Coluna: Artevida

Paula Alzugaray é curadora, critica de arte e editora da revista seLecT. Pós doutoranda em História, Crítica e Teoria da Arte na ECA USP. É autora do livro "Regina Vater: Quatro Ecologias" (Oi Futuro/Fase 3, 2013) e dos documentários “Tinta Fresca” (2004), prêmio de Melhor Media Metragem na 29ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, e de "Shoot Yourself" (2012), Prêmio em Poéticas Investigativas, no Cine Move Arte 2012.

O que fazer?

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Começou a Cova América e a história se repete. O futebol é usado para nublar consciências e dopar as massas sob governos autoritários. Mas, desta vez, há menos coragem do que se teve na pior fase do governo militar. Tite não repetiu João Saldanha, o João-sem-medo, jornalista e ativista que peitou Médici e perdeu o emprego de técnico da seleção na Copa do Mundo de 1970. Tite manteve o cargo e a seleção perdeu a oportunidade de desafinar o coro dos terraplanistas, cloroquinistas e fascistas. Teriam feito muito mais pela história do Brasil e a vida dos brasileiros do que o ouro de tolo de qualquer campeonato. Mas não. Tudo transcorre como o previsto: treze integrantes da seleção rival do Brasil na estreia no campeonato são diagnosticados com Covid-19. E os memes que chutaram a bola em formato de vírus, logicamente acertaram.

Em uma época sem heróis ou ícones da democracia que fazem a bola rolar com saúde, temos que decidir por nós mesmos: o que fazer?

O que fazer com a revolta pelo assassinato de mais uma pessoa negra? Pela tragédia de Kathlen Romeu ser atropelada e suplantada por motocicletas fascistas estacionadas diante de um monumento que simboliza a campanha bandeirante de conquista e extermínio de populações indígenas no interior do Brasil? Revisar as decapitações de monumentos de personagens escravagistas e colonialistas, que aconteceram na esteira do movimento Black Lives Matter, no ano passado, é um começo.

Desmontar mitos é o segundo passo. Reconhecer que mortes por Covid-19 são mortes violentas é o terceiro. Diante da escalada das atrocidades nossas de cada dia, cabe trocar monumentos por manifestações. Bandeiras serão levantadas no 19J mas, em tempo de comunicação digital e de atenção máxima à terceira onda da pandemia, o aquecimento deve começar na tela do seu celular. Experimente, por exemplo, o “monumento virtual coletivo”, de Nuno Ramos. Trata-se de uma instalação composta por uma “chama eterna”, que ficará acesa ao longo de um ano, em memória aos mortos da Covid-19. O fogo, aceso em uma sala do Sesc Avenida Paulista ao longo de um ano, é filmado e transmitido 24 horas por dia na exposição virtual A Extinção é Para Sempre. “CHAMA, portanto, é o fogo enquanto ritual e também um chamado, uma convocação internacional ao luto, à pausa e à dignificação de cada perda”, afirma o artista no site do projeto co-realizado com o Goethe-Institut.