Coluna: Keka Consiglio

Keka Consiglio é artista plástica, jornalista e empresária do setor de comunicação. Apaixonada por arte desde criança quando começou a estudar o tema, entregou-se de vez a esse universo ao fazer cursos e visitar museus e exposições, tanto no Brasil como no exterior. Desenvolve uma arte livre, criativa, repleta de cores e de elementos baseados em temas cotidianos, tendo a sustentabilidade presente em todo o seu processo de criação. Curiosa e motivada por desafios, vive e trabalha em São Paulo, produzindo suas coleções a partir de dois estúdios. Instagram: @keka_consiglio_artista. Site: www.kekaconsiglio.com.br

Quer aprender a apreciar arte? Cézanne é um bom começo

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Foto: Wikimedia Commons

Arte certamente não tem o mesmo significado para você do que tem para seus amigos. E é justamente por isso que é fascinante. Cada um possui um gosto, um desejo e uma compreensão. A cada olhar, surge um novo significado e, quanto mais você treinar seus olhos, mais emoção conseguirá captar.

Para mim, a arte é uma forma de eu expressar meus sentimentos, de mostrar o meu lado mais íntimo. Traduz minhas experiências de vida e é um veículo de informação colorido para eu transmitir a minha energia. A arte é poesia e também uma porta para me levar para outras dimensões, permitindo que eu mergulhe em um universo paralelo.

Conhecer arte é fundamental para construirmos a nossa própria identidade, para entendermos outras culturas, para estudarmos movimentos de outras sociedades e para ampliarmos a nossa visão de mundo.

Infelizmente, muitas pessoas acham erroneamente que não conseguem ter essa experiência porque arte seria apenas para quem tem dinheiro ou para quem é um estudioso no assunto. Ledo engano. A arte deveria sempre fazer parte da vida de todos para poder trazer novas energias para a alma. Uma pena ver que os estímulos surgem apenas nas aulas das crianças ou nos tratamentos dos idosos com Alzheimer.

Tive a imensa sorte de poder estudar arte e de visitar os maiores museus e galerias do mundo. Tenho uma alegria ainda maior por ser artista plástica e poder expressar meus sentimentos por meio de pinceladas. Mas, para quem nunca viajou nesse universo, costumo dizer que é mais simples, barato e fascinante do que se imagina. Basta sonhar com uma grande linha de metrô e você está ingressando na estação que fica mais perto de sua casa. Nomeie o ponto de partida com o nome de um artista que você gosta e pesquise sobre ele na Internet. A estação anterior é de quem o influenciou e a seguinte é de quem ele impactou. Os artistas mais famosos do mundo são hubs, com diversas conexões.

A arte tem surpresas, como na vida real. Para nossa alegria, sempre surgem artistas sensacionais que mudam por completo os rumos, promovendo uma disrupção. Por ser revolucionário, ele merece inaugurar uma linha de metrô nova. Garanto que é uma viagem divertida e super interessante.

Se aceitar uma sugestão, comece por Paul Cézanne porque ele é um ótimo nome para começar a viagem pelo mundo das artes. Ele nasceu em 1839 no sul da França. Foi um pintor pós-impressionista e sua obra foi radicalmente inovadora. Influenciou artistas da época como Claude Monet, Renoir, Alfred Sisley e Édouard Manet, além de gerações de novos seguidores. Foi além do impressionismo e influenciou até o cubismo.

Estudou direito por insistência do pai e não passou nos exames de admissão da Escola de Belas Artes de Paris. Ao invés de ficar choramingando e lamentando a vida, ele deu a volta por cima e decidiu correr atrás de seu sonho. Felizmente, para nossa sorte, ele insistiu e ingressou na Academia Suíça decidido a ser pintor.

Cézanne chegou à brilhante conclusão que temos visão binocular. Nosso cérebro une as imagens registradas por nossos dois olhos a partir de informações visuais que não são idênticas. Com suas pinceladas, ele mudou a arte chapada para um novo horizonte, trazendo mais de uma perspectiva. Com isso, abriu a porta do modernismo com chave de ouro.

Vale observar o quadro “Natureza Morta com Maçãs e Pêssegos”, produzido em 1905. Quem olha com calma notará que o jarro tem duas perspectivas diferentes, assim como a pequena mesa de madeira. Se as regras de visão matemática da época do Renascimento fossem aplicadas, as frutas iriam cair no chão. Ao inclinar a mesa para o espectador, Cézanne aumenta as informações visuais em prejuízo da ilusão de espaço tridimensional. Essa pintura mudou a história da arte para sempre.

Ele herdou de seu pai uma boa herança e uma casa perto da cidade de Aix. Com isso, produziu muitas obras sensacionais ao ar livre. Costumava dizer que “devemos ver a natureza como ninguém a viu antes de nós”. Bom pensamento para tempos de Covid-19.