O Brasil inaugura na próxima terça-feira, 14, a nova Estação Antártica Comandante Ferraz. Com capacidade para 64 pessoas, ela substituirá a base destruída por um incêndio em fevereiro de 2012 e é apontada por pesquisadores como uma das mais modernas da região.
“A nova estação brasileira hoje é a maior estrutura de pesquisas da Península Antártica. E certamente está entre as três maiores estações de pesquisa antártica do mundo”, afirma o professor da Universidade de Brasília Paulo Câmara, em sua sexta temporada na Antártida.
São 17 laboratórios de pesquisa – 14 internos e 3 externos -, que servirão principalmente para estudos de Microbiologia, Biologia Molecular, Química Atmosférica, Medicina, Ecologia e mudanças ambientais.
Planejada pelo escritório de arquitetura Estúdio 41 e construída pela chinesa Ceiec, vencedora de concorrência internacional, a nova estação custou US$ 99,6 milhões e impressiona pela estrutura à prova de ventos de até 200 km/h, solos congelados e abalos sísmicos.
As obras começaram no final de 2015. Suas fundações foram pré-montadas em Shangai e levadas de navio para a Ilha Rei George, onde ficam estações de Brasil e outros países. Assim como os pilares, estruturas e contêineres. Para aplacar o trauma do incêndio que matou dois militares há oito anos, a segurança virou quase obsessão e acabou ampliando a nova Comandante Ferraz.
O projeto original tinha 3,3 mil m², mas a estação ficou com 4,5 mil m², em boa parte por segurança. É quase o dobro da antiga, que tinha 2,6 mil m². “A nova estação será uma oportunidade de mostrar nosso valor como país, pois estamos inaugurando uma estrutura de ponta, que colocará nossos pesquisadores no topo da pesquisa antártica”, diz o secretário da Comissão Interministerial para os Recursos do Mar, almirante Sérgio Guida.
Segundo ele, uma comitiva com 45 autoridades, militares, pesquisadores e assessores deve participar da inauguração na terça, mas o presidente Jair Bolsonaro desistiu de ir. Será substituído pelo vice, Hamilton Mourão.
Três ministros também confirmaram presença: Tarcísio de Freitas (Infraestrutura), Fernando Azevedo e Silva (Defesa) e Marcos Pontes (Ciência).
Na inauguração será feita a entrega provisória da estação pela empresa chinesa – a definitiva só deve ocorrer com o fim do pagamento, previsto em contrato para 2022. Segundo a Marinha, US$ 60 milhões já foram pagos. Setenta chineses ainda trabalhavam nesta terça-feira, 7, na estação. A maioria deve ir embora em 31 de março. Alguns poucos permanecerão para ajudar na manutenção durante o inverno.
Terminada a construção, a atenção agora se concentra nos investimentos no Programa Antártico Brasileiro (Proantar), que há anos sofre com a inconstância na liberação de verba. Segundo o almirante Guida, a verba para logística está garantida. Um convênio de R$ 400 milhões com a Petrobrás garantirá recursos e combustível por cinco anos para a estação e os navios que operam na região, e emendas parlamentares têm ajudado a fechar as contas.
Ciência
Na pesquisa, porém, a questão é mais delicada. “Hoje perdemos para todos os países do Brics em investimentos em ciência antártica. Só a África do Sul tem um programa na região equivalente ao brasileiro”, diz Jefferson Simões, vice-presidente do Comitê Científico Internacional Sobre Pesquisa Antártica. “A nova Ferraz é a casa do Brasil na Antártida, tem importância tanto geopolítica quanto para ciência, mas o Proantar é mais amplo que ela.”
Ele lembra que só 25 % da pesquisa antártica brasileira será feita na Comandante Ferraz – o restante é realizado no Navio Polar Almirante Maximiano, em acampamentos e num módulo a 2,5 mil quilômetros. “O trabalho mais profundo é feito nas universidades e institutos de pesquisas. O desafio nos próximos anos é o financiamento dos laboratórios no Brasil.”
Estudo de DNA
Uma pesquisa sobre DNA de plantas e fungos antárticos é a primeira feita na nova estação brasileira. Realizada pelos professores Paulo Câmara, da Universidade de Brasília, e Luiz Henrique Rosa, da Universidade Federal de Minas Gerais, ela terá seus resultados apresentados na inauguração, terça-feira.
Um dos propósitos do estudo foi testar os novos laboratórios da estação. “A gente fazia a pesquisa e, ao mesmo tempo, testava equipamentos, via se a energia não caía, se as tomadas estavam adaptadas”, diz Câmara.
Segundo o professor, a estrutura da nova estação possibilitou um salto grande na pesquisa, porque permite já extrair o DNA na Antártida e só sequenciá-lo no Brasil. “Antes só era possível fazer o trabalho na universidade meses depois e muitas vezes o DNA se perdia ao longo do caminho, porque o navio demora para chegar. Agora a gente já pode estabilizar o DNA na Antártida e só tem de levá-lo num tubinho pequenininho para o Brasil para sequenciá-lo.”
Luiz Henrique Rosa conta que um de seus grandes interesses na Antártida são fungos que produzem antibióticos. Após isolá-los e cultivá-los em placas, o professor extrai as substâncias que eles produzem e as testa contra causadores de dengue, doença de Chagas e outros males tropicais.
Outro foco das pesquisas são substâncias que possam ser usadas como pesticidas e herbicidas na agricultura. “Como micro-organismos da Antártida estão isolados geograficamente há muito tempo, eles podem ter linhagens selvagens que podem produzir substâncias muito úteis como remédios.” As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.