chamada.jpg
DIVERSIDADE
Maria Julia com Sara: predileção
pela boneca negra

Em sua obra “Modos de Homem & Modas de Mulher” (Ed. Global), o sociólogo Gilberto Freyre (1900-1987) reclamou das meninas do século XIX que, influenciadas pelas bonecas loiras vindas da Europa, estavam impregnadas de racismo e “sonhos de loirice”. Nada mais atual. Por isso, se estivesse vivo, o grande intelectual brasileiro comemoraria a notícia de que, 51 anos depois, a primeira Barbie com autênticos traços negros aterrissa no Brasil. A data de estreia não podia ser mais emblemática: a próxima quinta-feira 13, quando se comemora a Lei Áurea. A coleção So In Style, lançada nos Estados Unidos em outubro, deve provocar uma corrida dos colecionadores às lojas e suscitar discussões sobre a influência dos brinquedos na formação das crianças. Principalmente a respeito da necessidade de elas se identificarem com esses objetos e, dessa forma, se sentirem pertencentes, e não excluídas, da sociedade em que vivem.

img.jpg

O brinquedo é, conforme explicam psicólogos e pedagogos, a imitação do mundo real e serve para ajudar a criança na passagem da infância para a vida adulta. Mas, no Brasil, onde metade da população é negra ou parda, a maioria das meninas não se vê representada desde que as primeiras bonecas industrializadas chegaram ao País trazendo o modelo de beleza europeu. As meninas, em geral, que têm como sua maior representante a Barbie (um bilhão de unidades vendidas em 140 países) e seu slogan “Tudo o que você quer ser”, podem sofrer consequências nefastas no seu imaginário. “A maioria delas nunca alcançará aquele estereótipo”, diz a historiadora Mary Del Priore, autora dos livros “História das Crianças no Brasil” (Ed. Contexto). A pedagoga Maria Ângela Barbato Carneiro, coordenadora do Grupo de Cultura e Pesquisa do Brincar da Pontifícia Universidade Católica (PUC-SP), explica que a Barbie tem tamanha aceitação por causa da mudança no papel da mulher. “A menina passou a se identificar com aquela figura independente, que trabalha, faz academia e tem alto poder de consumo.”

Na escola Aprendendo a Aprender, de São Paulo, é rotina inserir bonecos fora do padrão. “Quando trabalhamos a diversidade, a criança se sente mais pronta para o mundo, aprende a enfrentar frustrações e a respeitar as diferenças”, afirma a orientadora pedagógica Adriani Magalhães, cliente da Preta Pretinha, única loja de São Paulo a confeccionar bonecas das mais variadas etnias, além de gordinhas e com alguma deficiência física. Maria Julia, 8 anos, é fã: tem duas negras de pano. O negócio das irmãs Antonia Joyce, Lúcia e Maria Cristina Venâncio fez tanto sucesso que elas criaram um instituto para promover a diversidade. “Não vendemos só produtos, mas um conceito”, afirmam.

img1.jpg
ENGAJADO
Até a personagem Luciana, da novela Viver a
Vida, ganhou sua versão de brinquedo

A Barbie com cabelo e traços afro é só exemplo mais luminoso dessa onda de brinquedos politicamente corretos. Na carona da novela global “Viver a Vida”, o artista plástico Marcus Baby confeccionou a personagem tetraplégica Luciana. “Fiz porque acho a personagem linda e não faria sentido retratá-la sem a cadeira de rodas.” A iniciativa alcançou êxito, comprovando a tendência do segmento “a vida como ela é”.