Vacile e cometerá erros imperdoáveis. Relaxe e passarão a perna em você. Essas sentenças fatídicas estão levando cada vez mais gente a sofrer a ânsia de estar o tempo todo realizando coisas, cumprindo tarefas. Afinal, nas regras do mundo atual, o tempo não pára nem permite que se estacione. A consequência tem sido inevitável: stress, stress e mais stress. Embora não exista uma estimativa mundial sobre a quantidade de vítimas desse mal, os poucos números disponíveis dão uma idéia do apetite deste vilão. Nos Estados Unidos, dados do Instituto Nacional de Segurança e Saúde apontam que 89% dos adultos se consideram num alto nível de stress, fator de risco para várias doenças – desde gastrite, dor de cabeça e depressão até as que afetam o sistema cardiovascular. Há cinco anos, a estimativa batia na casa de 70%. Por isso, o Departamento Nacional de Prevenção de Doenças e Promoção de Saúde americano estabeleceu o combate ao stress como prioridade. No Brasil, os especialistas concordam com a gravidade da situação. "O stress está se tornando um problema de saúde pública porque acomete grande parte da população e está sobrecarregando o sistema de saúde por conta das complicações que provoca", diz Alexandrina Meleiro, do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP).

O tema tem despertado tanto interesse que a média anual de congressos mundiais sobre stress nos últimos dez anos saltou de dois para sete, segundo a psicóloga Ana Maria Rossi, diretora da Clínica de Stress e Biofeedback, de Porto Alegre. "É uma exigência ditada pela quantidade de novas pesquisas", diz. Na verdade, o que se está tentando é destrinchar quais os tipos e as causas do stress para que seja mais fácil combatê-lo. No último congresso internacional realizado nos EUA, no início do mês, por exemplo, um dos assuntos mais comentados foi o stress cibernético. Apesar de provocar os mesmos sintomas do stress já conhecido – dores no corpo, pressão alta, palpitações, etc. –, suas causas são relativamente novas. Como o nome indica, o stress cibernético está relacionado à informática: computadores, celulares e toda a parafernália eletrônica que gera uma avalanche de informações. Os americanos passam meia hora por dia respondendo e-mails e dispensam 40 minutos – ou seja, apenas um pouco mais de tempo – para os relacionamentos pessoais diretos.

Outro estudo, de Gary Cooper, da Universidade de Manchester, na Inglaterra, constatou que a cada dia mais trabalhadores apontam as novas tecnologias como causa de mal-estar. "As pessoas não conseguem descansar enquanto não se livram do volume de correspondências", disse o pesquisador a ISTOÉ. Durante o mesmo encontro, outras causas de stress mereceram discussão, como o conflito – e o sofrimento – de casais que deixam os filhos para trabalhar. Entre os cientistas, surgiu também o consenso de que uma coleção de pequenos eventos traumáticos no dia-a-dia – ouvir gritos do chefe ou ser repreendido pelo professor, por exemplo – é tão perigosa quanto traumas como um estupro. "O stress que mata é o das pequenas coisas. E no ambiente de trabalho há um agravante: a pessoa não se queixa com medo de represália", diz Ana Maria Rossi. Sem válvula de escape, a exaustão emocional leva ao desgaste físico.

 

Hormônios O stress sempre existiu. Ele consiste em uma descarga hormonal que provoca a dilatação das pupilas, aumenta a frequência cardíaca, eleva a pressão arterial, eriça os pêlos. Tudo com a finalidade de preparar o organismo para enfrentar uma situação fora do comum – em geral, perigosa, como fugir de um animal feroz. Passada a situação-limite, o corpo volta para seu estado normal. Quando o perigo não se afasta, o stress torna-se prejudicial. É isso que tem espantado na última década. As pessoas estão vivendo em alerta constante porque o perigo está dentro delas. Ele não é mais real – não há mais leões correndo atrás de ninguém –, mas está nas idéias e nas sensações de ameaça e incompetência. O tempo que o stress demora para provocar um colapso dependerá da maneira como a pessoa aprendeu a se comportar diante das pressões diárias – há quem enfrente melhor essas situações – e da própria genética. Tudo, no entanto, começa no cérebro, de onde é orquestrada a reação hormonal a partir da liberação de adrenalina (substância que contrai os vasos sanguíneos). Os órgãos atingidos dependerão da vulnerabilidade genética de cada um.

