Distante de partidos pelos quais já passou, como MDB e versões extintas do União Brasil, e algoz do bolsonarismo no Rio de Janeiro, o prefeito Eduardo Paes (PSD) encontrou na relação com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva um caminho até o apoio do PT para buscar a reeleição.

Mas, se a adesão da esquerda está diretamente associada ao petismo em outras capitais, a lógica não se reproduz na cidade onde o PSOL chegou ao segundo turno nas eleições de 2012 e 2016 (com Marcelo Freixo, hoje presidente da Embratur) e tem sete vereadores. Para outubro, a legenda decidiu rivalizar com a coligação de Paes e lançou o deputado Tarcísio Motta à prefeitura.

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Esquerda dividida

“O PSOL tem sido, à exceção da eleição de 2020, o principal partido de esquerda em eleições majoritárias e proporcionais no Rio de Janeiro desde 2012. Com isso, a maior parte da militância desse campo e dos movimentos sociais estão conosco”, disse Tarcísio ao site IstoÉ.

O saldo eleitoral e a ideia de representar esses grupos na campanha mobilizaram o PSOL a não aderir ao movimento de “frente ampla” que fez o PT abrir mão de encabeçar chapas em 13 capitais no Rio, mas a candidatura ganhou adesões além da própria sigla.

O deputado Lindbergh Farias (PT) gravou um vídeo de apoio para a convenção que oficializou Tarcísio como candidato, e a ala petista “Articulação de Esquerda” também está ao lado do parlamentar, que ainda afirmou ter “diálogo aberto” com as deputadas estaduais Marina do MST (PT) e Dani Balbi (PCdoB), ambas de legendas que estão com Paes.

Paes ou Tarcísio? Entenda a divisão da esquerda nas eleições do Rio de Janeiro
André Ceciliano (PT), ex-secretário nacional de Assuntos Federativos, foi um dos cotados a ocupar a vice de Paes (Crédito:Alerj)

André Ceciliano, ex-presidente da Alerj (Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro) e uma das lideranças petistas a endossar a aliança com o prefeito, disse ao site IstoÉ que o PSOL se consolidou como um dos principais adversários do PT na cidade, onde “brigam pelo mesmo eleitorado”.

“Houve um crescimento [do PSOL] justamente num vácuo gerado por episódios de enfraquecimento do PT, inclusive com a perda de quadros para o próprio partido, como o [deputado federal] Chico Alencar”, avaliou.

“Para uma parcela do eleitorado fluminense, o PSOL representa uma espécie de ‘PT dos velhos tempos”, disse Marcus Ianoni, professor do departamento de ciência política da UFF (Universidade Federal Fluminense), ao site IstoÉ. Segundo ele, lideranças da sigla têm novas oportunidades de se eleger devido à estratégia petista de fazer alianças para “combater a extrema direita”, que seria representada na cidade pela candidatura do deputado Alexandre Ramagem (PL), diretor da Abin (Agência Brasileira de Inteligência) no governo de Jair Bolsonaro (PL).

Em consonância com esse discurso, Tarcísio também aposta na polarização com o bolsonarismo para construir a alternativa: “O que está em jogo é se serei eu ou a extrema direita no segundo turno contra Eduardo Paes. Nosso adversário é o Ramagem, mas precisamos chamar o voto progressista, porque é nesse campo que estamos”.

Problemas com Paes

Na linha da avaliação de Ianoni, o apoio do PT a Paes foi decidido pela direção nacional do partido, que busca ampliar o arco de alianças de Lula para evitar que o grupo político de Bolsonaro retorne ao poder em 2026.

“Essa estratégia pode frear o crescimento do próprio partido em cidades e estados onde ele tenta ganhar ou recuperar espaço”, disse o professor. Políticos e militantes de esquerda também questionam a falta de espaço do campo na chapa do prefeito — Eduardo Cavaliere (PSD) será seu candidato a vice.

Ceciliano, que foi cotado para essa função (a pedido de Lula, se desincompatibilizou da Secretaria Nacional de Assuntos Federativos para poder disputar a eleição), considera que a decisão do vice levou correligionários a desembarcar da campanha: “Essa questão do Eduardo [Paes] querer ter uma chapa puro-sangue, manter uma espécie de hegemonia, preocupa muita gente no campo progressista”.

“Se o PT estiver indo com o Eduardo Paes pensando em 2026, pode tirar o cavalo da chuva, porque é uma eleição com outra dinâmica. O objetivo é construir uma aliança, mas conhecendo o prefeito, temos que esperar para saber”, concluiu.

Ele ressaltou, no entanto, que “90% do partido” aderiu à decisão nacional. Em alguns casos, como do deputado Dimas Gadelha (PT), a adesão envolve a contrapartida do apoio do PSD (que tem em Paes sua principal liderança estadual) no pleito de outubro — o parlamentar é candidato à prefeitura de Duque de Caxias.

Para Tarcísio Motta, ainda não é possível ter a dimensão concreta do apoio dos militantes e movimentos de esquerda — mesmo os associados ao petismo — a seu nome, porque a campanha municipal “está fria”. “O prefeito não quer que a campanha aqueça e não quer discutir o futuro da cidade, mas ela inevitavelmente vai começar e ele vai ter de parar com essa arrogância”, disse.