Stallone, no filme de despedida de Rambo

Rambo – Até o Fim, de Adrian Grunberg, estreia nesta quinta em todo o Brasil. No quinto filme da franquia iniciada em 1982, com Programado para Matar/First Blood, de Ted Kotcheff, Rambo cria cavalos na fronteira mexicana. Tem uma família, é um homem de paz. Uma tempestade abate-se sobre a região e ele, como voluntário, tenta salvar vidas. Salva uma, perde duas. Volta para casa abatido, derrotado, e não adianta a mulher que acolheu em sua casa dizer que não foi culpa dele. E o importante é que tentou. Lá no fundo, Rambo é atormentado por lembranças. Companheiros que perdeu em combate, amigos, os mortos dessa enchente.

Felizmente, existe a garota. É filha da serviçal. Trata Rambo como tio. Rapidamente, esboça-se o conflito. A garota tem um pai omisso. Descobre o paradeiro dele – no México. Contra as advertências do tio, da avó, vai ao encontro dele. O pai, bem dizia Rambo, não presta. Diz coisas que deixam a garota sem norte e ela acompanha a amiga, que presta menos ainda, na balada. É drogada e vendida como escrava sexual. Os irmãos Morales são os exploradores de mulheres.

Ao saber do que ocorre, Rambo atravessa a fronteira e vai atrás dela. Nosso homem tem experiência suficiente para saber que a humanidade não presta. Um dos Morales cospe na cara dele a verdade – mulheres não significam nada para machos como o irmão e ele. São menos que mercadorias, mas, por aquele gringo ter ousado interpelá-lo, ele vai dedicar atenção especial à jovem. Isso significa violência, muita violência.

Recapitulando – lá atrás, ao surgir em livro, Rambo (o nome era uma homenagem do autor ao poeta Rimbaud), o herói já tinha esse perfil. O ex-prisioneiro que conheceu o inferno na guerra. No cinema, o primeiro inimigo, quando Rambo chegava à América desmobilizado, era o autoritário xerife de uma pequena cidade do interior dos EUA. Rambo e o xerife representavam as duas faces da mesma moeda, e o diretor Kotcheff, que já havia feito um filme excepcional (Pelos Caminhos do Inferno, sobre a matança de cangurus na Austrália), estava seguindo a trilha de Arthur Penn, ao mostrar que os norte-americanos só conseguem resolver seus conflitos por meio da violência.

A resposta do público foi imediata e o astro Sylvester Stallone percebeu o potencial do personagem. Fez dele um emblema da era Ronald Reagan. Em Rambo 2 – A Missão, o herói vencia na ficção a guerra (do Vietnã) que os EUA haviam perdido na realidade. Em Rambo 3, enfrentava e, naturalmente vencia, os conselheiros militares soviéticos no Afeganistão. Rambo virou um eficiente soldado da Guerra Fria. Passaram-se 20 anos e, em 2008, no 4, o inimigo era outro, o exército de Myanmar. E, agora no 5, o narcotráfico mexicano, que o presidente Donald Trump não cessa de citar como inimigo da América (e por isso quer construir um certo muro).

Qualquer espectador que tenha visto os filmes precedentes sabe que os irmãos Morales e seus sicários não terão a mínima chance contra Rambo. Ele vai promover uma verdadeira carnificina – você vai perder a conta dos mortos quando ele atrai os traficantes para a rede de subterrâneos que construiu em sua fazenda. Mas isso é só parte do filme. O título já adverte – Até o Fim. Rambo, cada vez mais solitário, perde sua última família. Recolhe-se à cadeira de balanço, como o mais patético dos personagens do mestre John Ford, Hank Worden, em Rastros de Ódio. É um filme sobre perdas. As coisas mortas que permanecem vivas na lembrança e as vivas que começam a desaparecer. Não é um filme catártico. Tudo se perdeu, no mundo atual, e Rambo sabe disso. Ao contrário de Rocky, seu outro personagem emblemático, Stallone não vê um sucessor para Rambo. É um filme de despedida.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.