17/10/2007 - 10:00
O deputado Clodovil Hernandes diz que se identifica muito com a personagem Miranda Priestly, do filme O diabo veste Prada, vivida pela atriz Meryl Streep. É a história de uma editora de moda oxigenada, poderosa e durona, inspirada na carreira de uma diretora da revista Vogue americana. “A Miranda se parece muito comigo”, diz Clodovil. “Ela é que tem coisas minhas.” Ao caminhar pelos longos corredores da Câmara vestindo Yves Saint- Laurent, Armani e, claro, Prada, as brancas melenas do deputado ao longe se parecem mesmo com as da personagem que ele admira. Clodovil provoca a curiosidade de seus colegas parlamentares. “Acabei de elogiar você lá no plenário”, aproximouse, por exemplo, o ex-militar linha-dura Jair Bolsonaro, na segunda-feira 8. “Não me elogie, me respeite”, devolveu Clodovil. Além do respeito como político, o deputado quer conquistar o direito de mudar de partido. Ele deixou o minúsculo PTC e foi para o PR. Agora, com a decisão do Supremo Tribunal Federal, está ameaçado de perder os 493 mil votos que conquistou com o menor dos investimentos declarados de que se tem notícia na política brasileira: R$ 14 mil gastos na campanha. Nesta entrevista a ISTOÉ, Clodovil, do alto de seus 70 anos, depois de já ter derrotado um câncer e um AVC, avisa que vai brigar com unhas e dentes pelo mandato.
Eu acho uma burrice. Eles eram PRN e trocaram para PTC. Por que eles podem trocar de nome e eu não posso mudar de partido? O que é partido, diante dessa falcatruada, dessa sem-vergonhice toda?
Os meus eleitores nem sabem o que era PTC. E o PTC não fez nada pela minha candidatura. A única publicidade que eu tive foi gratuita, assim mesmo porque arrumei uma pessoa amiga minha que fez o filme da minha propaganda. Eles queriam o dinheiro. Eles recebiam R$ 45 mil por ano de ajuda para o partido (proporcional ao número de votos), e passaram a receber R$ 1,4 milhão por meu intermédio. Estão reclamando de quê? O dinheiro fica para eles. Agora, os meus votos eles não vão tomar nunca. Eu terei 500 mil votos em qualquer Estado em que me candidatar.
Enquanto eu estava no PTC, eu só fui aparecendo em coisas porque me movimentava. Na verdade, só fiz benemerência nesses nove meses que estive aqui, não fiz absolutamente nenhuma coisa útil ao País porque eles não deixaram. Para que perder tempo com essa coisa de mudar de partido? Para divulgar quem, para fazer o quê? Por várias horas, ficou a elegantérrima Ellen Gracie no vídeo, horas. Era muito melhor que se contasse a vida de uma pessoa poderosa como ela, alinhada, chique, para induzir as mulheres a serem assim. Era muito melhor do que perder tempo com essa besteira.
Mas o que é partido? É uma jogada entre eles. O homem quando faz leis, faz leis para si mesmo
Não. Eu fui com essa condição. Eu votarei de acordo com o meu caráter. Se eu achar que alguma coisa não tem nada a ver comigo, eu não voto.
Eu sou fiel ao meu povo. O governo é o meu povo. Quando os políticos saem daqui, eles fazem parte do povo. As decisões tomadas aqui refletem na vida deles também. Eles esquecem disso. Às vezes, eles votam aqui por interesses pessoais e, quando chegam lá fora, eles apanham.
Não quero absolutamente direito nenhum. Eu quero concluir o meu mandato fazendo coisas para .ajudar as pessoas, porque, quando eu saio daqui, eu sou uma delas. Eu freqüento as mesmas ruas, eu tenho os mesmos problemas. A fama não é nada nessa hora. O que eu quero? Quero transformar os endereços em locais onde se pode andar
Se alguém me oferecer, eu conto. Esses dois diamantes aqui nos meus dedos custam uma fábula, são meus, e eu tenho há muito tempo. Eu não vim para cá para buscar nada, eu vim porque já tenho.
Ubatuba pode ser. Meu título é de Ubatuba. De São Paulo, eu não posso, porque não tenho o título de São Paulo. Se eu me candidatasse, eu seria eleito. Mas não quero ser prefeito de nada, quero fazer outras coisas. Eu vim para cá porque fui mandado. Acredito em Deus. Não é de maneira religiosa, carola, mas eu tive um insight (introspecção) mesmo. Eu sou muito dado a essas coisas. O universo é Deus. Deus de igreja não existe. Esse Deus é uma criatura criada para ser vendida aos pedaços, como carne num açougue.
Pergunta o que eu falei para o Waldemar agora mesmo? Ele me disse que queria falar com o presidente do PTC. Eu respondi: “Que desilusão.” Ele perguntou: “Por quê? Ele é meu amigo.” Eu respondi: “Mas isso que é minha desilusão, porque seus amigos são muito ruins. Troca de amigos.”