Saídas Mas a agonia não tem de durar para sempre. O stress pode ser derrotado. E de várias formas. A medicina tradicional lança mão de remédios para tirar o estressado de crises agudas. "Se a pessoa desenvolveu depressão, por exemplo, o antidepressivo ajuda. No entanto, se os agentes estressores não forem afastados, o problema volta", enfatiza a psiquiatra Alexandrina Meleiro. É justamente para trabalhar nessas duas frentes que se torna importante combinar o tratamento com a psicologia. O psicólogo ajuda o paciente a identificar as causas do desgaste. "Faz-se um levantamento dos sintomas, da intensidade e frequência, do tipo de personalidade e da situação profissional", explica a psicóloga especializada Maria Aparecida Covolan, de Campinas.

A partir daí, começa a dura tarefa da reestruturação emocional, que consiste no ensino de algumas técnicas de relaxamento e, principalmente, de métodos capazes de ajudar a fazer com que o estressado mude vários de seus pensamentos. "A pessoa entende que, se não consegue se desligar de um problema ao deitar, não dormirá, e no dia seguinte sentirá maior dificuldade de resolver a questão", explica Marilda Lipp, do Centro Psicológico de Controle do Stress, de Campinas. Foi com esse suporte que o escrivão de polícia paulista Jovacil Dias, 51 anos, aprendeu a administrar o stress que, há dois anos, provocou uma súbita queda de cabelo em 18 pontos de sua cabeça. Dias era agitado e ficava ansioso com o serviço acumulado. Quando, junto com tudo isso, teve um problema familiar, veio a crise. "Da dermatologista fui parar numa psicóloga. Mas o tratamento fez com que eu enxergasse as coisas com mais calma. Agora, sempre que começo a ficar ansioso faço exercícios de relaxamento e aprendi também a delegar mais tarefas", diz.

A homeopatia é outra tática que costuma se sair bem no tratamento do stress. Afinal, essa especialidade médica trata não só do corpo, mas também das emoções. "O remédio homeopático não acabará com a dor de estômago, mas ajudará a pessoa a perceber o que causa a dor e a mudar de atitude com relação àquilo que a estressa", explica o homeopata paulista Fernando Bignardi.

 

Biofeedback Outro recurso é o biofeedback. São aparelhos que monitorizam, por meio de sensores acoplados ao corpo do paciente, como estão a tensão muscular, a pressão arterial, a frequência cardíaca e as ondas cerebrais (essas informações servem de indicadores do nível de stress). As medições são feitas antes e durante atividades de relaxamento. Elas servem como um guia. Ao entender as reações do corpo, fica mais fácil tentar mudar aquilo que está prejudicando o paciente. A estratégia está fazendo efeito para a química gaúcha Iolanda Dill, 50 anos, que começou a utilizar o aparelho há um mês e meio. Iolanda fala e anda rápido, faz duas coisas ao mesmo tempo e é do tipo que prefere subir de escada a esperar um elevador. Tanta pressa tem custado caro. "Estou sempre com dores. Não aprendi a respirar profundamente ainda, mas já estou começando a soltar a musculatura", diz, satisfeita.

Os exercícios físicos, assim como chorar, rir, fazer sexo, também ajudam. Essas ações provocam relaxamento da mente e do corpo por causa da liberação de endorfinas, substâncias responsáveis pela sensação de bem-estar. No caso da atividade física não precisa muito: 30 minutos, três vezes por semana, bastam. Para o comerciante carioca Francisco De Luca, 53 anos, essa tem sido uma medida de prevenção. Ele já tem o corpo debilitado por um infarto que sofreu em 1994, está tendo dificuldades para dormir – tanto que passará uma noite num centro de estudos do sono para identificar a causa do problema – e admite ser um estressado padrão. Assumidamente relaxado com a saúde, ele está se esforçando para mudar. "Caminhar, pelo menos, é uma coisa que eu gosto", declara.

