A conversa com meus melhores amigos esta semana era inspirada na capa da IstoÉ desta semana: devemos ficar na cidade de São Paulo ou ir para o interior em busca da natureza e de lucidez para esses tempos de Covid-19. Foi uma surpresa ver que outros conhecidos estão no mesmo dilema. Então, para brincar com essa decisão, selecionei alguns quadros que mostram diferentes cenas da cidade e do campo.
As quatro obras são de Pierre-Auguste Renoir (1841-1919), um dos pintores mais brilhantes do mundo. Ele retratava a beleza de uma forma única. Trazia brilho e cor para as cenas, além de muita sensualidade para as mulheres, sempre dando uma dimensão excepcional para suas pinturas. Mudou a história com suas pinceladas e inspirou muitos membros de sua família a seguirem seus passos no mundo das artes. Foi pai do cineasta, escritor e ator Jean Renoir (1894–1979), do ceramista Claude Renoir (1901–1969) e ator Pierre Renoir (1885–1952), além de avô do cineasta Claude Renoir (1913–1993).
Renoir era filho de um alfaiate e as limitações financeiras não atrapalharam seu sonho de estudar na famosa escola de Belas Artes de Paris, a École des Beaux-Arts. Entre seus amigos mais queridos, tinha grandes pintores como Monet, Bazille e Alfred Sisley. Compartilhou com eles muitos experimentos e o enorme prazer de pintar ao ar livre. Um belo dia, eles mudaram o estilo e retiraram o preto nas obras, criando, assim, o Impressionismo.
Tinha o propósito de criar obras agradáveis aos olhos e que alegrassem as paredes, mudando a decoração sóbria das casas da época. Sempre curioso, procurava constantemente novas inspirações. Em uma de suas viagens, ficou impressionado com as obras de Raffaello que viu na Itália (acompanhe coluna sobre o mestre do Renascimento). Suas pincelas eram coloridas e ligeiras, com muitas sobreposições de tons para gerar movimento e brilho. Chamou a atenção de muitos amantes da arte, que o chamavam para produzir retratos.
Em 1883, comentou que tinha esgotado as possibilidades do Impressionismo e chegado à conclusão que não sabia pintar, nem desenhar. Puxa, quem saberia então? Nessa fase, começou a produzir quadros de nus femininos. Trabalhou até o último dia de sua vida e, mesmo sentindo muitas dores por causa de um reumatismo, produziu maravilhas até os seus 78 anos.
Quatro obras de Renoir possibilitam diversas escolhas e experiências para os admiradores da cidade e do campo:
1 – Dança no Campo ou na Cidade (1883) – Renoir retrata em “Dança no Campo” um animadíssimo baile no interior. Os personagens são Paul Lothe e Aline Charigot, mulher que mais tarde se tornaria companheira do pintor. Seu vestido é encantador, com formas que acariciam o olhar do espectador. Faz uma mistura de estilos e aplica algumas técnicas que eram usadas por Raffaello. Esse quadro foi muito estudado por especialistas porque mostra o estado psicológico dos personagens, algo incomum na época.
Em Paris, a música muda, mas pode ser igualmente interessante. “Dança na Cidade” retrata uma dança mais tradicional, onde o toque do casal se dá por meio de luvas (algo bem comum hoje em dia em tempos de coronavírus!). O quadro mostra o movimento de Renoir para voltar à tradição. A atmosfera impressionista também continua presente nesta obra, mas sua produção foi em 1883, o “ano que foi uma espécie de fratura”, como dizia o próprio Renoir sobre seu trabalho. A mulher do quadro é Suzanne Valadon, modelo e musa de muitos artistas da época como Toulouse-Lautrec. Anos depois dessa tela, ela foi mãe do pintor Maurice Utrillo.
2 – Diversão na cidade ou no campo – “Baile de Moulin de la Galette” (1876) está entre as obras que melhor retratam a fase Impressionista de Renoir. O quadro foi inspirado em uma das tardes de domingo de Moulin de la Galette, um local bem animado de Paris e que ficava na região de Monmatre, que até hoje destaca-se pela vida agitada com seus bares e restaurantes. Vários amigos de Renoir pousaram como modelos para ajudar na produção da pintura, feita ao ar livre para retratar a frescura, o clima alegre e o entusiasmo das pessoas com o dia ensolarado e com o ambiente de festa. A tela mostra cor e brilho nos rostos e roupas, mostrando luminosidade entre as sombras das árvores. O traço rápido de Renoir consegue fixar o tempo, sem perder absolutamente nada da intensidade e da excitação do momento. Quem olha a cena também fica com a sensação de que quase consegue ouvir a música ou as vozes das pessoas se divertindo. Um espetáculo em todos os detalhes.
“O Almoço dos Barqueiros” seria a opção para quem prefere o interior. Foi considerada a melhor pintura da 7ª Exibição Impressionista de 1882. Mostra uma combinação de natureza-morta, com paisagem e personagens. Novamente, um grupo de amigos de Renoir atuaram como modelos para ajudar na composição da obra, que mostra um momento de relaxamento em uma varanda da Maison Fournaise, que fica ao longo do Rio Sena. Note que o corrimão em diagonal serve para dividir as duas metades da composição, sendo que uma registra muitas pessoas e a outra apenas o verde. Nesta pintura, Renoir também capta uma imensa quantidade de luz entrando na varanda, ao lado do homem com chapéu. As camisetas sem mangas e a tolha refletem brilho que se espalha pela composição.
A vida nos permite fazer escolhas todos os dias, mas com os quadros de Renoir fica muito difícil escolher entre cidade e campo. Concordam? Compartilhe, indicando qual cena você prefere. Quando puder, escreva também para sugerir um tema ou para contar algo sobre seu artista preferido. Adoro boas histórias! (Instagram Keka Consiglio).