22/02/2024 - 18:59
Há 23 anos, o Supremo Tribunal Federal (STF) não tem uma composição como a que se formou nesta quinta-feira, 22, com a posse do novo ministro Flávio Dino, com dez homens e uma mulher. A cadeira, que agora pertence ao ex-ministro da Justiça, foi ocupada por duas magistradas desde os anos 2000 e carrega um simbolismo por ser a primeira a ter uma mulher na história da Suprema Corte.
Responsável pela indicação de quatro dos 11 atuais ministros do Supremo, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) foi cobrado a aumentar a diversidade na Corte, com as duas indicações que lhe couberam neste terceiro mandato, mas não atendeu os pedidos de setores da sociedade.
O auge da representatividade feminina no STF começou em 2006, com a posse da ministra Cármen Lúcia e durou 17 anos, até o ano passado, com saída de Rosa Weber. A dupla de ministras foi formada com Ellen Gracie, a pioneira a ocupar uma cadeira no Supremo no ano 2000, indicada por Fernando Henrique Cardoso, e a primeira mulher presidente da Corte, entre 2006 e 2008.
Vago em 2011 com a aposentadoria compulsória de Gracie, o assento da primeira mulher do STF foi passado para Rosa Weber, que encerrou seu mandato em setembro de 2023, após 12 anos como ministra. Juntas, as três representam 1,7% dos ministros que o Supremo já teve em 132 anos de história.
Com a indicação de Dino, Lula foi o primeiro presidente da história a reduzir a participação feminina na Corte. Em seu primeiro mandato, entretanto, foi ele o responsável por dobrar a representatividade das mulheres, quando indicou Cármen Lúcia na vaga deixada pelo ministro aposentado Nelson Jobim.
Lula foi pressionado por setores da sociedade, inclusive pelo PT, a escolher uma mulher para pelo menos uma das duas vagas a que teve direito de indicação desde o ano passado, sobretudo após definir o nome de Cristiano Zanin, seu antigo advogado, para a primeira delas.
A primeira-dama Rosângela Silva, a Janja, e a ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco, chegaram a levar uma lista com nomes de juízas negras para o presidente indicar ao STF. Apesar da influência de Janja em decisões do Planalto, o pedido não teve resultado.
Um grupo de 25 deputadas federais da base aliada ao governo também se mobilizou e, atendendo a demandas da sociedade civil, enviou uma carta ao presidente expressando apoio a uma ministra negra para a vaga deixada por Rosa Weber. O STF nunca teve uma magistrada negra em sua composição.
Na campanha, Lula prometeu aumentar a representatividade de mulheres, negros e indígenas no governo. Inicialmente, o presidente escolheu mulheres para o alto escalão, batendo recorde de inclusão feminina no Executivo. No último ano, no entanto, o governo teve baixas nos ministérios do Esporte e do Turismo e na Caixa, que eram comandados por mulheres, ao ceder ao apetite do Centrão.
No Judiciário, a presença feminina é de apenas 16% nos tribunais superiores do País. A próxima oportunidade de a mais alta Corte do País voltar a ter mais representatividade, em questão de gênero, será em abril de 2028, quando o ministro Luiz Fux deve se aposentar compulsoriamente, ao completar 75 anos. Exatamente um ano depois, será a vez de Cármen Lúcia, a única mulher no STF hoje, deixar o seu assento.
Ao Estadão, a professora Celecina Sales, da Universidade Federal do Ceará (UFC), disse que, nos últimos 20 anos, a ocupação dos espaços de poder por mulheres se tornou a principal reivindicação feminina. “No início do século XX, a luta era para expandir direitos, para entrar no mercado de trabalho, por educação. Dos anos 2000 para cá, há uma grande luta das mulheres pelos espaços de poder.”
“Uma mulher ali pode não mudar todo o Supremo, mas faz uma grande diferença no sentido da representação. Existem mulheres com currículo e competência para assumir esse lugar”, afirmou.