O afrouxamento, na Câmara dos Deputados, do programa de ajuste fiscal proposto para os Estados é uma “política de avestruz”, afirmou o professor José Roberto Afonso, do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (Ibre-FGV) e do Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP). “É enfiar a cabeça na terra e fazer de conta que o problema não existe.”
Ele avaliou que os Estados brasileiros vivem uma crise muito profunda, e na raiz dela “certamente está a concessão de reajustes salariais e contratação de pessoal sem cobertura financeira”. A situação se agravou a tal ponto que muitos Estados não conseguem mais pagar a folha em dia – que dirá conceder aumentos.
Porém, o professor – um dos formuladores da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) – tem “sérias dúvidas” se proibir aumentos durante dois anos, como constava na proposta do governo para o projeto de lei complementar (PLP) 257, que trata da renegociação da dívida dos Estados e impõe a eles um programa de ajuste, resolveria o problema.
Isso porque já há legislação impondo limites nos gastos com folha salarial. Até mesmo a Constituição, lembrou, fala em limites para pessoal e inativos – mas muitos Estados não incluem as despesas com aposentadoria de funcionários em suas folhas, e com isso registram gastos salariais menores do que o efetivamente ocorrido. “O problema não é falta de lei; é cumpri-la”, diz Afonso.
Segundo o especialista, no que se refere a despesas, os primeiros a mudar a interpretação da lei são justamente aqueles que deveriam ser seus guardiões: os tribunais de contas, os judiciários estaduais, as assembleias legislativas e os ministérios públicos estaduais. “Deveríamos aproveitar a oportunidade para discutir isso.”
Para Felipe Salto, especialista em contas públicas, a última versão do PLP 257 apresentada pelo governo é boa. “Mas, se houver afrouxamento, o último a sair apague a luz.” Diferente de Afonso, ele considera fundamental manter a proibição dos reajustes por dois anos, pois essa é a razão principal da deterioração das contas estaduais.
Mas a exclusão, do projeto de lei, dos dispositivos que alteravam a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) – que será alvo de um novo projeto – foi vista como positiva por Afonso. “Excelente a ideia de separar a LRF da repactuação da dívida”, comentou. “Uma coisa é a renegociação das dívidas, que é uma meia-sola para uma situação que se tornou incontornável, e outra é a LRF, uma legislação que vale inclusive para os Estados que não têm dívida.”