A comunidade católica brasileira tem mais um motivo para intensificar as orações e crenças. Foram beatificados dia 5, em Roma, 30 mártires, vítimas de dois massacres promovidos por holandeses em 1645, no Rio Grande do Norte. Dois deles foram assassinados dentro da capela Nossa Senhora das Candeias, no município de Canguaretama. O outro grupo, de 28 pessoas, foi morto às margens do rio Uruaçu, em São Gonçalo do Amarante. O único brasileiro beatificado até então era o paulista frei Galvão, declarado bem-aventurado em 1998. A beatificação dos mártires brasileiros em uma única ocasião foi considerada o evento mais importante da comunidade católica dos últimos anos e emocionou o Papa, que chegou a cantar com os peregrinos brasileiros o hino “A bênção João de Deus.”
 

Juntamente com os brasileiros, outros quatro grupos de mártires – o padre Nicolau Bunked, da Tailândia; a freira Mari Stella e outras dez irmãs, da Belarus; o catequista leigo Pedro Calungsod, das Filipinas, e o catequista André, do Vietnã – se tornaram bem-aventurados. Os mártires de Cunhaú e Uruaçu, por serem em maior número, foram o principal grupo da cerimônia. O arcebispo de Natal, dom Heitor de Araújo Sales, fez a petição em latim, pedindo a beatificação de todos. O estandarte dos mártires – uma grande pintura com mais de quatro metros de comprimento, feita pelo artista plástico Gilvan Lira – ficou no centro da Basílica de São Pedro. A missa foi celebrada pelo papa com a ajuda de sete sacerdotes brasileiros, entre eles o cardeal do Rio, dom Eugênio Sales. O processo de beatificação dos mártires brasileiros durou dez anos e foi comandado pelo vigário geral da Arquidiocese de Natal, monsenhor Francisco de Assis Pereira. Foi ele o postulador da causa, quem fez todos os estudos de pesquisa e elaborou o “positio” – documento com a história dos mártires, que terão um dia especial para celebração. Mas beato não é santo. Para canonização é preciso milagres. “Não há previsão de quando isso pode acontecer”, ressalta mosenhor Francisco, que confirma ter recebido cartas de fiéis relatando histórias de graças alcançadas por intermédio dos mártires.
 

Enquanto a canonização não vem, a romaria se intensifica nos locais dos massacres, onde não há estrutura e, hoje, nada lembram o passado. Em Uruaçu o que existe é um descampado à margem do rio. Para marcar a tragédia foi ali colocado um grande cruzeiro. Em Cunhaú, o engenho já não existe mais. A capela de Nossa Senhora das Candeias foi reformada. De original, só ficaram dois pilares.
 

Todos os domingos uma missa é realizada na capela repleta de devotos que chegam de vários locais. No caso de Uruaçu, a devoção começa com moradores da fazenda Carnauibinha, onde está o cruzeiro. Anália Firne de Melo, 70 anos, reza ali todo o fim de tarde. A filha de dona Anália, Josefa da Conceição, também é devota dos mártires. “Já alcancei até um milagre de ter ficado curada, depois de uma cirurgia”, assegura. Os órgãos públicos já despertaram para o fato de que estes lugares tendem a se tornar pontos de peregrinação. O governo do Estado já começou a construção de monumento e de uma estrada de acesso ao cruzeiro. O projeto prevê um grande palco e um painel com a cena do massacre. Além disso, haverá estrutura de camarim, para quando forem realizados shows católicos no local. O total da obra está orçado em R$ 500 mil. E os proprietários da fazenda Carnaubinha, onde está o cruzeiro, já cogitam fazer parcerias para ali construir hotéis e pousadas.