Em 2035, Chicago vai estar na vanguarda da robótica. É das linhas de montagem da U.S. Robotics, impressionante torre de vidro em forma de lâmina, que saem as máquinas pensantes mais avançadas do planeta. As estatísticas ditam que para cada grupo de cinco humanos, há um robô executando os serviços de cozinheiro, office-boy ou garçom. Só não está incluído nestes números o empedernido detetive Del Spooner (Will Smith), personagem de Eu, robô (I, robot, Estados Unidos, 2004), ficção científica do diretor Alex Proyas, “sugerida” pelo cultuado livro homônimo do russo-americano Isaac Asimov. Depois de arrasar nas bilheterias dos Estados Unidos, onde faturou US$ 95 milhões em duas semanas, o filme chega ao País na sexta-feira 6 trazendo Smith como um policial que ainda ouve Stevie Wonder e prefere um All Star vintage aos coturnos modernosos.

“Robofóbico” total, Spooner tem uma desconfiança irracional dos “assistentes domésticos automáticos”, sentimento que se intensifica ao encontrar morto no grande hall da U.S. Robotics o Dr. Alfred Lanning (James Cromwell), o grande inventor de criaturas metálicas. A empresa, que acaba de colocar no mercado a novíssima geração de robôs falantes NS-5, aposta em suicídio. Spooner, no entanto, acredita que o amigo foi vítima de uma de suas criações, o quase humano Sonny (Alan Tudyk). Mas as três leis da robótica, estabelecidas por Asimov no seu livro de 1950 e estampadas por Proyas no início do filme, contrariam suas desconfianças. Elas dizem que: 1 – Um robô não pode ferir um humano ou permitir que ele sofra algum mal. 2 – Um robô deve obedecer às ordens dos humanos, a não ser que tais ordens contrariem a primeira lei. 3 – Um robô deve proteger sua própria existência, desde que não entre em conflito com a primeira e a segunda leis. Portanto, suspeitar de Sonny é uma insensatez. A não ser que ele esteja programado para burlar algumas das leis, hipótese que faz a graça das histórias de Asimov.

Fã do gênero, o falecido diretor Stanley Kubrick recusou rodar Inteligência
artificial
– de Steven Spielberg – por não dispor de um robô real para o papel
do menino. Ele mudaria de idéia diante da verossimilhança alcançada pela computação gráfica na criação de Sonny. Com um tronco polido e músculos de borracha preta, o boneco cibernético é um dos trunfos de Eu, robô. Foram 50 desenhos até chegar à forma final. Para alcançar a perfeição dos movimentos, os produtores usaram os mesmos efeitos da criação do personagem Gollum, da série O senhor dos anéis: um ator de carne e osso se meteu numa malha verde, ficando apenas com o rosto descoberto. Depois, suas feições foram digitalizadas, assim como todos os seus movimentos. A cabeça de Sonny tem acabamento branco transparente, deixando à vista todo o seu cérebro de posítrons azul-claros. Um espetáculo. O mesmo acontece com V.I.K.I, o computador central da U.S. Robotics, que tem a face formada por feixes de luz, coroando a idéia visual do filme, construído em cima de transparências e brilhos frios.

Ação – Na criação das fantásticas cenas de ação, como o racha entre o turbinado Audi de Spooner – cujas rodas são esferas – e os “tanques” da U.S. Robotics, salta aos olhos a tecnologia de ponta que elevou o custo do filme ao patamar de
US$ 105 milhões. Contudo, muito ocupado com as ferramentas digitais, Proyas se esqueceu dos recursos dramáticos, desperdiçando um material de primeira.

Um dos melhores contos do livro, Pequeno robô perdido, se viu reduzido a uma cena na qual Spooner tenta encontrar Sonny misturado a uma centena de NS-5. Todas as indagações metafísicas de Asimov também se diluíram num enredo mal alinhavado, em que personagens somem e aparecem sem razão e situações surgem do nada e para o nada retornam. Ao tentar explicar seu personagem, Smith disse que ele sofre de um distúrbio paranóico causado pela culpa de sobreviver a um acidente no qual outras pessoas morreram. A paranóia o faz tomar banho sem cortina. Seria para fazer valer seu cachê de US$ 28 milhões?