17/02/2016 - 17:38
O juiz Valter Shuenquener, integrante do Conselho Nacional do Ministério Público, que concedeu liminar garantindo a suspensão do tão aguardado depoimento do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e de sua esposa, Marisa Letícia, declarou à ISTOÉ achar importante que Lula preste esclarecimentos espontaneamente à sociedade “em razão dos fatos apontados”. Ele disse que, com sua decisão, quis evitar que este depoimento e outras provas do processo possam ir “por água abaixo” caso existam erros processuais. Lula e Dona Marisa seriam ouvidos como investigados na manhã desta quarta-feira (17) para explicar a situação do tríplex no Guarujá, incorporado e reformado pela empreiteira OAS. O casal nega ser dono do imóvel, apesar de Dona Marisa ter acompanhado reformas significativas na casa, segundo relatos do engenheiro da obra e zeladores do prédio. Na próxima terça-feira o plenário do CNMP vai julgar se mantém ou derruba a decisão monocrática do juiz sobre a liminar.
ISTOÉ – Sua decisão que levou a uma suspensão do depoimento do ex-presidente Lula foi uma inversão total de expectativas para a sociedade. O que acha disso?
Valter Shuenquener – Havia uma expectativa muito grande por parte da sociedade de quem é a favor e de quem é contra de que ele seria ouvido. O que a gente não pode permitir é que as regras do jogo sejam violadas em razão dessa expectativa.
ISTOÉ – Mas não é importante numa situação como esta que o Lula preste esclarecimentos?
Shuenquener – Acho importante em razão dos fatos que foram apontados. Acho importante que o Lula preste esclarecimentos à sociedade. Mas, no caso aqui, o que aconteceu é que não seria espontâneo. Essa é uma decisão que deve ser feita pelo ex-presidente e sua esposa. Para que seja algo compulsório, obrigatório, precisa ser feito de acordo com o devido processo legal.
ISTOÉ – O sr se reuniu previamente com o deputado Paulo Teixeira (PT-SP)?
Shuenquener – Não, nem o conheço. Nunca falei com ele. Ele me pediu uma audiência para ontem mesmo, mas eu não pude e minha assessoria marcou para a tarde de hoje (quarta). Se ele tivesse vindo ao gabinete, eu o teria recebido como recebo qualquer um que vem para despachar.
ISTOÉ – O senhor já está sendo muito criticado…
Shuenquener – Sim, mas gostaria de dizer que eu sempre me preocupei com a questão da independência do Ministério Público, acho que tem um papel no contexto atual de combate à corrupção, que essa decisão não tem o objetivo de blindar ninguém contra uma investigação. Pelo contrário. A ideia é de que a investigação possa acontecer, mas acontecer de uma forma que não gere nulidade.
ISTOÉ – Mas pode parecer que o senhor está querendo blindar…
Shuenquener – Sim, não tenho dúvidas, porque até eu se estivesse vendo essa reportagem eu diria “pô, mas o cara na noite da véspera… pô esse cara é do PT”, eu pensaria isso.
ISTOÉ – E o senhor é do PT?
Shuenquener – Não sou, nunca fui. Olha só como é que eu me arrumei hoje sem querer (mostra camisa, gravata e terno azuis, cor associada ao PSDB) risos. Nunca tive nenhuma inclinação partidária.
ISTOÉ – Por que o senhor tomou esta decisão de conceder a liminar?
Shuenquener – Tomei esta decisão porque, se amanhã ou depois o Conselho Nacional do Ministério Público entender que o reclamado promotor que está investigando este caso não é o promotor competente, vai fazer com que toda a investigação possa ir por água abaixo, gerando uma frustração de uma expectativa de resultado. Para evitar esse trabalho perdido é que eu achei por bem suspender a atuação neste caso até que o Conselho decida sobre esta matéria. E o Conselho decidirá com a maior brevidade possível. Mas essa liminar pode ser revogada por mim ou pode ser que o plenário do Conselho não a confirme. Eu, junto com o deferimento da liminar, determinei a intimação do reclamado e do Procurador Geral de Justiça para que eles se manifestassem sobre os fatos, com o prazo de 15 dias. E, depois, já posso fazer um voto para a sessão de março, provavelmente no dia 15. Pretendo pedir urgência nesse processo, porque não acho conveniente ficar com um assunto desse tão importante e por isso que se tenha uma decisão definitiva do Conselho.
ISTOÉ – Então sua decisão não avaliou o mérito, correto?
Shuenquener – Temos uma diferença entre tutela antecipada e a medida cautelar. Eu não antecipei uma avaliação se o promotor tem ou não razão. Busquei apenas evitar que houvesse alguma lesão a um bem jurídico, que levasse à nulidade do processo. Não foi uma tutela antecipada. Até vi umas notícias dizendo que a decisão retirou o promotor do caso. Não foi isso. É como se: pare tudo até que se decida sobre a observância da questão do promotor natural. É importante saber se essa investigação está sendo conduzida por um promotor que recebeu aquela notícia em razão de uma livre distribuição sorteada e não direcionada. Como na Justiça, como se um juiz escolhesse o que quer julgar.
ISTOÉ – Quem decidirá se o dr. Cássio Conserino é ou não o promotor natural?
Shuenquener – Uma das alegações do requerente foi a de que já existe um processo em tramitação na 5ª Vara Criminal sobre os mesmos fatos. E este processo está sendo investigado pela 1ª promotoria criminal. O dr Conserino é da 2ª Promotoria Criminal. Então o requerente diz que ele não teria competência porque teria que mandar para a 1ª promotoria. Deveria funcionar assim: a representação deveria ser aleatoriamente distribuída por sorteio e quem recebesse essa notícia é que deve verificar se há conexão ou não com outro processo com fato que já está sendo investigado, então não é o CNMP que decide, não pretendo aqui fazer essa avaliação.