Os resultados oficiais confirmaram nesta terça-feira a realização de um surpreendente segundo turno na eleição presidencial na Tunísia, a ser disputado pelo jurista Kais Saied e o controverso magnata da mídia Nabil Karui, atualmente na prisão.
Ao comunicar os resultados oficiais, a autoridade eleitoral independente (Isie) confirmou que Saied liderou o primeiro turno com 18,4% dos votos, enquanto Karui recebeu 15,58%.
A eleição marcou a saída dos representantes dos anos pós-revolução: a formação de inspiração islâmica Ennahdha, principal força do Parlamento e que apresentou pela primeira vez um candidato, Abdelfattah Muru, ficou em terceiro com 12,88% dos votos. Quanto ao atual primeiro-ministro Yussef Chahed, terminou em 5º lugar (7,4%).
Pouco antes do anúncio oficial dos resultados, o Ennahdha parabenizou os dois vencedores, negando implicitamente rumores de uma possível desqualificação de Karui.
Paralelamente à contagem dos votos, o Isie analisa possíveis crimes eleitorais. Entre os mencionados, a campanha a favor de Nabil Karui pelo canal Nessma TV, que ele fundou.
“Analisamos (…), mas para excluir um candidato, precisamos ter uma razão válida e sólida de infração”, disse o porta-voz da instância, Hasna Ben Slimane.
No único país que sobreviveu à Primavera Árabe, a missão de observação da União Europeia garantiu nesta terça-feira que o primeiro turno da eleição presidencial foi “transparente”.
No entanto, pediu que os candidatos tenham “oportunidades iguais” para fazer campanha, em uma aparente alusão a Karui.
– Superar a miséria –
Os advogados do empresário, acusado de lavagem de dinheiro e sonegação de impostos e em prisão preventiva desde 23 de agosto, indicaram que entrariam com um novo pedido de liberdade assim que os resultados forem confirmados.
Karui permanece elegível enquanto nenhuma condenação o privar de seus direitos civis, enfatizou o Isie.
Em função dos recursos, o segundo turno poderá ser realizado em 6 de outubro, no mesmo dia em que as legislativas, ou 13 de outubro, afirmou o órgão eleitoral.
“Com esta eleição presidencial, voltamos à situação de 2011. A mensagem dos eleitores é ‘fora todo mundo, e veremos'”, comentou Mohamed Marzuk, presidente de uma associação da sociedade civil, Murabikun, que monitorou e analisou todo o processo eleitoral.
Os dois candidatos “prepararam o terreno por anos e mostraram que eleições não se fazem no Facebook, pelo menos não apenas”, acrescentou.
O desemprego continua a afetar mais de 15% da população, incluindo muitos jovens recém-formados, a inflação engole a renda já baixa, enquanto a precariedade dos serviços públicos alimenta o ressentimento.
Esse descontentamento foi reforçado pela atitude de uma classe política marcada por intermináveis lutas de egos.
A prisão de Karui dez dias antes do início da campanha, que ele denunciou como uma “injustiça”, confirmou seu status de outsider, embora tenha sido um importante apoiador do falecido presidente Beji Caid Essebsi.
Kais Saied, por sua vez, é um acadêmico ferozmente independente, desconectado das elites, que defende uma descentralização radical do poder, com uma democracia local e funcionários eleitos revogáveis durante o mandato.
“Os problemas sociais não serão resolvidos pelo poder central”, disse ele à AFP na segunda-feira. “Não vendo um programa, cabe aos cidadãos definí-lo, fazer grandes escolhas para superar a miséria”.
Ele também é percebido como muito conservador em questões sociais.
As negociações já estão em andamento entre os partidos, especialmente na perspectiva das legislativas, cruciais em um sistema parlamentar misto.
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