Depois da grande abertura econômica, que está atraindo investidores de todas as partes do planeta, a República Popular da China já começa a se preparar para uma nova revolução: a urbana. E essa revolução é inspirada na política habitacional desenvolvida pelo governo do Distrito Federal. Toda planificação na China, país que tem 1,3 bilhão de habitantes, envolve sempre números gigantescos. Assim, para desafogar as suas duas mais importantes cidades, a capital Pequim e Xangai, o mais importante centro econômico, as autoridades chinesas vão movimentar massas de mais de um milhão, recolocando-as em cidades-satélites que serão construídas numa distância de 50 a 100 quilômetros desses dois grandes centros. Para conhecer mais profundamente a experiência desenvolvida no Distrito Federal, o governador Joaquim Roriz foi convidado para visitar a China no fim de fevereiro e explicar o programa de assentamentos urbanos quem vem desenvolvendo no DF.

Nos casos de Pequim e Xangai, os chineses pretendem construir anéis de cidades-satélites que poderão abrigar populações que habitam hoje os hutongs, pequenas vilas periféricas, e até mesmo chineses do interior das cidades cuja existência, em muitos casos, data de mais de 500 anos e vêm sendo habitadas por gerações. Nos espaços abertos com a demolição desses aglomerados que se assemelham a favelas, o governo chinês quer plantar em um prazo de dez anos mais de cinco milhões de árvores, criando entre as grandes cidades e seus satélites um gigantesco cinturão verde. Não se trata apenas de uma questão de embelezamento. Nesses dois grandes centros urbanos – Pequim com mais de 12 milhões de habitantes e Xangai com mais de 18 milhões –, os chineses enfrentam sérios problemas de poluição ambiental. A ausência de chuvas e o uso massivo do carvão vegetal como fonte de aquecimento residencial tornam o ar denso, quase irrespirável. A visão é impressionante na capital, com avenidas gigantescas com suas casas e prédios de cor cinza, como se estivessem permanentemente cobertas por uma grossa camada de fuligem.

Mas o salto urbano chinês, como já está sendo definido, vai se estender ao interior do País, mas de uma forma inversa à de Pequim e Xangai. No segundo caso, as autoridades pretendem remover populações de áreas remotas, isoladas, realocando-as em novas cidades a serem construídas. O objetivo do regime comunista chinês é ativar os centros comerciais do interior, criando novas sociedades de consumo, atraindo atividades empresariais e gerando novos postos de emprego. Cerca de 65% da população chinesa está concentrada na área rural e para desafogá-la as autoridades querem investir na construção de pequenas e médias cidades. Com isso, as fazendas coletivas, inspiradas no modelo soviético, tenderão a desaparecer.

Projetos – Em uma reunião realizada no Instituto de Planejamento Urbano de Pequim, o governador Joaquim Roriz apresentou o seu Programa de Assentamento Populacional do Distrito Federal. As autoridades chinesas ficaram impressionadas com a experiência. Dados oficiais mostram que foram erradicadas 64 favelas que existiam no Plano Piloto (Brasília) com a construção de oito cidades-satélites: Samambaia, São Sebastião, Paranoá, Recanto das Emas, Riacho Fundo, Sobradinho 2, Vila Roriz e Varjão. O governador explicou que 120 mil famílias foram assentadas nessas localidades, criando pólos econômicos, educacionais, de saúde e de segurança. Simultaneamente, o governo criou o Pró-Rural, um programa que tem como objetivo a fixação do homem no campo e o fortalecimento da economia rural no Distrito Federal. O governador Roriz acrescentou que foram criados créditos especiais para facilitar o arrendamento de terras para o plantio. “Em termos de infra-estrutura, o governo do Distrito Federal levou saúde, escolas, eletrificação e apoio científico-tecnológico ao meio rural como forma de instituir uma rede de proteção e contenção do fluxo migratório campo-cidade”, disse ele.

Uma das questões que mais interessaram às autoridades chinesas foi com relação à propriedade sobre terras distribuídas nos novos assentamentos. O governador Roriz lembrou da criação do programa PRÓ-DF, através do qual a venda das terras é subsidiada mediante a aplicação de incentivos econômicos e isenções fiscais. Na China, a terra é doada, mas pertence de qualquer maneira ao Estado. As autoridades queriam saber se, no caso brasileiro, a propriedade é vendida ou arrendada. Roriz explicou-lhes que a terra é vendida, mas que é o governo quem organiza esse mercado imobiliário. O governador também ressaltou a importância de serem criados mecanismos econômicos de sustentação desses assentamentos. “O PRÓ-DF inclui igualmente a aplicação de incentivos à indústria e a solidificação do comércio do DF”, afirmou ele. Segundo Roriz, o programa atraiu 3.600 novas empresas para a região, gerando mais de 60 mil empregos diretos num prazo de três anos. Isso, de acordo com o governador, contribuiu para diminuir dramaticamente o contingente de cerca de 200 mil pessoas desempregadas no Distrito Federal, o que era considerado um dos maiores índices de desemprego do País.

O governador ressaltou aos chineses que Brasília, a pedido do presidente Juscelino Kubitschek aos arquitetos Lúcio Costa e Oscar Niemeyer, foi pensada e planejada para abrigar o centro administrativo do País, com o objetivo de levar o desenvolvimento sócio-econômico para a região central do Brasil. “Todavia, a cidade acabou se transformando num pólo de atração para todos os brasileiros, o que gerou inúmeras dificuldades, como o alto índice de desemprego e a falta de moradia para a população de baixa renda”, explicou o governador, acrescentando que isso provocou a criação de 64 favelas em 28 anos, com cerca de 600 mil pessoas vivendo em condições precárias e desumanas, ao mesmo tempo que a ocupação desordenada do solo aumentava rapidamente. “Foi necessário então que realizássemos uma grande reforma urbana, a fim de promover a ocupação ordenada do território. O objetivo não era só o de assentar pessoas, mas garantir-lhes acesso à moradia e ao trabalho”, disse Roriz.

Negócios – Como resultado da visita do governador foram acertados, de modo geral, pontos de negociação importantes para o DF e para o País. Serão enviados ao Brasil especialistas no cultivo do bambu, que tem largo emprego na construção chinesa; a China tem interesse de investir na formação de um pólo fármaco-químico na região do Distrito Federal; será criado um grupo misto de acompanhamento e avaliação da parceria e intercâmbio comercial entre DF e China; a potência oriental também tem grande interesse na tecnologia brasileira de casas pré-fabricadas. Está em negociação a participação do empresariado brasiliense da construção civil nos futuros grandes projetos chineses na construção, como metrô, rodovias, prédios, casas populares. Para isso, ficou acertada a criação de um centro empresarial de Brasília em Pequim, com o objetivo de facilitar as relações comerciais entre a China e o governo do Distrito Federal e também a criação de uma Câmara de Comércio e Indústria Brasília-Pequim, além da participação de Brasília na Feira Anual de Xangai.