Ele sofreu impeachment em duas ocasiões, foi considerado culpado de fraude e abuso sexual, condenado a uma série de crimes e declarado politicamente morto mais de uma vez: Donald Trump está por sua própria conta e risco.

A pouco mais de uma semana de sua terceira eleição presidencial, e pouco mais de três meses após ter sido baleado, o magnata republicano dá um salto em sua corrida.

O homem de 78 anos emergiu de um verão de erros e de uma guinada para a retórica autoritária, com melhores chances de garantir um segundo mandato na Casa Branca do que em qualquer momento desde a tentativa de assassinato em julho em um campo de golfe na Pensilvânia.

Ele parece ter uma pequena liderança nas pesquisas nos estados-pêndulo contra Harris, que viveu uma onda de entusiasmo quando substituiu Joe Biden em julho, mas desde então perdeu impulso.

Os críticos de Trump observaram uma série de erros em sua campanha de 2024 com uma mistura de alegria, frustração e perplexidade à medida que o homem cuja queda foi prevista conseguiu de alguma forma permanecer na liderança.

Para alguns, as maiores dificuldades de Trump foram uma escolha polêmica para a vice-presidência, uma atitude lassez-faire em relação ao seu trabalho diário de campanha e um foco excessivo em Biden.

As próprias palavras do republicano têm sido, como sempre, extraordinárias — desde teorias de conspiração sobre imigrantes que comem animais de estimação e mentiras sobre furacões até ameaças autoritárias de vingança contra seus oponentes.

Ingrediente secreto

Também há os pontos inusitados — o abuso misógino contra Kamala, as entrevistas desconexas, a admiração por ditadores estrangeiros e um evento de campanha excêntrico que terminou com Trump dançando em um palco durante 40 minutos.

Sendo o mais velho candidato presidencial de um grande partido a concorrer ao pleito, está em liberdade sob fiança em dois processos criminais que podem significar que ele cumprirá seus dias de prisão e, em teoria, deverá ser condenado em um terceiro logo após a eleição.

Mas a disputa continua complexa, com uma ligeira movimentação a favor de Trump, sugerindo que ele está resistindo às advertências de Kamala de que não está apto para o cargo.

Para alguns analistas, o ingrediente secreto de Trump é a sua capacidade de desempenhar o papel de um ‘outsider’ heroico — alvo de elites corruptas em sua campanha insurgente para agitar a política em nome de milhões de pessoas esquecidas.

O consultor político Andrew Koneschusky vê quatro pilares na campanha de Trump: um apelo aos jovens sem rumo, a exploração da raiva face à inflação, a militarização da raça e do gênero e o uso dos migrantes como bodes expiatórios.

“A estratégia de campanha de Trump se apoia fortemente em explorar emoções negativas, que geralmente são registradas mais fortemente do que as positivas”, avalia o ex-secretário de imprensa do líder democrata no Senado, Chuck Schumer.

‘Anjo vingador’

Para Donald Nieman, analista político e professor da Binghamton University, no estado de Nova York, a condução pouco ortodoxa do republicano — os “discursos, teorias da conspiração, vulgaridades, ataques racistas e sexistas sem rodeios” — empolgam uma base que vê Trump como o seu “anjo vingador”.

“Muitos outros tampam os narizes e o apoiam porque acreditam que ele será melhor em questões que lhes interessam: a economia, a imigração, o aborto”, disse Nieman.

Embora opositores achem que o discurso anti-político e de homem do povo de Trump não agrada, é uma rotina que tem rendido bons frutos.

O magnata possui um instinto de vendedor para a auto-publicidade, aperfeiçoado em seus dias de impetuoso empreendedor na Nova York dos anos 1980.

Os melhores momentos de sua campanha têm sido eventos virais que jogam com o seu apelo de homem comum, como sua foto fingindo trabalhar em um McDonald’s, suas aparições frequentes em grandes eventos esportivos e o seu comício no Madison Square Garden.

E enquanto os liberais e grande parte da mídia olham para o estilo pouco ortodoxo e livre do republicano como desqualificantes, seus fãs veem autenticidade.

A analista política e especialista em Relações Públicas Adrienne Uthe acredita que Trump e sua base compartilham uma conexão emocional ausente na maioria das campanhas políticas, uma vez que ele explora o patriotismo, a desconfiança na imprensa e o medo de perder sua cultura.

“Seus apoiadores o veem como um vencedor contra o que consideram um sistema corrupto. Apesar das controvérsias, Trump se apresenta como um lutador, inflexível diante da oposição”, disse à AFP.

“Muitos de seus seguidores admiram esta resiliência, vendo-o como alguém que defende os seus valores e perturba um sistema político que eles acreditam tê-los ignorado por décadas”, completou.