14/11/2019 - 19:00
O presidente Jair Bolsonaro nunca prezou a fidelidade a partido algum. Ele sempre utilizou as legendas partidárias como alguém que chupa uma laranja e depois joga o bagaço fora. Em 31 anos de carreira política, já trocou de partido oito vezes — uma a cada quatro anos —, e agora começa a estruturar o caminho para a nona experiência, desta vez uma organização de extrema-direita para enfrentar o PT de Lula. A última agremiação que ele usou apenas para atingir seus objetivos pessoais, o PSL, tomado de aluguel para se eleger presidente da República no ano passado, foi descartada por seu grupo familiar na última terça-feira 12, depois de meses de uma briga fratricida com Luciano Bivar, o presidente nacional da legenda.
O anúncio da debandada dos bolsonaristas do PSL foi feito após uma reunião de parte da bancada com o próprio presidente — em foto divulgada depois do encontro, contou-se a presença de 31 dos 53 deputados eleitos pelo partido no ano passado, que prometem subscrever a criação do novo partido, que vai abrigar o grupo rompido com os bivaristas. A “Aliança pelo Brasil”, que terá Bolsonaro como presidente, já tem manifesto de fundação divulgado e data para a primeira convenção: será no próximo dia 21, em um hotel de Brasília, de acordo com a deputada Carla Zambeli (PSL-SP), uma das porta-vozes do encontro com Bolsonaro na tarde de terça-feira no próprio Palácio do Planalto.
O novo partido, que se apresenta como conservador, inspira-se na Arena (Aliança Renovadora Nacional), criada em 1966 para dar sustentação ao regime militar, responsável por torturas e práticas ditatoriais, defendidas pelos bolsonaristas. A “Aliança” defende valores reacionários, populistas e personalistas, carregada de tons messiânicos, como o de dar um “novo rumo” ao Brasil. A principal meta da agremiação é servir de escada para Bolsonaro disputar a reeleição em 2022. Para isso, o grupo do presidente precisa conseguir 500 mil assinaturas até março do ano que vem. Para agilizar o processo, esse grupo contratou o advogado Admar Gonzaga, ex-ministro do TSE, que no passado também ajudou o ex-prefeito Gilberto Kassab a fundar o PSD em tempo recorde. O problema é que Bolsonaro quer levar, além dos 31 deputados, também as verbas do fundo partidário que eles carregam desde que foram eleitos. Para evitar que os dissidentes levem o dinheiro para a “Aliança”, Bivar contratou Henrique Neves, outro ex-ministro do TSE. Ele não quer permitir a sangria dos recursos públicos que detém. O grupo de Bivar pretende, inclusive, acusar os dissidentes de infiéis, tomando-lhes até mesmo seus mandatos. Por essa razão, o time de Bolsonaro ficará no PSL até que a nova legenda seja criada.
Enquanto a “Aliança pelo Brasil” não é legalmente constituída, os bolsonaristas estão formalizando o seu estatuto, que pretende bater de frente com o lulismo. O partido, que será o 36º da política brasileira, pregará “o resgate de um país massacrado pela corrupção e pela degradação moral contra as boas práticas e os bons costumes”. O presidente pretende colocar militares nas presidências estaduais da nova legenda.
Tudo por dinheiro
O grupo bolsonarista começou a ficar desconfortável no PSL quando descobriu que o partido tinha um fundo partidário milionário (R$ 150 milhões anuais) e um fundo eleitoral maior ainda (R$ 500 milhões), dinheiro que estava sob controle de Bivar. Tentou de todas as formas colocar as mãos no dinheiro. Bivar resistiu. Foi aí que Bolsonaro soltou a frase que foi a senha para o rompimento: “Bivar está queimado para caramba”, referindo-se ao episódio do laranjal do Pernambuco no qual estava envolvido o dirigente partidário. Uma semana depois, a PF fez uma operação na casa de Bivar, procurando provas que o incriminassem. Na briga, Bolsonaro destituiu o deputado Delegado Waldir da liderança do PSL na Câmara, colocando seu filho Eduardo no lugar, depois de oferecer cargos públicos para parte dos deputados pesselistas. A guerra levou Waldir a chamar Bolsonaro de “vagabundo”. Na sequência, o presidente dispensou a deputada Joice Hasselmann do cargo de líder no Congresso, acusada de “traidora” e de aliada do governador João Doria. Estava ali desenhada a estratégia de Bolsonaro para estruturar um partido para chamar de seu.