A ministra Rosa Weber, do Supremo Tribunal Federal, usou o presidente Jair Bolsonaro como exemplo do risco de armas compradas legalmente por cidadãos caírem nas mãos de criminosos. Na decisão que suspendeu trechos de quatro decretos que ampliaram o acesso às armas, a ministra relembra o episódio em que Bolsonaro teve uma pistola roubada no Rio de Janeiro em 1995. Na ocasião, o então deputado federal afirmou que “mesmo armado, me senti indefeso”.
“Ao que consta, o próprio Presidente da República já passou pela experiência de ter sua arma de fogo roubada e desviada para o arsenal de criminosos. Segundo notícia veiculada na mídia (A Tribuna da Imprensa, p. 5, ed. 13.858, publicado em 05 de julho de 1995), em 04 de julho de 1995, o então deputado federal Jair Bolsonaro teve sua pistola Glock 38 roubada por dois homens enquanto cruzava o bairro Vila Isabel na cidade do Rio de Janeiro. À época, em declaração aos órgãos de imprensa, segundo notícia veiculada em A Tribuna da Imprensa, o atual presidente declarou que, ‘mesmo armado, me senti indefeso'”, relembrou Rosa.
A ministra citou o episódio ao comentar que 68% das armas de fogo apreendidas com criminosos foram adquiridas por cidadãos ou empresas de vigilância e que, deste total, 74% foram vendidas a pessoas físicas.
“Daí a importância de restringir-se o acesso da população em geral às armas de fogo. As armas adquiridas legalmente acabam sendo desviadas para o crime por meio de furto, roubo ou, ainda, pela criação de um mercado secundário clandestino de revenda de armas pelos proprietários originais, como enfatizado no Sub-Relatório da Comissão Parlamentar de Investigação”, frisou a ministra.
Rosa Weber suspendeu trechos de quatro decretos editados por Bolsonaro em fevereiro que ampliavam o acesso a armas e munições no País – as medidas entrariam em vigor nesta terça, 13. As mudanças elevariam o número máximo de armas de uso permitido para pessoas com Certificado de Registro de Arma de Fogo (subiu de quatro para seis unidades), permitiriam o porte nacional de armas e também abririam a possibilidade de substituição do laudo de capacidade técnica – exigido por lei – por um “atestado de habitualidade” emitido por clubes de tiro.
Em relação à norma que ampliou o número máximo de armas permitido para agentes de segurança (que subiu de seis para oito), Rosa afirmou que o decreto de Bolsonaro leva a uma ‘inversão do ônus da prova” na medida em que a aquisição das armas é condicionada a ‘efetiva necessidade”.
“Efetiva é a circunstância realmente presente, concreta, atual. Não se pode, por meio de ato normativo subalterno, ressignificar o conteúdo jurídico dessa expressão normativa para torná-la sinônimo de algo suposto, hipotético, aparente, ficto”, afirmou a ministra. “Além disso, os militares e agentes de segurança pública já utilizam as armas fornecidas pela própria instituição, não havendo motivo razoável para adquirirem, além das armas funcionais, também um arsenal de até oito armas pessoais, inclusive de repetição. Tudo isso sem qualquer comprovação sobre os motivos da aquisição ou as finalidades para as quais serão utilizadas”.
Os decretos serão discutidos pelo plenário virtual do Supremo a partir da próxima sexta, 16. O Planalto alega que as mudanças foram pensadas para “desburocratizar procedimentos” e evitar “entraves desnecessários” à prática do tiro desportivo. “Para se conseguir comprar uma arma de fogo é necessário ‘investir tempo e dinheiro’, sendo que levam meses até se conseguir todos os registros e autorizações necessários”, escreveu a Secretaria-Geral da Presidência, em ofício enviado ao Supremo pela AGU.
Veja algumas mudanças contestadas:
Decreto nº 10.627
Exclusão de uma série de itens da lista de Produtos Controlados pelo Exército (PCE); permissão para a prática de tiro recreativo de natureza não esportiva, com arma do clube ou do instrutor.
Decreto nº 10.628
Aumento do número máximo de armas de uso permitido para pessoas com Certificado de Registro de Arma de Fogo de quatro para seis unidades.
Decreto nº 10.629
Possibilidade de substituir o laudo de capacidade técnica – exigido pela legislação para colecionadores, atiradores e caçadores (CACs) – por um ‘atestado de habitualidade” emitido por clubes ou entidades de tiro; autorização para CACs comprovarem aptidão psicológica com laudo fornecido por qualquer psicólogo com registro ativo em Conselho Regional de Psicologia, sem exigência de credenciamento pela Polícia Federal.
Decreto nº 10.630
Permissão para o porte de duas armas simultaneamente; porte passa a ter validade nacional.