Mas você pode provar que é verdade o que dizem que ele fez? Você não pode provar nada. No plural, qualquer coisa pode ser dita. Se a carapuça servir, veste. Mas os caras que participaram de todas essas coisas, da história dos dinheiros, estão todos aqui com a cara grande que Deus deu a eles. Eu não viria. Se fosse eu, eu teria vergonha. Nunca tive problema nenhum de ser homossexual. Eu teria vergonha de ser ladrão, bandido. Isso é uma coisa que não admito que conversem comigo, pois isso é um assunto para Deus. Ele que me fez, ele me explicará um dia porque eu nasci homossexual. Nasci, mas fui procurar me parecer com Leonardo da Vinci, com Michelangelo, Santos Dumont.
Não aprendi nada, ao contrário. Brasília é uma cidade feia, sem luz e sem brilho. E é por isso que o Brasil não brilhará tão cedo. Enquanto a capital não brilhar, o País não brilha.
Mudar. Fazer com que pessoas que venham para cá venham com interesses outros, não interesses pessoais. Só gente tonta pensa que tem poder
Brasília muda no dia em que a população souber quem ela é. O brasileiro não sabe quem é. Eles não deixam. Nós não temos educação, não temos cultura, não temos instrução, não temos nada e fica tudo por isso mesmo.
Eu? Não sou fiscal de bunda. Meu negócio é outro. Ninguém vive disso. A gente vive é em cima de um monte de atitudes, da saúde das pessoas, das dores que as pessoas poderão sentir, da instrução, do direito de as pessoas irem ao teatro.
É o que eu tenho dito. Eu quero que os 500 mil votos que eu tive tomem uma atitude. Não de vandalismo. Aquilo que eles me dizem nas ruas, que eles façam isso chegar a quem de direito.
Não. Viver é um ato político. É que antes eu falava com uma veemência dos incautos. Hoje eu falo com a calma de quem sabe que a pressa é inimiga da perfeição. Urgência é uma coisa correta, pressa atropela as coisas. Eu hoje sou urgente, mas não tenho pressa. Antes, eu falava um monte de coisas e não media as conseqüências. Agora não. Eu falava como um papagaio.
Ainda não existe política. O que existe é um monte de interesses pessoais que as pessoas chamam de política. Fiquei com ódio na semana passada, quando uma pessoa do governo vetou a minha proposta de leite para todas as crianças. Nem era minha, peguei essa proposta porque achei muito correta. O presidente dá leite numa cesta- família para votos.
Claro que não. Nós não temos mais teatro, não temos mais artistas, não temos vozes, não temos líderes, não temos um monte de coisas, que se perderam no meio do caminho. Isso aqui é um grande Paraguai. Antes, a gente ia para as ruas, eu fui com a Cacilda Becker reivindicar um direito, pedir que a carteira das atrizes fosse retirada nos cartórios, e não nas delegacias como as prostitutas. Hoje em dia, qualquer vagabunda que seja amante de alguém que tenha poder vira estrela de televisão.
A Gisele Bündchen é um cavalo manco que deu certo.
Não freqüento hoje o mundo da moda. Não sei de ninguém. Dizem que todos são gays. Eu também era.
Não. Eu conheci alguns aqui, alguns que me impressionaram muito bem. Só acho que a política é malcriada com ela mesma, são muitas ofensas, fala-se muito alto. Isso não leva a nada. Eu falo na frente de todos.
Hoje, eu fui agradecer a ele. Há nove meses eu não falava com ele porque ele foi malcriado comigo no primeiro dia. Mas agora eu soube que ele negou o pedido de cassação para o partido, que pedia a minha cassação. Eu fui lá, dei a mão a ele com muito prazer e disse: “Eu vim para agradecer.” Ele disse: “O quê?” Eu disse: “O fato de o sr. ter sido presidente. Presidente não tem antipatia nem simpatia, é presidente. E o sr. me surpreendeu com essa atitude.” Ele ficou passado. E aí ele sorriu verdadeiramente para mim.
Ele devia continuar sendo líder sindicalista. A Presidência de um país não se faz dessa forma. Muitas coisas que foram prometidas nunca foram cumpridas. Nem serão.
A Marta Suplicy é muito chique, alinhada, favorita do governo, quem sabe ela não será presidente? É uma homenagem, uma cobra de raça, uma naja, venenosíssima, perigosíssima. Ela deveria ficar honrada com o apelido.
Não gosto dela por várias coisas. Não me desce. Uma mulher que vai pedir coisas diante de um presídio, com bispo, com arcebispo, com ex-marido, para soltar seqüestradores perigosíssimos, que seqüestraram um grande amigo íntimo dela…
É. Eu acho isso o fim do mundo.