Considerado um ícone dos Estados Unidos durante a Lei Seca, o mafioso Al Capone ainda é notícia, mais de 70 anos após morrer de sífilis na Flórida. As quatro netas de Capone fizeram um leilão de 174 objetos pessoais do lendário gângster que aterrorizou o submundo de Chicago nos anos 1920 e arrecadaram mais de US$ 3 milhões (R$ 16,6 milhões). O objeto considerado mais valioso, uma pistola Colt semi-automática calibre 45, foi arrematada por US$ 1 milhão. Entre outras reliquias vendidas estão um relógio de bolso, um canivete com 20 diamantes, um umidificador de charutos e cartas que escreveu para o filho único Sonny, quando esteve preso na cadeia de Alcatraz.

Uma das netas do famoso mafioso, Diane Capone, de 77 anos, disse que a decisão de leiloar os objetos foi tomada porque elas envelheceram e acreditam que não conseguirão mais guardá-los com segurança. Elas vivem no norte da Califórnia, estado americano atingido por incêndios florestais que destruíram milhares de casas. Diane disse que uma carta que Capone escreveu para o filho Sonny foi arrematada por US$ 45 mil. Segundo ela, a carta é “adorável” e revela o amor de um pai por um filho. “Estas não são palavras e ideias de um gângster implacável, mas de um pai afetuoso”, disse Diane à emissora americana ABC.

Capone, contudo, foi mesmo um marginal impiedoso e violento. Suspeito de vários assassinatos, ele foi preso e condenado apenas por evasão fiscal, após uma caçada exaustiva conduzida pelo agente Eliot Ness, que liderava a equipe chamada de “Os Intocáveis”, imortalizada no filme de mesmo nome feito por Brian De Palma em 1987. Mesmo assim, ele terminou a vida milionário e deixou uma fortuna de herança.

Nascido em 1899, em Nova York, filho de um casal de imigrantes da província de Salerno, no Sul da Itália, Alphonse Capone cresceu nas ruas do Brooklyn, que na época era um bairro proletário de Nova York. Rebelde, agrediu uma professora aos 14 anos e foi expulso da escola. Na época, já andava com a gangue de Frank Yale (Francesco Ioele), um bandido calabrês temido pela violência em Manhattan e líder da gangue Five Points.

Mas Capone e Yale tinham origens na Itália continental, e quem mandava no submundo nos dois lados do Atlântico era a Cosa Nostra, a máfia siciliana. Capone trabalhou para Yale por sete anos no bar “Harvard Inn”, onde a gangue dos Five Points se reunia. Foi neste período que, esfaqueado no rosto em uma briga com irlandeses, ganhou o apelido “Scarface” (cicatriz). Curiosamente, a namorada de Capone, Mae Coughlin, era de origem irlandesa. Os dois se casaram em 1918, quando ela teve o filho único do casal, Albert Francis Capone, o “Sonny”.

Em 1919, Capone foi enviado por Yale para Chicago, onde virou o braço direito de John Torrio (Giovanni Torrio), que controlava os bordéis na próspera metrópole do Meio-Oeste dos EUA. Apelido de “Papa Johnny”, Torrio era “consegliere” (conselheiro) da família Genovese, uma das cinco da Cosa Nostra de Nova York. Com a ajuda de Capone, que virou seu braço-direito, Torrio foi suspeito de assassinar Jim Colosimo, que controlava o lucrativo negócio clandestino da venda de álcool. Em 1920, a produção e comércio de bebidas foram proibidos, uma forma ineficaz de controlar a epidemia de alcoolismo. A Lei Seca durou até 1933. A polícia de Chicago olhava para o lado e a Cosa Nostra fez fortuna com o negócio ilegal.

Com a Polícia de Chicago subornada e o apoio da família Genovese, Capone começou a exterminar as gangues irlandesas e os rivais que tentassem vender bebida. O ponto alto desta guerra aconteceu no Massacre de São Valentim, quando sete membros da “Gangue do Lado Norte” foram metralhados em uma garagem, em 14 de fevereiro de 1929. O crime chocou os EUA e atraiu a atenção para Capone. Em 1931, foi finalmente preso e acusado de sonegação fiscal, recebendo 11 anos de sentença — cumpridos, a partir de 1934, em Alcatraz. Capone sofria de sífilis e tuberculose. Em 1939 foi libertado e viveu o resto da vida na sua mansão em Miami. O sucesso do leilão, onde os objetos foram vendidos acima do preco inicial, revela a popularidade de Capone até hoje. É curioso notar que criminosos muito mais violentos e poderosos surgiram nas décadas seguintes, como o mafioso siciliano Salvatore Riina e o traficante colombiano Pablo Escobar. Mas nenhum conseguiu virar um mito como Capone.