O STF (Supremo Tribunal Federal) julga nesta quinta-feira, 8, um processo que avalia se existia vínculo empregatício com base na CLT (Consolidação das Leis do Trabalho) entre um entregador de aplicativo e a plataforma Rappi. Entretanto, apesar de avaliar um caso em específico, a audiência que terá dez dos 11 ministros presentes representa uma definição para o futuro de ações na Justiça entre trabalhadores e apps.

+ STF aceitou 63% dos pedidos para anular vínculo de emprego

+ STF nega vínculo empregatício entre motoristas e empresas de aplicativo

A decisão do STF irá analisar uma ação que contesta determinação do TST (Tribunal Superior do Trabalho) e pode significar um fim à disputa que é travada entre a suprema corte e a Justiça do Trabalho. Portanto, magistrados que seriam os responsáveis por ajuizar processos que permeiam questões entre funcionários e empregadores podem perder a autoridade para atuar em casos similares ao que será avaliado em julgamento.

Vínculo Empregatício

No TST, existem quatro turmas a favor e três contrárias ao vínculo empregatício entre entregadores e motoristas de aplicativo com as plataformas, o que iria regularizar tais funções e assegurar determinadas garantias aos trabalhadores. É o que pede a carta da Anea (Aliança Nacional dos Entregadores de Aplicativos), que exige formalização da relação de emprego e acesso à Previdência Social.

Outra questão proposta pela Anea é a de que deve haver uma jornada de trabalho delimitada, computando desde o momento de entrada no aplicativo pelo login até a saída, o logout, além de benefícios como férias remuneradas e um auxílio-alimentação. Também é feita a exigência de pagamento por horas trabalhadas tendo como referência o valor do salário-mínimo nacional.

A Amobitec (Associação Brasileira de Mobilidade e Tecnologia), que representa os aplicativos de entrega e transporte, afirmou em contato que as plataformas apenas intermediam os prestadores de serviço, ressaltando que a discussão sobre ganhos mínimos e contribuição previdenciária deve considerar o perfil de engajamento dos trabalhadores.

A associação também defende que os prestadores de serviço recebam por “horas efetivamente trabalhadas”, ou seja, considerando o tempo entre um pedido ser aceito, o deslocamento até o passageiro ou objeto de entrega e o de transporte ao destino. O contraponto seria a “hora logada”, em que o trabalhador seria remunerado a partir do momento em que acessa o aplicativo até sair.

Para a Amobitec, um trabalhador poderia se manter logado em diversas plataformas simultaneamente e não estar necessariamente ativo ou pode estar alternando viagens entre aplicativos como complemento de renda, além do trabalhador possuir a liberdade de recusar solicitações de entrega ou de transporte sem nenhum controle das empresas.

Empresas de mobilidade e a CLT

“O formato estabelecido pela CLT não se adequa à realidade criada pelo trabalho em plataformas”, declarou a Amobitec, complementando que não existe vínculo trabalhista entre os profissionais e as empresas que gerenciam tais aplicativos de mobilidade e defendendo que um modelo de regulação seja construído com intermediação das companhias tecnológicas

Segundo Luciana Conforti, presidente da Anamatra (Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho), as empresas perceberam que seria mais fácil recorrer de determinações da Justiça do Trabalho diretamente para o STF ao invés de continuar nos tribunais trabalhistas já que o Supremo teria uma interpretação mais favorável às corporações. “A decisão do STF também tem um efeito de impactar as demais definições do Poder Judiciário”

Para a presidente da Anamatra, o STF admite tais processos de maneira muito ampla. “O que defendemos é a competência da Justiça do Trabalho para dizer se há vínculo ou não, porque isso depende do caso. Há trabalhadores que fazem como ‘bico’ e outros que vivem daquilo”, esclarece Luciana Conforti citando que a CLT já reza por outras formas de prestação de serviço, como o contrato intermitente, e pedindo a ampliação do debate.

STF contra Justiça do Trabalho

A crise entre a suprema corte e a Justiça do Trabalho é relativa à existência de vínculo empregatício entre entregadores ou motoristas de aplicativo e as plataformas que gerenciam tais serviços. Em um processo semelhante, avaliado em dezembro de 2023, o ministro Alexandre de Moraes, relator do caso, afirmou que tais prestadores poderiam ser considerados como microempreendedores, já que podem aceitar ou recusar corridas, escolher o app para o qual trabalham, além de liberdade no horário.

Durante o julgamento da ação em dezembro, vários ministros declararam que a Justiça do Trabalho desrespeita as decisões do Supremo e no mesmo mês, Luiz Fux pediu ao CNJ (Conselho Nacional de Justiça) que investigasse determinações de tribunais trabalhistas por descumprimento de ordens do STF.

Luciana Conforti explica que o pedido ao CNJ foi visto com surpresa, o que demonstra que o STF entende diferentes interpretações da lei como uma espécie de afronta ao Supremo. “Nos parece uma determinação genérica. A intenção talvez tenha sido de que o conselho tome alguma medida, ainda que seja política, para barrar esse enfrentamento”, declara a presidente da Anamatra, complementando que ainda é preciso apurar as reais razões de tal ofício.

“Se entenderem que a Justiça do Trabalho não pode analisar caso a caso, a competência constitucional dela será seriamente abalada”, diz a presidente da Anamatra, concluindo que relações de trabalho de pessoas que não são empregadas, como autônomos e representantes comerciais, deveriam permanecer na jurisdição trabalhista, e que a depender da decisão do STF de não haver vínculo, todos os trabalhadores por aplicativo serão afetados.

**Estagiário sob supervisão