26/11/2020 - 15:07
Com o orçamento para 2021 ainda indefinido por batalhas políticas de aliados do governo, sem elucidação do que a equipe do ministro da Economia, Paulo Guedes, defende por reforma tributária e com uma expectativa trágica de 17 anos vindouros de rombo fiscal, o xadrez político econômico do país é um aglomerado de peões onde a inércia do rei reflete a crise.
Desde que assumiu, Jair Bolsonaro (sem partido) deixou para o ministro da Economia, a quem ele chama de “Posto Ipiranga”, a responsabilidade total sobre a área. A questão é que economia depende de política e, neste aspecto, nem Guedes nem Bolsonaro conseguem atuar. Com um “rei” e uma “rainha” apartados, os peões da equipe econômica tentam sensibilizar o Congresso sobre a necessidade de aprovação de uma longa pauta, mas o xadrez econômico não deverá ter mudanças neste ano.
Foi nesta esteira que o secretário especial de Fazenda, Waldery Rodrigues, tentou, durante mais de cinco horas na última terça-feira (24), colocar sob a responsabilidade do Congresso uma missão que não tem tido dedicação nem empenho direto do presidente da República: o equilíbrio das contas públicas e a necessidade de aprovação de uma extensa pauta. Na avaliação da equipe econômica, somente a aprovação da robusta pauta seria capaz de manter a movimentação no tabuleiro econômico menos tortuosa.
“Este é o ponto em que o Parlamento mais tem consciência e mais, sem dúvida, pode ajudar o Brasil na mudança, no enfrentamento direto da Covid-19, de maneira que, até em termos de performance internacional, o Brasil tenha uma melhor posição: continuidade do programa de concessões e privatizações; aprovarmos a PEC do pacto federativo, a PEC 186, a PEC 188; liberalização comercial; redução de subsídios; reforma administrativa sendo aprovada, com critério de eficiência ali posto; reforma tributária, importantíssima, em particular, para reduzir complexidade e aumentar eficiência; novos marcos legais, só citando aqui o do saneamento, mas os outros todos são importantes”, disse Rodrigues.
Para além dos gastos públicos inflados devido à pandemia, as dificuldades econômicas esbarram nas movimentações do próprio governo, que tenta segurar o mercado com a promessa de ajustes em uma pauta econômica liberal, mas que joga estrategicamente para capturar a ideia. Incompleta, a reforma tributária não conseguiu avançar no Congresso e a reforma administrativa não tem argumentos para romper as estratégias das carreiras públicas, que são fortemente contra a medida.
Na outra linha, o governo precisa encontrar recursos onde não há reservas para bancar um novo programa social, o Renda Cidadã, que deverá substituir o já estabelecido Bolsa Família, levantando receios de um rompimento no teto de gastos. São necessários cerca de R$ 20 bilhões no Orçamento do próximo ano, que ainda nem foi aprovado. Com as dificuldades, o governo vai tentar colocar o programa dentro da PEC Emergencial, que cria mecanismos de ajuste fiscal. Ganha força junto aos governistas, especialmente o relator, senador Márcio Bittar (MDB-AC), a ideia de uma espécie de semi-desindexação, com o congelamento das aposentadorias acima do salário mínimo e implementação de gatilhos para estancar o crescimento das despesas com pessoal. O funcionalismo público promete reagir e vai trabalhar para que a medida não avance.
“Agente vai lutar contra a PEC Emergencial porque, mais uma vez, ela vai deixar o estado sem condições de prestar o serviço. Essa PEC vai calamitar o sistema. Quando ataca o servidor, ataca a população. Vamos lutar de todas as formas para que não seja aprovada essa PEC”, afirmou à istoÉ Oton Pereira, secretário-geral do Sindsep-DF (Sindicato dos Servidores Federais).
Enquanto a economia se desmancha, Bolsonaro foca os olhares na eleição presidencial de 2022, se aproxima do ministro do Desenvolvimento Regional, Rogério Marinho e joga a pauta liberal de Guedes ao vento, colocando para escanteio o controle mais rígido dos gastos públicos. Ao mesmo tempo em que o país amarga uma dívida bruta que deve encerrar o ano representando 93,1% do PIB (Produto Interno Bruto), Marinho conseguiu, sob a sangria da educação, os valores que havia pedido ao presidente para obras e investimentos no orçamento ainda neste ano de 2020.
Em pleno recesso branco, o Congresso aprovou um remanejamento de recursos para a pasta de mais de R$ 3 bi de uma única vez, sendo que R$ 1,4 bi foram retirados de universidades e institutos federais de ensino. O orçamento de 2020 já havia extraído 18% dos recursos totais do orçamento do MEC neste ano em relação a 2019. Bolsonaro quer inflar de obras o Nordeste e Norte do país, onde o PT historicamente tinha mais espaço. Por meio de uma rede social, Bolsonaro exalta obras e ignora crise financeira, como se o país vivesse às margens de um colapso financeiro, aumentando o tensões no tabuleiro da política econômica do país.
“Existe uma tensão recorrente entre a necessidade de implementação de políticas de consolidação fiscal e a adoção de políticas anticíclicas de expansão do gasto público. Durante 2020, o Governo optou por ir a fundo em políticas de expansão fiscal visando mitigar os efeitos adversos da Covid-19 sobre a economia”, afirma o deputado federal Francisco Júnior (PSD – GO), relator da comissão especial que analisa os gastos federais com o combate à Covid-19.