Adiamento de consultas de rotina e suspensão de procedimentos eletivos explicam a queda; o diagnóstico tardio pode aumentar risco de morte, como no caso de alguns tipos de câncer

 

Fabiana Cambricoli, da Agência Einstein

Em meio à pandemia de coronavírus, a quantidade de procedimentos com finalidade diagnóstica feitos no SUS caiu 20% em 2020. Foram 785 milhões de exames no ano passado, ante 982 milhões em 2019, de acordo com dados do Sistema de Informações Ambulatoriais do Ministério da Saúde.

O número é o menor desde 2012, quando a rede pública alcançou 784 milhões de procedimentos diagnósticos. Em oito anos, é a primeira vez que o volume de exames fica abaixo dos 800 milhões.

Entre as principais explicações para a queda estão o adiamento de exames de rotina por pessoas que preferiram se manter isoladas e a suspensão temporária de atendimentos eletivos (não urgentes) por unidades de saúde sobrecarregadas pela demanda de atendimentos de Covid-19.

O atraso na realização dos testes preocupa os médicos, que já observam diagnósticos mais tardios de doenças como o câncer — para o qual a detecção precoce é determinante para elevar as chances de cura.

“A gente tem recebido pacientes com um estadiamento mais avançado do tumor. Muitas pessoas adiaram em mais de um ano exames como mamografia, colonoscopia e preventivos ginecológicos e de próstata. Um atraso de seis a oito meses no diagnóstico já pode fazer diferença para a progressão da doença”, relata Alexandre Ferreira Oliveira, presidente da Sociedade Brasileira de Cirurgia Oncológica e chefe do serviço de oncologia da Universidade Federal de Juiz de Fora.

Os dados do Ministério da Saúde, disponíveis no portal Datasus, mostram, de fato, queda expressiva nos exames de rastreamento dos principais tipos de tumor. No caso do papanicolau, teste ginecológico que detecta lesões prévias ao câncer de colo de útero, a redução chegou a 66,9% no período analisado. Já para a mamografia, a diminuição foi de 20,8%. O exame de dosagem de PSA, que auxilia no diagnóstico do câncer de próstata, teve queda de 26,9%.

Ao menos três estudos britânicos divulgados no ano passado já apontaram um possível aumento da mortalidade por câncer associado à pandemia. No mais recente, publicado em novembro no periódico The British Medical Journal, os autores estimaram até 17,9 mil óbitos extras de pacientes oncológicos em um ano. Isso inclui mortes que seriam evitadas não fossem fatores como diagnósticos tardios ou interrupção de tratamentos ou acompanhamentos.

Outras doenças, como as cardiovasculares, também podem ter seus quadros agravados pela falta de acompanhamento especializado. De acordo com Evandro Tinoco Mesquita, coordenador da Universidade do Coração da Sociedade Brasileira de Cardiologia, exames e procedimentos fundamentais para a detecção e monitoramento de doenças do coração, como o cateterismo, a cintilografia e o teste de esforço, tiveram uma redução importante.

Os dados do Datasus confirmam a percepção do especialista. O número de cateterismos cardíacos realizados em adultos caiu 26% em 2020 em relação ao ano anterior. A cintilografia do miocárdio (músculo cardíaco) teve queda de 25%. Já os testes de esforço/ ergométricos diminuíram ainda mais — 38%.

“Se a gente detecta tardiamente um infarto ou uma descompensação da insuficiência cardíaca, isso tem risco para o paciente. Devemos estar atentos para manter o tratamento das doenças cardiometabólicas, como hipertensão, diabetes e a própria insuficiência”, destaca Mesquita, que também é professor da Universidade Federal Fluminense (UFF).

O médico também destaca que, no início da pandemia, a Sociedade Brasileira de Cardiologia chegou a fazer uma pesquisa mostrando um aumento de mortes por causas cardiovasculares ocorridas em domicílio. A principal hipótese para o fenômeno é que mesmo pacientes com sintomas desses problemas estavam evitando a ida ao médico ou a um pronto-socorro por medo de se infectarem com o coronavírus.

Os especialistas destacam que, mesmo com um número ainda alto de casos de Covid-19 no país, consultas e exames não devem mais ser interrompidos ou adiados. Hoje, a maioria dos centros médicos possui fluxos separados de atendimento para pacientes sem o vírus e seguem os protocolos sanitários para minimizar o risco de contágio.

Principais exames de rastreamento e preventivos

Mamografia — Usado no diagnóstico do câncer de mama, deve ser feita por mulheres de 50 a 69 anos, a cada dois anos, segundo recomendação do Ministério da Saúde. Algumas sociedades científicas defendem, no entanto, que o procedimento comece a ser feito a partir dos 40 anos, principalmente se há histórico da doença na família.

Exame de PSA e toque retal — Ajudam no diagnóstico do câncer de próstata. Devem ser feitos por homens com 50 anos ou mais, ou a partir dos 45 anos quando o paciente tem fatores de risco, como histórico familiar ou obesidade.

Colonoscopia — O procedimento pode detectar o câncer de intestino ou lesões pré-malignas que, se tratadas, não evoluem. O exame deve ser feito a partir dos 50 anos e repetido a cada 3 ou 5 anos, conforme avaliação médica. Para indivíduos com histórico familiar da doença, a primeira colonoscopia precisa ser feita dez anos antes da idade na qual o parente apresentou o tumor.

Papanicolau — Ele pode identificar lesões precursoras do câncer de colo de útero e deve ser feito em mulheres que já tiveram relações sexuais a partir da faixa etária dos 20 anos (a idade exata demanda uma conversa com o médico).

Outras avaliações – Além dos exames de rastreamento para o câncer, é importante consultar um médico periodicamente para avaliar a necessidade de testes que sinalizam outros problemas de saúde. Entre os mais solicitados estão hemograma, ecocardiograma, teste de esforço e eletrocardiograma.

 

(Fonte: Agência Einstein)

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