brasileira, e aqui eu falo em termos inclusive sobretudo das instituições políticas e da democracia, não discutir esse problema recente do extremismo de direita, o alerta, o perigo continua ativo. Efetivamente não é possível colocar mais uma camada de esquecimento aos problemas dos ataques à democracia. Se a sociedade brasileira investir nesse equívoco do esquecimento, efetivamente isso servirá, num futuro não tão distante, mas num futuro muito próximo, à intensificação desses fenômenos.