Muitas opções vêm da medicina alternativa, com suas técnicas capazes de amenizar crises, mas também de desempenhar um papel preventivo. Uma delas é a acupuntura. Além de relaxar os músculos e equilibrar a energia geral, ela age sobre os pontos fracos das pessoas, aqueles em que a corda costuma arrebentar quando a tensão é grande. Na acupuntura, cada órgão do corpo corresponde a um elemento da natureza e a uma sensação. "Os rins, por exemplo, simbolizam a água e representam o medo. Por isso, pessoas medrosas podem, em situações de muito stress, desenvolver um cálculo renal", ilustra o acupunturista Gabor Fonai. "Nesses casos, colocamos agulhas nos locais-chaves e fazemos um reforço nos pontos que correspondem aos rins", completa. Outra alternativa é o shiatsu, técnica de massagem oriental que trabalha nos mesmos pontos da acupuntura – a diferença é que o estímulo dos pontos é feito com os dedos e não com as agulhas. A técnica é eficaz também por desfazer a tensão muscular acumulada. "Em períodos de estafa, as pessoas respiram mal e absorvem pouco oxigênio, o que aumenta a produção de ácido lático, substância responsável pelo enrijecimento e contração dos músculos", explica a terapeuta Luiza Sato. O corretor da Bolsa de Valores Armando Toledo, 59 anos, há 20 evita o stress com a massagem e atividade física. Ele joga tênis diariamente e faz shiatsu pelo menos uma vez por semana. "Nunca sofri nenhum problema grave de saúde por causa de estafa", conta.

 

Florais A terapia floral, criada pelo inglês Richard Bach, promete equilibrar quem está entrando em stress por meio de essências florais. O princípio básico é o de que as flores possuem um tipo de vibração energética sutil capaz de regular a energia humana. "Sob stress, o padrão energético é alterado e as flores ajudam a recuperar o equilíbrio", explica a terapeuta floral Thais Delboni. Outra alternativa contra o stress é o reiki. De origem japonesa, a terapia consiste na transmissão de energia por meio do toque e da imposição com as mãos. "Uma pessoa estressada fica com a energia bloqueada e não consegue ter dimensão do problema em que está envolvida. O reiki energiza essa pessoa a tal ponto que ela adquire consciência da situação e forças para livrar-se dela", garante a mestre de reiki, Elizabeth Zanetti. A estudante Daniela Borba, 21 anos, assegura que o método funciona. Quando buscou ajuda no reiki, há cerca de um ano, Daniela completava três anos prestando vestibular para Medicina e exausta. "Estava apática e minha auto-estima desabou", lembra. "Quando comecei as sessões de reiki, percebi que a medicina não era o meu negócio, mas sim a psicologia", conta ela, que hoje realiza auto-aplicações para afastar o stress. Deu pane, mas felizmente ela conseguiu desligar o circuito.

Colaboraram: Celina Côrtes, do Rio de Janeiro, e João Caminoto, de Londres

 

Onde está o relax?
Pesquisa italiana mostra que viagens curtas podem aumentar ainda mais o stress

 

JOÃO CAMINOTO – Londres

O senso comum preconiza que as escapadelas de fim de semana ou nos feriados prolongados são perfeitas para atenuar o stress. Mas atenção: viagens curtas de final de semana fazem mal à saúde. Quem garante é o cardiologista italiano Walter Pasini, 50 anos, especialista da Organização Mundial da Saúde (OMS) que estuda há mais de duas décadas os efeitos de viagens na saúde humana. Segundo Pasini, os finais de semana ou feriados prolongados na praia ou na serra podem ser tão estressantes que aumentam os riscos de um ataque cardíaco ou de um acidente de carro. "Arrumar as malas, correr para o aeroporto, enfrentar o trânsito, torna-se uma atividade potencialmente perigosa", disse Pasini a ISTOÉ.

