Filme para o público se sentir bem, ‘Encontros’ é encantador

Cédric Klapisch escrevia DeuxMoi, que estreou quinta-feira (3), com o título Encontros – antes, era para ser (Des)Encontros -, quando soube da existência do filme argentino Medianeras. “Amigos me falaram que havia semelhança, e fui conferir.” Medianeras, de Gustavo Taretto, é sobre um casal que circula no mesmo espaço, em Buenos Aires, mas não se encontra. Encontros é sobre outro casal, em Paris. Moram em prédios contíguos, cruzam-se na rua sem se conhecer. Cada um carrega sua dor. Ele veio do interior, vive solitário. Colegas são demitidos no trabalho, ele fica. Sente-se culpado. Ela terminou uma história, mas não consegue fazer o luto por essa relação. Ambos se analisam (com terapeutas lacanianos, vale acrescentar).

“Embora tenham certa semelhança, o filme argentino é sobre urbanismo, sobre a cidade. O meu é sobre a palavra. Os dois terapeutas falam na importância de verbalizar. Vivemos uma época de muita exposição, em que as pessoas estão conectadas o tempo todo nas redes sociais, mas, na verdade, usamos as novas ferramentas para nos isolar. Sites de relacionamentos, por exemplo. Essa comunicação virtual não é a mesma coisa. Encontros é sobre a palavra que significa. Foi um filme que me deu muito prazer em escrever e filmar.”

Ela é filha de pais separados e consegue ser mais tolerante com o pai, que mora nos Estados Unidos, do que com a mãe, que vive perto. Ele visita pai e mãe, mas tem uma relação difícil, ligada a um luto que não foi feito. Soltar o verbo, conversar francamente pode ser o primeiro passo para uma transformação. “É um filme simples, mas como toda boa história simples, tem camadas. Uma coisa leva a outra, aprofunda a outra, e de repente a sensação é de navegar em águas mais profundas. É o cinema que me interessa. Humano, social. Não estamos falando de desigualdade, mas de uma forma muito particular de violência que isola e segrega as pessoas.”

Como todo Klapisch, o roteiro foi escrito e reescrito, mas, na hora de filmar, o diretor gosta de criar as cenas com os atores.

“Vejo muitos filmes, gosto de descobrir novos talentos. Já havia filmado com François Civil e Ana Girardot, que são ótimos e me parecem ter um futuro brilhante. Discutimos cada cena, ouço o que eles têm para dizer, mas, de maneira geral, eles seguiram o diálogo escrito e não improvisaram muito. Já com François e Pierre Niney, a cena com o amigo no bar foi toda improvisada. François e Pierre são amigos, têm uma vivência juntos e eu quis que ficassem à vontade. É uma cena pontual, que não faz a história andar. Me permitia essa liberdade.”

Há mais de 20 anos, Klapisch já havia feito uma espécie de crônica parisiense, O Gato Sumiu, sobre um carinha que procura o gato que sumiu na vizinhança. Outro gato agora some. “O cinema toma muitas liberdades com questões de tempo e espaço, quase sempre enganando o espectador. Pode não significar muito, mas, quanto mais verdadeira for a realidade humana e geográfica, melhor será o filme, acho.” Um filme sobre a palavra, sobre o gesto – e o toque. Tudo converge para uma aula de dança, quando, finalmente…Olha o spoiler! A música é… brasileira. “Estive no Brasil pela primeira vez há 30 anos. Descobri a música e, desde então, sou fã dos grandes compositores de vocês. Se o tema é o amor, a palavra e a música ajudam no clima.”