Conhecido não apenas por seu visual exuberante, mas principalmente por ter reinventado a francesa Chanel após a morte de Gabrielle “Coco” Chanel, o estilista, escritor e fotógrafo alemão Karl Lagerfeld era um poliglota apaixonado por design, arte e moda. Em 85 anos de vida, o “Kaiser da moda” possuiu casas e apartamentos na França, em Mônaco, Estados Unidos, Itália e Alemanha — imóveis recheados de tesouros escolhidos por ele mesmo: Karl colecionou lustres, candelabros, faqueiros, dezenas de livros, desenhos, fotografias, pinturas e diversos móveis.

“No fundo, sou um designer de interiores frustrado”, chegou a dizer uma vez. Ao mesmo tempo em que circulava em brechós e mercados de pulgas em busca de objetos, também comprava peças modernas, como uma poltrona metálica Zénith, de Mark Newson, avaliada em R$ 380 mil. O estilista gostava de acompanhar todas as tendências e estar “a frente de seu tempo”. Sua gata Choupette, por exemplo, foi um dos primeiros animais de estimação a fazer sucesso com contas no Instagram e Twitter. A gata, aliás, e seu cuidador, é uma das oito herdeiras de seu espólio que está sendo leiloado desde o dia 26 pela Sotherby’s, com pregões presenciais nas cidades de Monte Carlo e Paris, que acontecem até o final do ano e em Colônia, na Alemanha, na primavera do ano que vem.

Quem quiser apostar de maneira online, também pode, mas ficará sem ver de perto as peças que influenciaram a criatividade de um dos principais artistas criativos do mundo. Os itens que mais chamam a atenção, por seus valores, são três carros Rolls-Royce — com lances iniciais de 350 mil euros ou R$ 2,2 milhões — suas roupas de grife, bolsas de luxo e obras de arte. Ao transformar a sua figura em personagem e lançar uma marca com seu nome, virou boneca e escultura: seus óculos escuros, cabelos brancos, compridos e presos, mais as luvas sem a ponta dos dedos viraram marca registrada. Seus paletós e camisas, que estão nos lotes a serem leiloados, são exclusivos e de grifes como Dior, Saint Laurent e Chanel, claro. O armário de Lagerfeld no Quai Voltaire, em Paris, endereço de sua última residência, lembrava um showroom de moda masculina com suas infinitas prateleiras de jaquetas pretas. O local também servia como uma vitrine para seus móveis, como o conjunto de mesas em cilindro metálico de Martin Szekely, avaliado em 30 mil euros. De acordo com a casa de leilões, os itens “oferecem uma antologia de seu gosto pessoal, iluminando a vida do titã da moda como designer, decorador, fotógrafo e colecionador”.

Entre os lotes incomuns que já podem ganhar lances estão um par de halteres cromados Aston Martin, um conjunto de talheres do joalheiro Art Déco Jean Després, uma redoma contendo uma pilha alta de colarinhos brancos e um conjunto de baldes de champanhe disfarçado como baldes de tinta da Maison Martin Margiela. Até a famosa gata virou obra de arte nas mãos da portuguesa Joana Vasconcelos: a escultura “Choupette” tem lance inicial de 5 mil euros ou R$ 32 mil reais. Apesar das diversas peças que possuiu em vida, Lagerfeld nunca permaneceu apegado a bens por muito tempo. “Acho alegria em colecionar, a diversão de caçar objetos, o que é emocionante”, disse em entrevista.

Uma das figuras mais prolíficas da moda, Lagerfeld era mais associado à Chanel, onde começou como costureiro em 1983, lançando um dos primeiros e mais bem-sucedidos rejuvenescimentos de marca e impulsionou o lendário nome francês da quase obscuridade ao cume do luxo internacional. Além de Chanel, também foi a força criativa de coleções da italiana Fendi e da francesa Chloé. Sua grife, a Karl Lagerfeld, englobou de tudo, roupas, jeans, perfumes, hotéis e segue disputada. Ter uma bolsa com seu nome, para as fashionistas, é tão essencial quanto uma bolsa de couro de crocodilo da Hermès, a mais cara do mercado. Seu vasto legado, entretanto, não tem preço.