O especialista, que dirige na Itália, um centro de colaboração com a OMS pela Medicina do Turismo, tem provas para essa afirmação. Ele analisou mil pessoas com idades entre 18 e 75 anos que fizeram reservas de viagens com agências de turismo italianas. Metade dos passageiros viajou por menos de uma semana. Eles tiveram 17% a mais de chance de sofrer de um ataque do coração do que aqueles que se ausentaram por um período mais longo. Isso sem falar que aqueles que promoveram "viagens concentradas" tiveram 12% a mais de chances de se envolver num acidente automobilístico.

Por que eles correram mais riscos? "O ritmo de vida se torna mais acelerado quando a pessoa faz uma viagem curta", explica Pasini. Afinal, ela tem de correr para preparar tudo, enfrentar as horas da viagem e, depois, se adaptar a uma nova situação. Tudo isso, embora não pareça, gera stress. Tanto assim que, na pesquisa, os turistas de até uma semana, na volta da viagem, apresentaram pressão arterial e frequência cardíaca mais elevadas do que o grupo que desfrutou de descanso mais longo. E, como se sabe, esses são dois fatores de risco para um ataque do coração. Além disso, os que fizeram viagens rápidas manifestaram nível de atenção mais baixo e problemas com o sono, o que justifica a chance maior de se envolver em acidentes de carros.

Na verdade, o corpo precisa de cerca de seis dias para que os hormônios que entraram em colapso por causa do stress se normalizem. "É como uma peça quente. Não adianta tirar da tomada. Vai precisar de um tempo para esfriar", diz Alexandrina Meleiro, psiquiatra paulista. Muita gente que já tentou essa "esfriada" rápida sabe bem do que fala a médica. Consciente dos transtornos que teria pela frente, o ilustrador Jairo de Oliveira, 24 anos, insistiu em passar o réveillon deste ano em Caraguatatuba, litoral norte paulista. Levou 12 horas para chegar e, como não tinha comida no carro em que viajava, passou a noite bebendo cerveja quente com os amigos. "Pior foi que o rádio do carro pifou e só tocava um CD. Não via a hora de chegar em casa", lembra.

Dores Em alguns casos, além de mais cansaço, o saldo é uma dorzinha aqui ou ali. Com o corretor de seguros Paulo Opipari, 37 anos, as dores de cabeça e o mal-estar estomacal são comuns depois de férias curtas. Ele costuma ir com a mulher, as duas filhas gêmeas e a cachorra para Maresias, no litoral paulista. "Se a viagem demora muito, as meninas não aguentam, choram. Na hora de voltar, elas brigam porque não querem entrar no carro", diz. A viagem mais angustiante que já enfrentou foi quando a cachorrinha da família foi "esquecida" num posto de gasolina. "Só fomos perceber sua falta em São Paulo. Minha mulher queria voltar para a praia e eu passei a madrugada tentando ligar para aquele posto", lembra.

Segundo Pasini, num mundo ideal, as pessoas deveriam tirar férias por um mês ou dois. O gerente comercial Marcelo Rocha, 36 anos, concorda. Em dezembro passado, depois de esforço dobrado para fechar a contabilidade da empresa onde trabalha, tirou três dias de férias e foi para um sítio em Ibiúna, interior de São Paulo. "Estava morto de cansaço, peguei muito trânsito e quando me dei conta já era hora de voltar. Isso me deixou ainda mais cansado e acredito que contribuiu para que eu tivesse uma forte dor nas costas. Ao chegar em São Paulo, a primeira coisa que fiz foi procurar um médico", recorda. Rocha aprendeu. Em julho, fez uma viagem de quatro dias para Fortaleza. "Mas fui de avião e me contentei em ficar na praia em frente ao hotel em que estava hospedado. Aproveitei o sol e o mar. E deu para relaxar", comemora. Estratégia perfeita.